Editorial Os canibais de alma na era da internet

Publicado em: 30/03/2018 03:00 Atualizado em: 30/03/2018 08:22

Em guerras e conflitos é comum ouvirmos a expressão “corações e mentes”,  conceito que exprime a tática de um dos contendores de procurar influenciar a opinião pública local ou estrangeira. Ganhou popularidade com um incensado documentário americano de 1974, Corações e mentes (Hearts and minds), dirigido por Peter Davis, sobre a Guerra do Vietnã. A obra mostra o efeito do uso desse conceito, quando bem-sucedido: a histeria diante de problemas que muitas vezes são mais imaginários que reais. Cria-se um pesadelo e com a ameaça criada - que pode ou não ser real - conquista-se corações e mentes de milhares de pessoas, que passam a apoiar determinadas posições sem sequer desconfiar que foram manipuladas..

Os tempos são outros, mas o - vamos chamá-lo assim - canibalismo de almas continua em busca de suas presas. Com o detalhe de que hoje tem à disposição instrumentos bem mais sofisticados do que os da época da Guerra Fria. Anteontem executivos do Facebook  anunciaram um plano formulado pela rede social para evitar tentativas de interferência nas eleições programadas para diversos países em 2018. Segundo informações do noticiário internacional, “a empresa está tomando uma série de medidas para impedir que pessoas mal-intencionadas, com motivações financeiras, consigam influenciar o voto dos eleitores por meio da disseminação de publicidade e notícias faltas dentro da rede social”.

Na Guerra do Vietnã demonizava-se o “inimigo”, inclusive com a afirmação (falsa, mas que era vista como verdade por muitos cujos corações e mentes estavam suscetíveis a manipulações) de que os asiáticos não tinham apreço pela vida. Eram, portanto, “selvagens” - e matá-los, com tiros ou napalm, não tornava a guerra uma insensatez.  Faz-se algo parecido agora, com notícias falsas sobre determinados personagens ou grupos. Os alvos dessas fake news são desumanizados a ponto de qualquer atitude contra eles parecer justificável. E mesmo que não se chegue a esse extremo, são capazes de gerar antipatia ou simpatia por A ou B e ter influência decisiva numa eleição.

Uma característica particularmente danosa da ação é que ela pode invadir fronteiras sem precisar de tanques de guerra e tendo como base apenas algumas salas num país distante. Parece ficção? Não é: o próprio Facebook informou que, recentemente, descobriu a atuação de um grupo da Macedônia que tentava influenciar a eleição para o Senado no estado do Alabama, nos Estados Unidos. O método da ação consistia no uso de contas falsas - que foram identificadas pelo Facebook e removidas. Por este único exemplo vê-se a dimensão do perigo que temos pela frente. Os canibais de almas ganharam superpoderes e nenhum país está a salvo da ação deles.

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