Opinião Luzilá Gonçalves Ferreira: Árvores e praças Luzilá Gonçalves Ferreira é doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 12/12/2017 07:05 Atualizado em: 12/12/2017 07:26

O camponês vendera parte de um terreno; No dia seguinte, ouvindo golpes de machado, salta da cama. Abre a janela e vê: o comprador derrubava uma árvore. Indignado e aos gritos protesta: – Assassino! Ante a surpresa do novo dono, corre, se abraça com a árvore. O outro protesta: mas essa árvore é minha, comprei o terreno. E ele: comprou o terreno, mas não tem o direito de destruir num minuto uma obra do bom Deus. Essa cena é o começo de filme francês, inspirado, se não me engano em conto de Marcel Pagnol. Imaginem a continuação. Discussões, o povoado inteiro se posiciona, tenta apaziguar os ânimos. Uma coleta geral devolve ao assassino de árvores o que pagou pelo térreo. E o camponês provençal continuou a vida em meio aqueles seres que, lembrava, a natureza levou anos a construir. Esse filme me veio à mente na semana passada, do imenso pesar de uma amiga, que, tendo vendido parte de uma propriedade na praia, soube que o novo dono havia abatido mais de 30 coqueiros. Pra construir não sei o quê, ter mais dinheiro claro, a isso se chama progresso, é preciso ganhar cada vez mais, amealhar, como se o tal fosse viver séculos. Mas há outro tipo de gente. Um meu conhecido, anda comprando terrenos à beira-mar, cada vez que sabe de um, para... plantar árvores. Cajueiros, claro. Plantas nativas, e mangaba, piqui, pitanga, araçá.

Explica: darão frutos pra os pescadores dos arredores,  talvez ajudarão pessoas a viver. E acrescenta: já pensou nos passarinhos?  Jean Giono em Que minha alegria permaneça (Que ma joie demeure) tem um personagem semelhante a esse meu sobrinho. O camponês de Giono semeia flores ao lado de suas videiras. Porque, também explica: com as flores vêm os passarinhos. Semana passada falei sobre como o Recife antigo possuía pouca arborização e como um decreto de 1842 preconizava a criação de praças, o que se deu de modo lento e desordenado. Um mapa do Recife mostra como ainda somos pobres em espaços verdes, embora esforço tenha sido feito, consultem minha amiga Cida Pedrosa que encheu o Recife de plantas, incrementou um jardim botânico à beira da BR101, coisa de dar gosto. Minha querida Marly Mota, de seu apartamento vê desaparecerem os antigos quintais em Casa Forte.

Verdade: ainda há construtores que entendem a permanência da alguma árvore ao lado dos prédios. Mas muitos calculam em reais o espaço tomado por uma mangueira que substituem por algum arbusto, para preservar o verde ainda exigido para licença de construção, imagino. E todo mundo reclama do calor, da poluição do ar, da qualidade de vida que o Recife está perdendo. A preocupação com o futuro do planeta ganha terreno em muitas cidades do mundo (mas o Brasil vai contra a corrente). Plantam-se árvores, criam-se hortas caseiras até em varandas. E lembro um pomar em convento parisiense, bairro valorizadissimo, as freirinhas plantando verduras e o comentário de um conhecido: “As alfaces mais caras do mundo”. E eu: benditas sejam as freirinhas. 

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