Memoria política Historiador pernambucano lança livro sobre os bastidores da Constituinte de 1987 O livro tem depoimentos de personagens locais e nacionais, como os ex-presidentes FHC e Lula

Por: Tércio Amaral

Publicado em: 05/04/2016 18:11 Atualizado em: 05/04/2016 19:16

Cleonildo Cruz revela os bastidores da Constituição de 1988. Foto: Hesiodo Goes/Esp DP/D.A/Press
Cleonildo Cruz revela os bastidores da Constituição de 1988. Foto: Hesiodo Goes/Esp DP/D.A/Press

Reconhecido pelo trabalho no campo do audiovisual, o historiador pernambucano Cleonildo Cruz lança, na noite desta quarta-feira (6), às 19h, o livro “Constituinte 1987-1988”, na Livraria Cultura, no bairro do Recife Antigo. O estudo surgiu no momento em que Cleonildo estava concluindo o documentário “Pernambuco o Golpe: 1964-1979”, em 2008. A ideia do novo estudo, que resultou no livro, era justamente descortinar os trabalhos da Assembleia Constituinte responsável pela Constituição de 1988, considerada moderna e um símbolo do novo ciclo democrático brasileiro.

Como historiador, Cleonildo prefere não fazer juízo de valor para determinados personagens, ou seja, apontar possíveis heróis ou vilões. Mas foi nessa Constituinte que figuras como o deputado Ulysses Guimarães (PMDB-SP), que apoiou o Golpe de 1964, se transformou em ícone da democracia tempos depois. “Não devemos ter uma visão rosa das coisas, que foi as mil maravilhas, não foi”, disse o historiador ao Diario. “O senador Cristovam Buarque (do PDT-DF, mas na época da pesquisa reitor da UnB) disse que a Constituição de 1988 ficou muito a favor dos grupos corporativos organizados”. No livro, o senador diz que “povo descalço, os excluídos, não participavam das audiências”.

O livro também deixa um legado aos políticos pernambucanos, que tiveram forte participação no processo de democratização do país no final da década de 1980. Entre os entrevistados, estão nomes como Marco Maciel, Fernando Lyra, Roberto Freire, Egídio Ferreira Lima e Maurílio Ferreira Lima. Figuras que, na época, divergiam ideologicamente, mas comungavam da mesma tese: o restabelecimento da democracia após o regime militar (1964-1985).

“Os nossos deputados constituintes tiveram uma atuação brilhante independente do corte ideológico, não vou julgar suas opções, acreditavam nos seus ideais. Todos que entrevistei tiveram uma atuação destacada no processo da Assembleia Nacional Constituinte. Lamento não ter entrevistado o deputado Ricardo Fiúza e a deputada Cristina Tavares”, revela Cleonildo. Outros nomes, como os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva deram seus depoimentos. O livro tem o selo da Editora do Conselho Federal da OAB e custa R$ 50.

Conflito com o governo Sarney

Ao Diario, Cleonildo revela que a relação entre a Assembleia Nacional Constituinte e o governo do então presidente José Sarney foi de “conflito”. O ex-presidente Sarney chegou a discursar, durante 28 minuto, contra o texto constitucional e afirmou que, se aprovado sem modificações, levaria o país à ingovernabilidade. “Sarney estava preocupado com a duração do seu mandato. No outro dia, Ulisses o contradisse, também em rede nacional, afirmando que a Carta seria, sim, uma guardiã da governabilidade”, diz. O mandato de Sarney foi encurtado de seis para cinco anos.

O mandato de Sarney, como reforça Cleonildo, só foi possível pela formatação do “Centrão”, ou “Centro Democrático”. O grupo era majoritário na Constituinte e foi formado por parlamentares do PMDB, do PFL, do PDS e do PTB, além de partidos menores. A governabilidade consistiu na velha prática da troca de favores. “Veja bem, a questão do mandato de Sarney perdurou por todo o processo. Houve troca de favores, Sarney tinha o poder de conceder da liberação das emendas, concessões de rádios e televisões. O Centrão teve total apoio do executivo e foi o maior beneficiado”.



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