DP Empresas

Maternidade abre as portas para novos negócios

Publicado em: 09/03/2019 09:00 | Atualizado em: 07/03/2019 17:53

Marcela e Rafaela Pontual apostaram, há dois anos, em linha de alimentação infantil. Foto: Clara Gouvea/Divulgacao (Foto: Clara Gouvea/Divulgacao)
Marcela e Rafaela Pontual apostaram, há dois anos, em linha de alimentação infantil. Foto: Clara Gouvea/Divulgacao (Foto: Clara Gouvea/Divulgacao)
A maternidade é um momento de transformação na vida das mulheres. É um novo mundo que se apresenta, muitas vezes com desafios que, através de um olho mais apurado e um espírito empreendedor, viram sinônimo de oportunidade para formatar um negócio que ofereça respostas para as demais mães que antes só enxergavam interrogações.

Segundo pesquisa feita, no fim de 2017, pela Rede Mulher Empreendedora (RME), plataforma de apoio ao empreendedorismo feminino do Brasil, das 55% empreendedoras que são mães, 75% decidiram partir para esse caminho após darem à luz. Muitas encontraram no mercado infantil um espaço em potencial para seguirem novas carreiras. Conheça o caso de duas pernambucanas que reescreveram suas trajetórias profissionais depois da maternidade.

A receita que transforma hábitos de consumo

A carreira de engenheira já é uma página virada. Há dois anos, Rafaela Pontual trocou os cálculos matemáticos das obras nas quais era responsável para apostar em uma equação que nem de longe é uma ciência exata: empreender. Construiu um conceito de negócio novo no mercado pernambucano. Oferece para os pais de crianças, a partir de seis meses, um cardápio de refeições prontas e congeladas, com pegada saudável. Uma solução, sobretudo, para quem convive em uma maratona diária de cuidar de um bebê ou uma opção àqueles que vão viajar e não querem “perder tempo” na cozinha preparando todas as refeições para os filhos. Foi com essa receita que Rafaela, em sociedade com a irmã, Marcela Pontual, criou os alicerces da Mini Menu e transformou a sua própria demanda como mãe na principal obra profissional.

Se lá atrás os potes do Mini Menu eram entregues somente a domicílio, desde julho de 2018 os consumidores passaram também a encontrar as opções de pratos (19 para almoço e jantar), além de sucos e lanches, nas prateleiras de cerca de 30 pontos de vendas no Recife, Caruaru e Gravatá, João Pessoa e Campina Grande. Esse número deve crescer em breve. Negociam com as redes Verdfrut e Frutaria.

Novas praças fora do estado estão em estudo, como também a expansão em novo formato. Apesar da procura ser grande, segundo Rafaela, sobretudo com interesses de abrir franquias, a empresária explica que ainda estuda a modelagem mais apropriada para esse negócio e, somente em 2020, provavelmente, será gestado.

Até lá, a empreendedora espera que um novo braço da empresa evolua com os mesmos alicerces. Para atender os inúmeros pedidos, Rafaela e Marcela - publicitária por formação - convidaram a chef pernambucana Manu Tenório para uma parceria que resultará, a partir de abril, em uma linha de refeições para adultos. Antes, o trio irá fazer uma pesquisa de mercado em São Paulo. “É uma linha saudável com comida de verdade. Vamos lançar quatro linhas de produto: vegano, vegetariano, low carb e funcional. Tudo alinhando sabor e saudabilidade e preocupação com meio ambiente”, conta.

A nova linha - com investimento de R$ 100 mil na linha de produção - será um reforço a mais no faturamento, que já vem se multiplicando mês a mês. Em janeiro, teve crescimento de 50% em relação ao mesmo período de 2018. Em fevereiro, atingiu 80%. Números que dão a Rafaela a certeza que fez um bom negócio ao investir R$ 200 mil no Mini Menu e ao trocar de profissão.

“Nunca imaginei seguir esse caminho. Estava trabalhando em uma obra de barragem quando comecei a montar o negócio em abril de 2017. Trabalho de domingo a domingo, várias vezes acordando às 5h, mas é uma sensação de felicidade profissional que nunca tive”, confessa Rafaela, lembrando que o negócio surgiu a partir da própria experiência. Era uma mãe, como se classificou, “paranoica” com a alimentação dos filhos (Maria e Rafael, hoje, com 5 anos e 3 anos, respectivamente) e não observava no mercado nada que lhe desse confiança no produto e oferecesse praticidade.

“Costumo dizer que a gente não vende apenas a comida, mas o tempo que você terá a mais com seu filho. Conseguimos desmistificar a questão da comida congelada para bebês e percebemos que criamos um hábito de consumo. Os bebês vão crescendo e passando a outro estágio de alimentação e as mães continuam consumindo o Mini Menu”, destaca.

Ananda Urias transformou as experiências maternas em livro. Foto: Ananda Urias/Cortesia (Foto: Ananda Urias/Cortesia)
Ananda Urias transformou as experiências maternas em livro. Foto: Ananda Urias/Cortesia (Foto: Ananda Urias/Cortesia)
A maternidade que abriu novas portas


Uma gestação prematura e inesperada transformou tanto a vida pessoal quanto a profissional de Ananda Urias. Jornalista por formação, a mãe de primeira viagem passou a relatar sua experiência de mãe solo e jovem nas redes sociais de um blog materno. Com a segunda gestação, dessa vez programada e com um companheiro ao lado, o negócio ganhou ainda mais força. As experiências de Ananda como mãe e as histórias de Lara e Alice passaram a ter uma marca, a Mãezice, sendo acompanhada por milhares de seguidores nas redes sociais. Os relatos virarão negócio.

