Autogolpe

Luiz Otavio Cavalcanti
Ex-secretário de Planejamento e Urbanismo da Prefeitura do Recife, ex-secretário da Fazenda de Pernambuco e ex-secretário de Planejamento de Pernambuco.

Publicado em: 28/09/2018 03:00 Atualizado em: 28/09/2018 08:52

“Em situação hipotética de anarquia, pode haver um autogolpe por parte do presidente da República com apoio das Forças Armadas”.

Palavras do general da reserva Hamilton Mourão, candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro.

Isto é grave.

É crônica de golpe anunciada.

Foi por aí a teoria da ação preventiva que nunca justificou o golpe de 64.

64 foi prolongamento de 54. Quando o vice Café Filho quis tomar o poder impedindo a posse de JK. Não fosse o senso de legalidade do ministro da Guerra, Henrique Dufles Teixeira Lott, Café teria consumado seu intento. De certo modo, 54 foi desdobramento de 45. Em que Gois Monteiro afastou Vargas. Abrindo a porta da redemocratização.

Esse ciclo de intervenções militares, em meio século, tinha um suporte singular. Que poucos conhecem. Naquela época, anos 40, 50 e 60, os generais de quatro estrelas permaneciam na ativa por quanto tempo quisessem. Comandando tropa. Influindo nas decisões da República. E tramando.

Imagine-se um Cordeiro de Farias, ou um Orlando Geisel, com tanque, comando e estrela, dando ordem, tecendo fios da política, por mais de uma década. Foi assim que nasceram os grandes líderes do Exército brasileiro. Acalentados na caserna. E acolitados por oficiais ativos.

Para neutralizar essa força política nos quadros do Exército, o presidente Humberto de Alencar Castelo Branco diminuiu, por lei, o tempo de permanência, na ativa, dos generais de quatro estrelas.

Castelo era um democrata fardado.

Pois bem. Hoje não há como reproduzir-se aquele cenário. Penso que dificilmente ocorreria repetição histórica. Mas, pode ocorrer. Como farsa.

As palavras do general da reserva, Mourão, mostram, por um lado, suposto senso de ordem. E, por outro lado, escondem claro sentido de transgressão. Por que? Porque a ordem está na lei. Não está na vontade do presidente da República. Nem na convicção de civis. Ou de militares. A lei é a base da democracia. Aliás, é isto que petistas também não entendem.

Autogolpe é autoengano. Resulta de desvio de função. É consequência de visão de tutor. Própria de guarda pretoriana. Que não cabe mais no século 21.

Esta é uma reflexão apropriada a tempos de eleição.

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