Editorial Delação viciada

Publicado em: 21/06/2018 03:00 Atualizado em: 21/06/2018 09:46

O indiciamento, pela Polícia Federal (PF), do ex-procurador da República Marcello Miller por corrupção passiva, no intrincado caso da delação premiada dos donos do grupo JBS, é mais um argumento a favor da anulação do acordo de colaboração fechado, no ano passado, entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e os empresários de um dos maiores grupos de processamento de alimentos do mundo. Também foi indiciado pela PF, no mesmo inquérito, o proprietário da empresa, Joesley Batista, por corrupção ativa, além de um executivo da J&F e duas advogadas.

O relatório final da investigação policial, de mais de 300 páginas, deixa claro que Miller, quando ainda era integrante do Ministério Público Federal (MPF), trabalhava para a JBS desde o começo das negociações para a concretização do acordo de delação premiada, o que por si só é motivo mais do que suficiente para que o mesmo seja anulado, em sua totalidade. A conclusão da polícia, indiciando os envolvidos em todo o processo, já foi encaminhada à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Carmém Lúcia, e ao ministro Edson Fachin, relator do caso.

Causa estranheza, nos meios jurídicos, a morosidade com que o relator vem conduzindo a investigação no âmbito do STF, pois há oito meses Fachin está com o caso nas mãos e não tomou nenhuma atitude concreta no sentido de elucidar as negociações, eivadas de vícios, conduzidas pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Ressalte-se que não estão viciadas apenas as tratativas para o fechamento do acordo, mas também as denúncias disparadas pelos irmãos Joesley e Wesley, que foram contestadas por destacados representantes da sociedade.

O pedido de investigação foi determinado pela presidente da Suprema Corte em setembro do ano passado, depois do vazamento de uma gravação de Joesley Batista com um executivo da J&F, na qual eles falam a respeito de contatos e favores recebidos de Miller no período das tratativas do acordo do grupo empresarial com a PGR. Na época, o então procurador-geral da República não teve outra alternativa a não ser encaminhar a solicitação de investigação ao STF. Isso por causa da evidência de que Miller teria atuado pelo fechamento do acordo de colaboração premiada — ele beneficiaria os executivos do grupo empresarial dos irmãos Batista, antes mesmo de se exonerar do Ministério Público Federal.

A omissão do envolvimento do ex-procurador Miller nas negociações da delação premiada para ajudar os executivos foi um dos principais pontos apresentados pela Polícia Federal para seu indiciamento. Diante da conclusão da PF, espera-se que o ministro Edson Fachin termine seu relatório o mais rapidamente possível. E que leve em consideração a atuação do ex-integrante do MPF para, finalmente, tomar a decisão mais sensata diante dos fatos agora conhecidos de todos: a anulação da colaboração premiada da JBS. Um “prêmio”, que por enquanto, teve apenas dois ganhadores: os irmãos Batista.

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