Observatório econômico Financiamento de campanhas

Publicado em: 21/08/2016 08:00 Atualizado em: 19/08/2016 21:46

Por André Magalhães (*)

André Magalhães é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Paulo Paiva/DP
André Magalhães é professor do Departamento de Economia da UFPE. Foto: Paulo Paiva/DP
Muitos acreditam que essa será uma campanha barata, onde o corpo a corpo deverá fazer a diferença. Com pouco dinheiro, os candidatos terão que ganhar as ruas, falar com as pessoas, algo positivo. Por outro lado, com pouco tempo de campanha, os mais conhecidos saem na frente, algo não tão positivo.


Reconhecendo a possibilidade de falar alguma impropriedade, tento hoje refletir a respeito de uma questão mais ligada ao mundo político. Como se sabe, as regras para a atual campanha eleitoral foram alteradas em relação às campanhas anteriores. Os pontos mais divulgados foram a proibição das doações por empresas e a redução do tempo da campanha de televisão e rádio. Muitos acreditam que essa será uma campanha barata, onde o corpo a corpo deverá fazer a diferença. Com pouco dinheiro, os candidatos terão que ganhar as ruas, falar com as pessoas, o que é algo positivo. Por outro lado, com pouco tempo de campanha, os mais conhecidos saem na frente, algo não tão positivo. Há quem arrisque dizer que essa será a campanha do caixa dois. É esperar e torcer para que não seja.

Enquanto isso é interessante, penso eu, refletir a respeito do sistema de financiamento das campanhas no país. Um elemento central da discussão é a questão do financiamento público versus o financiamento privado. O passo mais recente foi na direção de reduzir o financiamento privado. A motivação para tal parece ser a de minimizar a influência do capital privado no processo. O financiamento público seria a solução. Será? Parte dos custos das campanhas é pago com dinheiro público: o tempo de televisão e rádio é pago com isenção fiscal. Além disso, o fundo partidário recheia os cofres dos partidos e o dinheiro vai para as campanhas. Por ser dinheiro público há uma melhor divisão dos recursos entre os partidos, correto? Não necessariamente. A regra de divisão desses recursos é baseada no tamanho das bancadas. Partidos maiores levam mais dinheiro e tempo de tv. Pelo menos hoje, a regra beneficia diretamente os partidos que tinham mais dinheiro para gastar nas eleições anteriores. Mais dinheiro antes, mais dinheiro hoje, mais candidatos eleitos hoje, mais dinheiro amanhã. O status quo está mantido.

Partir para um modelo com 100% de financiamento público não resolveria o problema. Além disso, eu não sei quanto a você, mas eu não gosto da ideia de entregar recursos públicos para que os partidos gastem como quiserem. E qual seria a solução? Que tal imaginar por um momento que os grupos de interesse existem e vão sempre existir e que não é possível conter completamente as doações das empresas para as campanhas. Uma possível solução seria a regulamentação e transparência das doações privadas (impondo limites para tentar nivelar o jogo), o reconhecimento e regulamentação do lobby, enquanto atividade de grupos de interesse e o fim do uso do dinheiro público nas campanhas. Esse não é um modelo novo, mas pode funcionar melhor. Um problema mais concreto a ser enfrentado nessa discussão é que quem faz a regra é exatamente quem se beneficia dela. Não dá para esperar mudanças enquanto deixarmos os interessados fazerem as leis. Os incentivos são claros e, como os economistas gostam de pensar, as pessoas tendem a responder aos incentivos.

(*) Professor do Departamento de Economia da UFPE.

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