“No começo eu tinha uma sociedade, mas via que não tínhamos o mesmo desejo sobre o blog. Então, resolvi seguir carreira solo. Eu já trabalhava com mídias sociais antes de engravidar e via que dava dinheiro. Eu queria viver disso e não ganhar coisas de graça. Foi daí que decidi me dedicar a esse trabalho, criei uma marca e fui trabalhando com o que eu gostava ao mesmo tempo em que cuidava das minhas filhas”, conta. Hoje, o Blog Mãezice tem 227 mil seguidores no Instagram, 12.299 inscritos no Youtube e mais de 200 mil curtidas no Facebook. 

E foi justamente da dedicação aos relatos da experiência que a profissional decidiu investir em um outro modelo de negócio: o lançamento de um livro. O primeiro, Muito Além da Maternidade, foi lançado em 2017, contando a própria história dela com as filhas e ainda sobre os sentimentos envolvendo gestação, puerpério, reencontro, gratidão e dor. “Eu fiz para arriscar. Jurava que não ia vender dez unidades. Foi um lançamento autoral com um orçamento baixíssimo. E aí eu vi que deu certo. Claro que cometi alguns erros, apanhei com alguns fornecedores mas me profissionalizei. Hoje já está chegando em cinco mil unidades vendidas”, conta.

O segundo livro, já aproveitando a experiência de coach parental, foi publicado no ano passado em parceria com uma amiga piscóloga. A edição faz parte de um projeto chamado Eu sinto tanto, focado na família e cuja ideia é seguir com o projeto e ter outras edições. “O livro trata de seis sentimentos e de como pode ser trabalhado por pais e filhos. Este ano devemos lançar o segundo volume, focado em outros seis sentimentos”, detalha. Com a veia empreendedora, a profissional não descarta outros projetos. Recentemente chegou, inclusive, a lançar uma linha de camisas em parceria com uma loja de São Paulo. “Se terei outras parcerias do tipo não sei. Hoje eu tenho um equilíbrio de publicidade do blog e da venda dos livros. E é esse meu foco agora”, pontua.

Entrevista - Lívia Moura - Analista do Sebrae/PE e responsável pelo prêmio Sebrae de Empreendedorismo Feminino

Ainda há preconceito das mulheres no comando?
Apesar das barreiras sociais e culturais ainda existentes na nossa sociedade, a liderança feminina vem ampliando espaço e ganhando visibilidade das mulheres no ambiente de negócio. Hoje, 51% dos novos negócios já são abertos por mulheres e, dessas, 50% são mães e trabalham em casa. Isso é uma tendência que vem essencialmente da necessidade de conciliar a carreira com o papel de mãe. Essa forma de gerar renda para complementar a renda da família ou, muitas vezes, ser a renda principal da família, é papel que as mulheres estão tendo mais propriedade e função dentro da estrutura familiar. A grande questão é que como grande maioria dos negócios se inicia por necessidade, e não por oportunidade, muitas vezes, mães não tem preparo emocional e de mercado para conciliar a vida de empreender sendo mãe. O empreendedorismo no Brasil já tem dificuldades pela nossa formatação tributária e para as mulheres têm fator agravante que é pela falta de apoio familiar por não entender que estar em casa trabalhando não faz com que ela não tenha compromisso. 

O mercado infantil é mais atraente para o público feminino?
Vemos que tem surgido o interesse das mulheres para investir no segmento infantil nas mais diversas áreas. Casos das próprias experiências, como o filho que tem intolerância alimentar, ou mães que têm dificuldade de arrumar babás, entre outros. Temos visto movimento que esse mundo de conexão tem propiciado bem interessante de empreendedorismo materno, como blogs ou grupo de redes de mulheres empreendedoras. Muitas mulheres têm se atraído pelo mercado infantil e a coisa tem acontecido de forma mais estruturada porque parte do princípio que é uma “dor” que eu conheço. É algo que você está pesquisando, envolvido, e consegue estruturar melhor o modelo de negócio. Porém, como negócios de empreendedorismo materno nascem por necessidades, a mãe, mulher, empresária não consegue ter tempo suficiente para identificar quais as habilidades, o que teria propósito de trabalhar. Então, a empresa nasce da necessidade de gerar renda de qualquer forma e acaba sendo envolvido na área de alimentação, cosméticos, beleza (em maioria cabeleireiras) e no ramo de confecção. 

Quais os desafios que as mulheres têm para investir na área infantil?
O desafio principal é vencer o medo de que não vai conseguir dar conta. A autoconfiança de que você é capaz porque muitas vezes quando tem o dilema de ser mãe e ter carreira você já pensa que uma coisa exclui a outra e não precisa ser assim. A questão é que isso vem do nosso sistema de sociedade que se baseia na estrutura familiar de que o pai é o provedor e a mulher que cuida do lar. Mas isso está só no mindset da sociedade porque o novo mundo dispõe para a sociedade que mulheres e homens tem direitos e deveres iguais e precisamos buscar nossos espaços como mulheres e mães. Para ter sucesso tem que conhecer o negócio em que vai entrar e aliar conhecimentos técnicos e comportamentais. Se capacitar, conhecer público alvo e ser bem informada sobre o ramo do negócio.
Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.
MAIS NOTÍCIAS DO CANAL