Entenda por que algumas praias de Pernambuco estão sempre impróprias para banho
Monitoramento da CPRH aponta 12 áreas contaminadas. Esgoto doméstico e escoamento urbano estão entre as principais causas
Publicado: 13/10/2025 às 05:00

Lixo despejado por humanos prejudica saúde pública e vida marinha (Foto: Crysli Viana/DP Foto)
As águas mornas e cristalinas do litoral pernambucano são destinos de moradores e turistas em boa parte do ano, mas apesar de serem paradisíacas, algumas sofrem com níveis mais elevados de poluição por estarem nas proximidades de áreas urbanas. Um balanço divulgado na sexta-feira (10) pela Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH) mostra que 12 trechos de 10 praias analisadas estão impróprios. Ao todo, foram avaliados 27 locais para coleta da água.
Os trechos mais críticos tendem a se concentrar em áreas densamente povoadas. Entre os que aparecem com mais frequência como impróprios estão Janga, em Paulista; Bairro Novo, Carmo e Rio Doce, em Olinda; Pina, no Recife; Candeias e Barra de Jangadas, em Jaboatão dos Guararapes; além de Pilar e Jaguaribe, em Itamaracá. Mesmo após anos de monitoramento, algumas praias de Pernambuco continuam apresentando níveis elevados de contaminação e permanecem sem condições para banho. De acordo com a chefe do laboratório da CPRH, Andrea Xavier, essa situação é resultado de uma combinação de fatores ambientais e urbanos.
“Geralmente os trechos mais críticos estão concentrados em áreas onde há maior influência das cargas. Esses são os pontos que costumam apresentar oscilação na qualidade da água. Entre esses fatores, destacam-se as características naturais das áreas próximas a estuários e foz de rios, a influência do regime de chuvas, a proximidade com áreas densamente povoadas, onde há maior escoamento superficial e de carga orgânica”, explica.
O Programa de Monitoramento da Qualidade das Praias, mantido pela CPRH há anos, realiza coletas semanais em 27 pontos que abrangem 23 praias de 10 municípios do estado. Esses locais foram escolhidos por serem os mais frequentados por banhistas. Após a coleta, as amostras são encaminhadas ao laboratório, onde são analisadas para detectar a presença de coliformes termotolerantes, bactérias indicadoras de contaminação fecal recente.
Segundo Andrea, o método utilizado segue a técnica da Determinação do Número Mais Provável (NMP), com tubos múltiplos, e as análises são feitas semanalmente. “Utilizamos os coliformes termotolerantes como bioindicadores, que são bactérias que podem ser indicadoras de contaminação fecal recente e tem como representante significativo a Escherichia coli”, detalha.
A água é classificada como própria quando 80% ou mais das amostras apresentam até 1.000 coliformes termotolerantes por 100 ml. Já é considerada imprópria quando ultrapassa esse limite ou apresenta mais de 2.500 coliformes na última amostragem. “Quando um ponto é classificado como impróprio, significa que as densidades de coliformes ultrapassam os limites considerados seguros ou aceitáveis. Essas bactérias não são, em geral, patogênicas, mas a presença delas indica que o ambiente aquático recebeu material fecal ou águas contaminadas que podem conter microrganismos patogênicos, portanto, a presença é usada como indicador indireto de risco sanitário”, destaca Andrea.
Por isso, a CPRH recomenda evitar o banho nas áreas sinalizadas e acompanhar os informativos de balneabilidade, divulgados todas as sextas-feiras no site do órgão. Embora o esgoto doméstico seja uma das principais fontes de contaminação, ele não é o único vilão. Andrea afirma que a “presença de coliformes termotolerantes indica que a água recebeu algum tipo de contaminação por matéria orgânica de origem recente, possivelmente de origem fecal. Essa contaminação pode estar relacionada sim a esgoto doméstico, mas também pode decorrer de outras fontes, como o escoamento superficial após chuvas, resíduos de animais ou ainda decomposição de matéria presente no ambiente”.
A chefe do laboratório reforça que o monitoramento da CPRH tem papel fundamental tanto para informar os banhistas quanto para subsidiar políticas públicas voltadas à melhoria da qualidade das praias. A amostragem é semanal em todos os pontos da rede de monitoramento, que foram definidos por serem locais com maior afluência de banhistas. Os resultados do monitoramento da CPRH são públicos e atualizados semanalmente no site, onde é possível verificar quais trechos apresentam melhor ou pior balneabilidade a cada semana.
