Diario Editorial: Uma luta para salvar vidas

Publicado em: 17/10/2017 07:16 Atualizado em:

Existe legislação que regulamenta o acesso de pacientes com problemas neurológicos aos canabidiol, substância extraída da maconha, que ameniza os efeitos de doenças, como epilepsia, esquizofrenia, esclerose lateral amiotrófica e outras. Mas entre a lei e o remédio, há um fosso burocrático quase intransponível, além de aspectos financeiros, que limitam ou chegam a impedir que a medicação seja obtida por grande parte dos pacientes. Recorrer ao Judiciário é o caminho percorrido pela maioria das famílias. Os governos, sobretudo o federal, reclamam do aumento do número de ações judiciais. Porém, não estabelecem, com a clareza que a situação exige, um protocolo que ajude o doente aliviar os efeitos dramáticos das doenças.

Recentemente, no Distrito Federal, o Tribunal de Justiça autorizou uma família a plantar maconha e extrair o canabidiol para amenizar as convulsões da filha. A exceção abre brechas para que familiares de pacientes sigam o mesmo caminho. O medicamento não é aplicado somente nos casos de pessoas que sofrem com epilepsia, mas também a outros problemas neurológicos que produzem danos diversos nas crianças e jovens.

Antes de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) editar portaria, autorizando a venda do medicamento, os pais dos pacientes importavam ou contrabandeavam a medicação. Ou seja, para garantir um mínimo de qualidade de vida aos filhos, eles incorriam em infração penal. Somente em 2015, a Anvisa, ante a repercussão dos inúmeros casos mostrados pela mídia, decidiu retirar o canabidiol da lista de substâncias proibidas no Brasil, abriu espaço à importação por pacientes, hospitais e associações. A Receita Federal retirou os impostos que recaíam sobre a compra no exterior do remédio.
As medidas foram bem-vindas, mas ainda assim insuficientes. Expressiva parcela de pacientes não tem recursos financeiros suficientes para importar e aplicar a medicação. Só a seringa custa aos cofres públicos R$ 765,60. Se a importação for direta pelos pais de um paciente, o preço da mesma seringa sobe para R$ 1,3 mil. O drama das famílias, em razão do agravamento das condições de saúde de um filho, vai aumentando dia a dia.

O Brasil ainda parece estar distante do patamar das nações desenvolvidas que prezam pelo bem-estar dos cidadãos. Pauta-se pelo atraso. A maconha tem cerca de 400 canabidinoides que aliviam não só danos dos problemas neurológicos, mas de várias outras doenças. Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Holanda, França, Espanha, Itália, Suíça, Israel e Austrália autorizam o uso desses compostos na medicina. Colômbia e Uruguai, entre os 19 países latino-americanos, são os únicos que têm normas claras para o cultivo e uso das substâncias medicinais da cannabis sativa.

A solução não passa por decisões judiciais isoladas, como no DF e, anteriormente, na Paraíba, onde a Justiça Federal também autorizou a Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (Abrace) a plantar e manipular a maconha para fins medicinais. O país precisa de políticas públicas mais eficientes e eficazes. Ou seja, o Estado tem que organizar o cultivo da planta e produção dos medicamentos. Não há outro caminho para atender a demanda dos pacientes e reduzir o custo. Tecnologia não falta ao Brasil, que ocupa posição de destaque na produção de vacinas e de outros compostos. A ausência de vontade e decisão política surge como o maior obstáculo para aqueles que lutam pela vida.


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