Opinião

Qual a lógica na precificação da Petrobras?

Publicado em: 25/05/2018 19:05 | Atualizado em: 25/05/2018 19:12

Fernando Dias é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Tiago Lubambo/Divulgação
Fernando Dias (*)

Como um leigo no tema refino de petróleo, e como um consumidor de combustíveis, não deixa de me chamar a atenção qual é a lógica de longo prazo que a Petrobras, empresa estatal que detém o monopólio de fato no mercado de combustíveis no Brasil, tem para formar preços. Minha impressão é que é nenhuma. Varia ao sabor dos governantes. A presente crise de abastecimento devido à greve dos caminheiros é um reflexo direto disto.

Na atual discussão que vem se travando em Brasília o que parece é que todo mundo tem razão. O caminhoneiro, que não pode contratar frete sem nenhuma previsibilidade sobre o preço do diesel. A Petrobras, que precisa recompor os cofres para equacionar seu estoque de dívida. Os governos Federal e Estaduais, que precisam garantir receita em uma conjuntura de déficit generalizado. E oconsumidor como fica? Sujeito às forças de mercado.

Em um ambiente normal, o gradativo encarecimento do frete deveria equilibrar a questão, mas não estamos em tal ambiente. No cenário atual tudo conspira contra o caminhoneiro. Ele acabou de passar por uma expansão de frota acreditando em promessas de um governo passado, e ficou frente à mudança radical na lógica de privatização do principal player do mercado, a Petrobras. Com pouco espaço para negociar ele tendeu a radicalizar, greve.

E a Petrobras? Endividada além de qualquer outra empresa do gênero no mundo, e com passivos bilionários de investimentos mirabolantes gestados em gestões ainda mais mirabolantes, a empresa deu uma guinada a partir de 2016 e parou de absorver em seus passivos as oscilações do petróleo e do câmbio, deixou de ser a operadora do populismo do Estado. Resultado, os preços dispararam no alinhamento com os custos e as margens foram junto. Nesta nova lógica, êxito total. No primeiro trimestre deste ano foram R$ 7 bilhões de lucro líquido e ela voltará a pagar dividendos, o que não ocorria desde 2014.

É preciso mesmo repassar toda a oscilação do câmbio e do preço externo do petróleo? Não. Depois de um grande esforço a empresa hoje importa uma fração bastante reduzida do que refina, usando basicamente seu próprio petróleo. Em linhas gerais, o que se percebe a princípio,como obrigações em moeda estrangeira atreladas ao preço do Petróleo é esta parcela ainda importada e o pagamento dos royalties. Já as dívidas, boa parte delas é em moeda estrangeira e seu custo é, desta forma, dolarizado. A empresa não revela que parcela é esta, arriscaria dizer que dificilmente é superior a 50%. Como resultado ela deve estar engordando bem os lucros no cenário atual. É isto que os números apontam.

E os governos (Federal e Estaduais), que representam praticamente 50% do valor final na bomba devido aos tributos? Em que pese a super tributação dos combustíveis, o fato é que nenhum dos entes federados tem espaço hoje para abrir mão de receita.

Neste cenário, ao que tudo indica, o agente que tem mais condição de negociar hoje é a própria Petrobras. Mas isto depende da lógica a que ela está sujeita. Se é agir como uma empresa privada, então deve fazer o que está fazendo agora. Se é para agir como empresa pública, para garantir o serviço sem onerar os cofres públicos, então ela não só deve entrar no acordo como tem espaço suficiente para precificar de forma distinta da que faz hoje, absorvendo parte das oscilações atípicas de curto prazo e as distribuindo no longo prazo. No final, temos um problema de gestão em um setor que deveria ser melhor regulado, e que está virando um problema de segurança nacional. E por falar em regulação, alguém sabe onde anda a Agência Nacional do Petróleo (ANP)?

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE
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