A CPRH recomenda evitar o banho de mar em quaisquer das circunstâncias abaixo:
- Houver incidência relativamente elevada ou anormal de doenças por veiculação hídrica;
- Acusar recebimento regular intermitente ou esporádico de esgotos por intermédio de valas, corpos de água ou canalizações, inclusive galerias de águas pluviais;
- Indicar presença de resíduos ou despejos, sólidos ou líquidos, inclusive óleos, graxas e outras substâncias capazes de oferecer riscos à saúde ou tornar desagradável a recreação;
- Floração de algas ou outros organismos, até que comprove que não oferecem risco à saúde;
- Nas semanas que forem classificadas como impróprias;
- Sua utilização nas 24 horas subsequentes à ocorrência de chuvas, devido ao maior risco de doenças;
- Outros fatores que contraindiquem temporária ou permanentemente o exercício de recreação de contato primário.
Praias pernambucanas sofrem com lixos invisíveis a olho nu
Tampa de privada, madeira, garrafas plásticas, tecidos e até mesmo animais mortos foram alguns dos lixos encontrados pela equipe do Diario de Pernambuco durante uma visita à Praia do Carmo, em Olinda, no trecho em frente à Praça João Pessoa. No local, algumas crianças tomavam banho de mar despreocupadas enquanto eram monitoradas por parentes, que estavam no banco de areia.
Outro problema sofrido pelas praias do estado é o descarte irregular de esgoto, que prejudica tanto a saúde dos banhistas quanto do ecossistema marinho. Os impactos são múltiplos. Do ponto de vista da saúde pública, o contato com águas contaminadas pode causar doenças gastrointestinais, infecções de pele, de ouvido e oculares.
De acordo com a Compesa, o índice de cobertura de esgotamento sanitário na Região Metropolitana do Recife (RMR) é de 37,52%, enquanto na capital o percentual chega a 49,31%
“A presença de esgoto, com seus resíduos, no ambiente marinho expõe as pessoas a riscos significativos, principalmente aquelas que têm contato direto com a água, como ao mergulhar ou nadar, pois podem ingerir acidentalmente essa água. Essa situação é prejudicial, aumentando a probabilidade de contrair doenças transmitidas pela água, causadas por vírus ou bactérias”, pontua Alexander Turra, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e professor titular do Instituto Oceanográfico da USP.
“Além do banho em águas contaminadas, há também riscos associados ao consumo de organismos marinhos afetados pelo esgoto. Ostras e mexilhões, por exemplo, coletados ou cultivados em áreas próximas a efluentes de esgoto, podem estar contaminados. Ao serem consumidos, esses organismos podem transmitir doenças de veiculação hídrica. Por essa razão, a legislação brasileira estabelece rigorosos padrões para a comercialização de alimentos, visando prevenir doenças gastrointestinais”, destaca Alexander.
A vida marinha também sofre os impactos da poluição, por se tratar de um ecossistema vulnerável às mudanças do ambiente.
“Os nutrientes e a matéria orgânica que estão presentes no esgoto são utilizadas pelos organismos marinhos, em especial, no caso dos nutrientes, pelas algas, pelas microalgas e se multiplicam, o que leva a uma grande quantidade de algas mortas. Elas são consumidas por bactérias aeróbias, ou seja, que consomem oxigênio e esse consumo de oxigênio pode ser tão exorbitante que essa água o perde. Com isso, apenas organismos anaeróbios vão ter a possibilidade de sobreviver”, completa Turra.
Saneamento
A Compesa destaca que Pernambuco enfrenta um problema crônico de ligações clandestinas de esgoto doméstico nas galerias de águas pluviais, que não fazem parte do sistema operado pela companhia. Segundo a empresa, as redes de drenagem são de responsabilidade dos municípios.
Para ampliar o serviço de esgotamento sanitário e garantir mais qualidade de vida à população, a Compesa mantém, desde 2013, o Programa Cidade Saneada, a Parceria Público-Privada (PPP).
“Nos primeiros anos do contrato, já foram entregues mais de 200 mil metros de novas redes coletoras, além de 33 estações elevatórias e oito ETE’s”, destaca a Compesa. O Recife conta com 17 frentes de serviços em andamento e conta com um projeto de expansão do esgotamento que deve beneficiar 38 mil pessoas. Na Região Metropolitana, a Compesa também realiza obras do Sistema de Esgotamento Sanitário (SES) de Porto de Galinhas, em Ipojuca, investimento de R$ 65 milhões.

