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ABUSO SEXUAL

Com aumento de casos de abuso sexual infantil online, psicóloga alerta para fragilidades no digital

Pernambuco já soma 20 casos de abuso sexual online contra crianças e adolescentes

Adelmo Lucena

Publicado: 22/09/2025 às 04:00

Principais vítimas em Pernmabuco têm faixa etária de 8 a 17 anos/Foto: Adobe Stock

Principais vítimas em Pernmabuco têm faixa etária de 8 a 17 anos (Foto: Adobe Stock)

Um levantamento do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) revela que os estados brasileiros e o Distrito Federal ainda não avançaram de forma significativa em medidas de prevenção, apoio ou reparação para crianças e adolescentes vítimas de violência sexual online.

A gravidade do cenário também é evidenciada pela pesquisa TIC Kids Online Brasil, que aponta que 23% dos entrevistados sofreram algum tipo de violência sexual virtual entre 2021 e 2023. Do total, 62,6% tinham entre 15 e 17 anos.

Em Pernambuco, entre janeiro e agosto deste ano, os casos desse tipo de crime saltaram de 11 para 20 em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo dados da Secretaria de Defesa Social (SDS-PE).

A psicopedagoga Kátia Guerra explica que os abusadores exploram fragilidades emocionais das vítimas, muitas vezes desassistidas pelos pais ou sem supervisão adequada.

“Quando a criança está desregulada emocionalmente e não encontra suporte nos vínculos próximos, tende a buscar essa regulação fora de si. O abusador, percebendo essa fragilidade, oferece acolhimento rápido, presentes digitais, elogios e promessas de pertencimento. Também observo com frequência que a solidão e o desamparo são fatores decisivos nessa vulnerabilidade”, destaca a especialista.

Segundo ela, o ambiente digital funciona como terreno fértil para esse tipo de exploração. “Essa lógica da ‘dopamina barata’ é facilmente explorada por abusadores, que se infiltram em jogos, chats e redes sociais oferecendo essa sensação de prazer momentâneo”, complementa.

Outro recurso comum dos criminosos é afastar as vítimas do convívio familiar. “Na clínica, percebo que os abusadores minam essas conexões: afastam a criança da família e dos amigos, criando uma relação de dependência exclusiva no contato virtual. Esse isolamento fragiliza ainda mais a criança e amplia o poder de manipulação do agressor”, observa.

Esse processo, conhecido como grooming, envolve uma aproximação estratégica para conquistar a confiança da vítima, explorando suas fragilidades afetivas.

Efeitos silenciosos

Os impactos, no entanto, vão muito além do ambiente online. Muitas vítimas sofrem de forma silenciosa, sem conseguir relatar os abusos.

“Outro ponto marcante é o impacto na autoestima e na autoimagem. Na clínica, vejo isso refletido em adolescentes que carregam sentimentos de inadequação, que se comparam constantemente com os outros, que se tornam dependentes da aprovação externa e que, muitas vezes, desenvolvem quadros de ansiedade, depressão e comportamentos autodestrutivos”, relata Kátia Guerra.

Ela acrescenta que os danos emocionais podem se prolongar por anos. “Encontro jovens com narrativas fragmentadas de si mesmos, com dificuldade de construir uma história pessoal coesa. Isso gera modos esquemáticos disfuncionais, que se manifestam em padrões de repetição de dor, dificuldade em confiar e bloqueios no processo de amadurecimento emocional, podendo levar para padrões autodestrutivos e prejuízos importantes em seu desenvolvimento saudável”, pontua.

Segundo a especialista, os efeitos também se refletem na saúde física. “No hospital, vejo com frequência crianças e adolescentes que chegam com dores abdominais, cefaleias, alterações de sono e sintomas de ansiedade sem uma causa médica clara”, afirma.

A psicopedagoga reforça que o enfrentamento a esse tipo de violência exige atuação concreta do poder público.

“Quando penso em prevenção e proteção, vejo o quanto precisamos de protocolos claros para identificar sinais precoces de sofrimento digital nos atendimentos hospitalares e clínicos. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) assegura a proteção integral, mas esse direito precisa ser realidade concreta. Para isso, é fundamental fortalecer políticas públicas que capacitem profissionais da saúde, da educação e também as forças de segurança. Uma polícia preparada para lidar com crimes virtuais contra crianças e adolescentes é indispensável, já que muitas famílias não sabem a quem recorrer”, destaca.

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