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DISCRIMINAÇÃO

"Transfobia é equiparado ao crime de racismo", diz advogada trans da OAB

Agressores da personal Kely Moraes na academia em Boa Viagem, na segunda (26), podem ser responsabilizados por crime de transfobia

Carlos Edmundo V. Lopes

Publicado: 28/05/2025 às 12:33

Personal trainer Kely Moraes/Reprodução/Redes sociais

Personal trainer Kely Moraes (Reprodução/Redes sociais)

O caso da personal Kely Moraes, impedida por alunos de uma academia de usar o banheiro feminino do estabelecimento, na última segunda-feira (26), sob a suspeita de ela ser uma mulher trans, reacende a questão sobre o crime de transfobia.

Apesar de Kely Moraes ser uma mulher cis (aquela que se identifica com o gênero que lhe foi atribuído ao nascer) e o caso ter sido registrado pela Polícia Civil de Pernambuco como constrangimento ilegal, vias de fato e ameaça, a ocorrência pode ser enquadrado como transfobia.

É o que explica Robeyonce Lima, primeira advogada trans de Pernambuco e membra Comissao de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB-PE. “Não é pelo fato da pessoa vítima ser uma pessoa cis que vai deixar de ser transfobia. É transfobia da mesma forma”, lembra.

“A transfobia, a LGBTfobia como um todo, é equiparada ao crime de racismo, que é inafiançável e imprescritível. Com isso, as pessoas que cometem tal conduta vão ser responsabilizadas pelas autoridades,” destacou Robeyonce Lima.

A transfobia é qualquer ato de ódio direcionado especificamente para a população trans, que se enquadra em casos de LGBTfobia. No Brasil, não existe uma lei específica sobre esse tipo de crime.

Apesar disso, vítimas que sofreram esses tipos de atos discriminatórios são amparados pela Lei do Racismo, que foi ampliada, em 2019, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para cobrir atos de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.

De acordo com Robeyonce Lima, os dois envolvidos no caso de Kely Moraes podem responder a processos de responsabilidades penais, inclusive no âmbito civil, por indenização por danos morais, diante da conduta discriminatória que foi feita contra a personal. A pena pode variar de dois a cinco anos, além de multa.

Dados divulgados no início do ano pelo dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) mostram que Pernambuco é o sexto estado do Brasil que mais assassinaram pessoas trans entre 2017 e 2024.

Questão do terceiro banheiro

Durante o vídeo registrado e divulgado por Kely Moraes nas redes sociais, um dos agressores justifica a conduta de impedir ela de entrar no banheiro feminino pela existência de um banheiro “inclusivo” no andar de baixo da academia.

De acordo com Robeyonce Lima, não existe nenhuma lei no Brasil que obrigue estabelecimentos a criarem banheiros exclusivos para pessoas trans e que isso nunca foi uma demanda do movimento trans e travesti.

“Nós não somos terceiro gênero. Mulheres trans também são mulheres e homens trans também são homens. Então, tentar justificar um terceiro banheiro na tentativa de tentar apaziguar a situação é uma tentativa de corrigir um erro de uma forma equivocada,” alertou a advogada.

Outros casos no estado

Além do caso da personal, Pernambuco registrou dois casos parecidos em menos de quatro anos. Em dezembro de 2023, uma cliente de um restaurante foi agredida na fila do banheiro feminino ao ser confundida com uma mulher trans.

O caso, que aconteceu no Guaiamum Gigante, no bairro do Parnamirim, envolveu uma professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), identificada como Leilane.

Identificado como Antônio Fellipe Rodrigues Sarmento de Sá, o homem suspeito de agredir uma mulher de 34 anos num restaurante por pensar que ela era transexual, foi preso após prestar depoimento à polícia.

Segundo o delegado responsável pelo caso, Diogo Bem, foi cumprido na época um mandado de prisão preventiva por lesão corporal e pela prática de transfobia, com base na Lei do Racismo.

Outro caso registrado em Pernambuco aconteceu em outubro de 2022, no Mercado Público da Encruzilhada, quando uma mulher trans foi agredida por pelo menos cinco homens em um banheiro do local.

De acordo com relato das testemunhas na época, a mulher foi amparada por funcionários de um restaurante, que conseguiram conter os agressores e trancaram a vítima no banheiro, até a chegada da polícia.

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