Memória política Indesejáveis e perigosos nazistas de Pernambuco Livro recém-lançado relata história dos simpatizantes de Hitler na década de 1930, com nova versão sobre os Lundgren

Por: Tércio Amaral

Publicado em: 18/01/2015 09:33 Atualizado em:

Já imaginou um lugar onde as pessoas se reuniam para festejar as práticas do ex-ditador da Alemanha Adolf Hitler (1889-1945)? Pois bem, existia em pleno Recife da década de 1930, mais precisamente entre os membros do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, ou apenas Partido Nazista. A agremiação política surgiu, como relata alguns documentos da Delegacia de Ordem Política e Social de Pernambuco (Dops-PE), por volta de 1936 e manteve, além da sede na capital pernambucana, duas filiais: uma no município de Paulista, no estado, e outra na cidade de Rio Tinto, na Paraíba. O fio condutor dessa história está na Companhia de Tecidos, comandada pela tradicional família Lundgren.

A jornalista e professora do curso de história da Universidade de Pernambuco (UPE) Susan Lewis conta essas e outras histórias no livro recém-lançado Indesejáveis e perigosos: o antissemitismo e a questão alemã em Pernambuco durante o Estado Novo (1937-1945), lançado pela Editora da UFPE. Entre as teses defendidas pela pesquisadora é que não há provas contundentes da relação entre a família Lundgren e o nazismo. “Posso dizer com segurança que não há documentos que comprovem isso. O que eu defendo é que, com a necessidade de centralizar o poder político na Era Vargas, o estado criou mecanismos para diminuir a força da família, por isso essas acusações”, disse, ao Diario. Na época, Pernambuco era governado por um fiel aliado do presidente Getulio Vargas (1882-1954), o inverventor Agamenon Magalhães (1893-1952).

De fato, o órgão responsável pela investigação dos nazistas em Pernambuco era bem “suspeito”. A tarefa coube à extinta Delegacia de Ordem Política e Social, que, posteriormente, durante o regime militar de 1964, foi transformado em Departamento, onde militantes de esquerda foram torturados e mortos. “No caso dos Lundgren, que eram suecos, ocorreu o seguinte: para cargos estratégicos, eles confiavam a estrangeiros. Nesse sentido, Paulista concentrou um número significativo de alemães”. Em 1942, por exemplo, um jornal local relata que, dos 10 mil trabalhadores das fábricas da família, apenas 49 eram alemães, e estes últimos “comandavam” os brasileiros a partir de cargos estratégicos.

“O funcionamento de tais reuniões (do Parido Nazista de Pernambuco), ocorridas, por exemplo, nos clubes alemães faziam parte das atividades corriqueiras da comunidade germânica. Havia vigilância em torno de tais atividades, como existia com outros grupos e setores da sociedade”, pondera a historiadora. O Partido Nazista no estado, assim como suas filiais, foram fechados em virtude do Decreto-Lei nº 383, em 1938. Pelo menos, a partir daí, ele foi considerado ilegal. A historiadora relata, ainda, o clima “paranoico” que foi criado. “Uma vez num bar em Paulista, onde alguns alemãs estavam e, ao beber um pouco mais de cerveja, afirmaram que a Alemanha ganharia a guerra. Foram todos presos”, completa.

Saiba mais

A comunidade germânica local ouvia discursos de Hitler em transmissões radiofônicas e comemorava a data de seu aniversário, no dia 20 de abril. Inclusive, há apreensões da polícia na época de modelos de rádio com o símbolo da suástica nazista

Com o rompimento das relações diplomáticas entre o Brasil e os países do Eixo, durante a Segunda Guerra (1939-1945), o Clube Alemão de Pernambuco, bem como a Escola Alemã e a Sociedade Beneficente Alemã, foram fechados

A restrição aconteceu também na Casa de Itália. Todas as determinações foram da Delegacia de Ordem Política e Social de Pernambuco (Dops-PE) em 30 de janeiro de 1942

Nas investigações realizadas pela Dops, o alemão Erwin Kalk era o chefe principal do Partido Nazista no Recife, enquanto em Paulista o funcionário da Companhia de Tecidos Arnold Smith era quem orientava a “subfilial”

Em dos relatórios da Dops, em 30 de maio de 1938, dois membros da famíla Lundgren, os irmãos Arthur e Frederico, são citados como conhecedores do partido e que teriam dado contribuições para seu financiamento

A historiadora Susan Lewis, no entanto, não acredita no envolvimento dos membros da família Lundgreen com o Partido Nazista. Segundo ela, o órgão tentou “desestabilizar” a força da família, influente e dona de um grande parque industrial na época, com interesse políticos

Com o acirramento das relações entre o Brasil e os países do Eixo, a Dops, em março de 1942, fez uma série de restrições para os alemães que trabalhavam na Companhia de Tecidos da família Lundgren. Entre elas, residir em Paulista, não frequentar praias, proibição de reuniões e de sair de casa sem autorização policial

Serviço

Indesejáveis e perigosos: o antissemitismo e a questão alemã em Pernambuco durante o Estado Novo (1937-1945). Editora UFPE, 2014
Autora: Susan Lewis
Valor: R$ 35,00

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