Diario Editorial: Em defesa da Constituição

Publicado em: 26/05/2017 07:25 Atualizado em:

A liberdade de imprensa, um dos pilares da democracia, é plenamente garantida pela Constituição Federal. Atentar contra ela é atentar contra o Estado democrático. Diante dessa constatação, a sociedade brasileira não pode aceitar violações ao texto constitucional. Mas foi exatamente isso que ocorreu na quebra do sigilo da fonte em gravação entre o jornalista Reinaldo Azevedo e Andrea Neves, irmã do senador afastado Aécio Neves, no âmbito das investigações do milionário esquema de corrupção tornado público com a delação premiada dos donos do Grupo JBS, os irmãos Joesley e Wesley Batista.

Além do artigo 5º da Constituição, que assegura o total sigilo da fonte jornalística, a legislação que regulamenta interceptações telefônicas proíbe o uso de gravações que não estejam relacionadas com o objeto da apuração. E esse foi o caso na gravação envolvendo Reinaldo e Andrea, pois nada de relevante ao processo é falado e nenhum indício de crime foi detectado pela Polícia Federal nas suas conversas. Os dois foram expostos, publicamente, e os que afrontaram a Constituição têm de ser responsabilizados.

O ministro Edson Facchin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o sigilo dos áudios que estavam em gravações das investigações dos proprietários da JBS, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que negou ser responsável pela divulgação das conversas entre o jornalista e sua fonte. Em nota, a PGR responsabiliza a Polícia Federal (PF) por qualquer documento que tenha sido incluído nos autos. A PF, por sua vez, diz que “somente o juiz do caso pode decidir pela utilização de áudios que não sejam de interesse das investigações”.

O certo é que a instituição que tomou a decisão que fere a Constituição deve explicações à sociedade. A gravidade do caso levou a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, a divulgar nota em que destaca que “o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência consolidada de respeitar integralmente o sigilo da fonte”. E reafirma seu “firme compromisso de lutar, e agora, como juíza, de garantir o integral respeito a esse direito constitucional”.

O decano do STF, ministro Celso de Mello, também defendeu o direito de não serem divulgadas as conversas de jornalistas com seus interlocutores, o chamado sigilo da fonte. Na mesma linha, o também ministro do STF Gilmar Mendes criticou o vazamento das gravações. “É uma irresponsabilidade não se cumprir a legislação em vigor, o que nos enche de vergonha. É um ataque à liberdade de imprensa.”

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) se juntou aos protestos contra o atentado à Carta Magna. Em nota, afirma que a PGR jamais poderia incluir no processo a transcrição de uma conversa entre um jornalista e sua fonte, “o que representou quebra de sigilo, um dos direitos assegurados pela Constituição”. Já a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) considera que a apuração de um crime não pode servir de pretexto para a violação da lei, muito menos justificar o desrespeito à Constituição Federal. As demonstrações de repúdio das entidades reforçam a necessidade de esclarecimentos sobre o fato. Que a ação de vazamento seja objeto de investigação para que tal fato não se repita. Violar o sigilo da fonte é violar a Constituição.


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