Editorial Respeito se conquista

Publicado em: 20/04/2019 03:00 Atualizado em: 21/04/2019 05:06

O recuo do ministro Alexandre de Moraes, ao revogar a censura imposta à revista digital Crusoé e ao site O antagonista, sinaliza um arrefecimento de ânimos na crise institucional que opõe o Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público. A proibição à reportagem “O amigo do amigo de meu pai”, classificada como “mordaça” pelo ministro Marco Aurélio Mello e de “intolerável” pelo decano Celso de Mello, foi o auge de uma escalada de tensão iniciada após inquérito, aberto pelo presidente do STF, Dias Toffoli, para investigar supostos ataques e o uso de fake news contra intregrantes da Corte. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se posicionou pelo arquivamento do inquérito e contra a censura.

“A prática da censura judicial, além de intolerável, constitui verdadeira perversão da ética do direito”, escreveu, em carta aberta, Celso de Mello, que considerou a ação “ilegítima” e “incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República”. A reação da ministra Cármen Lúcia e do ministro Marco Aurélio vieram no mesmo tom.

Desde o início da Lava-Jato, há fortes divergências sobre o entendimento da legislação penal entre ministros do STF e integrantes da força-tarefa de combate à corrupção. Diante de decisões de magistrados do Supremo que favorecem presos alcançados pela Lava-Jato, sempre há, sobretudo em redes sociais, duras manifestações de repúdio ao comportamento de ministros da Corte. Não à toa, o inquérito de Toffoli mira justamente esse público.

Contudo, os supostos ataques à honra do STF não justificam a decisão monocrática extrema de Moares de ressuscitar a lei da mordaça, uma das características de regimes de exceção, em confronto com a Constituição de 1988, que vedou a censura no país. Há leis para punir crimes de injúria, calúnia e difamação. Moraes foi o escolhido por Toffoli para conduzir as investigações nas redes sociais, sites e publicações eletrônicas, na caçada às bruxas que atingiu as publicações virtuais.

O presidente do STF se sentiu atingido pela reportagem publicada nos dois veículos sobre documentos enviados à Polícia Federal pelo empresário Marcelo Odebrecht, condenado com base nas investigações da Lava-Jato. Nos e-mails, o empreiteiro afirma que o codinome “O amigo do amigo do meu pai” se referia a Toffoli, quando ocupou o cargo de advogado-geral da União, no segundo mandato do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O documento, rotulado como fake news, é verdadeiro, como reconheceu Moraes ao revogar a censura. As investigações decorrentes do inquérito, porém, continuam.

Não há democracia sem imprensa livre. Perseguir veículos de comunicação e invadir redes sociais numa caçada sobre o que dizem e comentam os usuários também não tornará a Alta Corte ou o Judiciário mais bem-visto aos olhos dos cidadãos. O respeito é conquista que se alcança pelas atitudes. Por mais que seja rigorosa, a lei não é capaz de aprisionar ideias ou moldar a compreensão dos fatos. Não será com medidas antidemocráticas que a Justiça ou quaisquer outros poderes vão se impor à sociedade, sobretudo quando partem da Corte guardiã da Constituição Cidadã.



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