E quando acaba o afeto?

Mayara Schwambach Walmsley
Advogada especialista em Direito Civil do escritório Da Fonte, Advogados.

Publicado em: 29/08/2018 03:00 Atualizado em: 29/08/2018 09:02

Nominado pelos romanos de affectio societatis, ainda hoje o estado de ânimo continuado de viver em sociedade com outrem, para o alcance do fim social de uma empresa e fomento da atividade econômica, é pressuposto para constituição das sociedades empresárias.

No momento do nascimento da empresa, encontram-se os empreendedores harmonicamente alinhados entre si, empenhados na persecução do fim social então estabelecido. Tudo são flores.

Porém, com o passar dos anos, principalmente após o alcance da estabilidade e sucesso do empreendimento, não raro ocorrem divergências quanto aos interesses anteriormente tão bem alinhados. O objetivo de cada sócio – ou de algum deles – é sobreposto ao interesse da sociedade empresária, pondo em risco a continuidade do negócio.

Os sócios, por vezes, negligenciam o dever de lealdade que devem guardar entre si, em prejuízo das diretrizes contratual e legalmente estabelecidas. Não é demais relembrar: deve o sócio, se não puder contribuir, ao menos abster-se de praticar atos que possam prejudicar a empresa.

Chegado a este ponto, em que o afeto e o ânimo em conviver em sociedade está ameaçado, é posta em xeque, inclusive a sobrevivência do próprio negócio.

Então, o que acontece quando determinado sócio passa a agir – em benefício próprio – de forma contrária aos interesses dos demais sócios e da sociedade empresária?

A construção de uma empresa, de uma carreira, de um empreendimento, vai muito além da solução simplista ditada pela premissa “os incomodados que se retirem”.

Os interesses dos empresários sérios, empreendedores natos, aqueles que fazem a necessária diferença na nossa economia, vão muito além da mera apuração de seus haveres. O que interessa para eles é a preservação do seu legado, do seu nome, do patrimônio intangível construído.

Não à toa, a legislação brasileira prevê uma série de mecanismos legais que possibilitam ao sócio, ainda que minoritário, a adoção de medidas para preservação dos interesses sociais. Dentre eles, estão as ações que visam à anulação ou suspensão dos efeitos de deliberações contrárias ao interesse da empresa, realizadas por sócios majoritários em assembleia. Há também ações que têm por objeto fomentar o dever de transparência e lealdade entre os sócios, destacando-se a tomada de contas dos administradores e a exibição de documentos.

Contudo, se ainda com a adoção de tais mecanismos não for possível trazer a empresa ao eixo e, extinto o ânimo de conviver em sociedade, não há outro caminho senão a sua dissolução parcial, priorizando-se, portanto, a justa manutenção da empresa.

E quem sai? Seja minoritário ou majoritário, deverão ser excluídos os sócios faltosos, desleais.

A eles restam então os devidos haveres.

Ganha a empresa. Ganha a sociedade. Ganha a economia.

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