Democracia, uma conquista a ser preservada

Luiz Henrique Diniz Araujo
Doutor em Direito Processual e Constitucional. Professor de Direito. Procurador Federal

Publicado em: 01/10/2018 03:00 Atualizado em: 01/10/2018 08:53

Em tempos de eleições gerais e, especialmente, eleições em que o radicalismo, notícias fraudulentas (fake news), declarações violentas e meias-verdades ganham corpo, é importante “tentar ver através do nevoeiro” e resgatar alguns pilares importantes. Esses pilares podem nos ajudar a vislumbrar até onde estamos mantendo uma discussão saudável, que nos impulsiona a um futuro que reforça nossas conquistas democráticas; ou se, ao contrário, o debate em que estamos envolvidos está nos levando a um futuro cada vez mais incerto e intolerante.

Nesse sentido, a ideia central a ser reafirmada é a democracia em seu sentido material, ou seja, não apenas como o direito de o cidadão votar e ser votado, mas, também, englobando o direito de as pessoas participarem da vida política do país e, em especial, o respeito às minorias e aos direitos fundamentais.

É equivocada, portanto, a ideia de que a democracia representa apenas a consagração da vontade da maioria. Essa ideia é válida em alguns momentos da vida democrática, como é o caso das eleições, dos plebiscitos e dos referendos. Assim, certo é que gozarão de maior representatividade eleitoral aqueles candidatos (eleições majoritárias) ou partidos (eleições proporcionais) que obtiverem um maior número de votos nas urnas.

Todavia, em diversos outros momentos da vida democrática, as minorias devem ter vez e voz e não simplesmente ser sufocadas ou esquecidas. Assim deve ser porque essas minorias gozam de direitos fundamentais, entre os quais o direito ao tratamento igualitário e à dignidade, reconhecidos expressamente em nossa Constituição Federal e em diversos outros Estados Democráticos. Qualquer regime que se afaste da proteção das minorias, sejam elas raciais, de gênero, de orientação sexual, religiosas ou qualquer outra não poderá se dizer um regime democrático.

Um outro aspecto de uma autêntica democracia que merece ser enaltecido é a separação de poderes, os quais devem se controlar mutuamente. Essa ideia, que remonta aos primórdios do Constitucionalismo, tem a finalidade de permitir que o poder se autocontrole, ou seja, que não haja poderes estatais ilimitados. Nesse arranjo institucional, os Poderes Executivo e Legislativo expressam com maior proeminência a vontade das maiorias, enquanto o Judiciário têm o papel de proteger as minorias. Também aqui, qualquer regime que pretenda embotar a separação de poderes não pode se dizer democrático.

O mundo já assistiu à instalação de regimes não democráticos em diversos momentos e lugares, inclusive na atualidade, regimes que negam as premissas e ideias acima. Mas, há um fenômeno relativamente novo em algumas “democracias” da atualidade que consiste não em instalar ditaduras escancaradas, mas em ocasionar a erosão, o desgaste de instituições democráticas. Essas agressões, apesar de mais sutis, atentam contra os mais caros valores e ideais ligados à democracia.

Assim, inspiram bastante cuidado e preocupação candidaturas messiânicas que demonstram desapreço pelos ideais de nossa democracia, pregando abertamente desrespeito às minorias (declarações homofóbicas, misóginas, racistas) e à separação de poderes (declarações autoritárias, como se o Poder Executivo tudo pudesse), bem como ao próprio processo eleitoral (contestar sem qualquer base razoável a idoneidade das urnas). Não podemos nos iludir, essas são verdadeiras ditaduras da atualidade.

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