Movida por desafios
Primeira mulher a alcançar o cume do Aconcágua a partir do acampamento-base, mineira retorna em busca de outro recorde na mais alta montanha do Hemisfério Sul
Publicado: 16/02/2016 às 10:00
Dormir em uma barraca que simula baixa oxigenação, instalada no próprio quarto, tomar até sete litros de água por dia, treinar 35 horas por semana em preparação que dura até quatro meses. Esses são alguns dos sacrifícios da ultramaratonista mineira Fernanda Maciel, de 36 anos, para se tornar a primeira mulher a percorrer da entrada do parque do Aconcágua, nos Andes argentinos, até o pico da montanha mais alta do Hemisfério Sul, subindo e descendo, em apenas 20 horas – percurso que, normalmente, não é executado em menos de duas semanas. Para completar o trajeto, a mineira sairá de uma altitude de 2.850m para 6.962m, em temperatura que chega a -15oC.
No início deste mês, a belo-horizontina, que vive há sete anos na Espanha, já cumpriu parte de seu desafio pessoal. Na impossibilidade de fazer todo o percurso por causa de condições climáticas desfavoráveis (os ventos chegavam a 90km por hora), Fernanda já estabeleceu o recorde feminino ao completar a distância do acampamento-base (a 4.350m), na Plaza de mulas, ao cume (a 6.962) em 14 horas e 20 minutos – nove horas e meia para subir e três horas e 50 minutos para descer. Foram 17 quilômetros percorridos.
“Consegui concluir a primeira etapa de um sonho. Não existia recorde feminino e meu objetivo era colocar uma marca. Eu e várias campeãs já havíamos tentado e não conseguimos. Tentei duas vezes, quase tive edema pulmonar, já que o corpo não tem assimilação para aclimatar, pois cruzo as etapas muito rápido. Chegava até 6 mil metros; desta vez, cheguei ao topo”, afirmou Fernanda, que embarca hoje para a Argentina e ficará no aguardo de condições climáticas favoráveis, o que está previsto para domingo ou segunda-feira. “Agora estou forte, treinada. Passei um mês lá e me sinto muito preparada.”Formada em direito, com atuação na área ambiental, Fernanda começou a correr em 1998, em provas de rua de 5km e 10km, em Belo Horizonte. A primeira prova em montanha foi em 2006 e, dois anos depois, participou de sua primeira ultramaratona, nos Estados Unidos. Desde então, as aventuras são muitas, do caminho de Santiago de Compostela, na Espanha (860 quilômetros em 10 dias, o que normalmente leva três semanas), à subida e descida da Rocinha, no Rio – o que, segundo ela, ajudou a mostrar ao mundo as mudanças sociais na favela carioca. Ela criou e mantém o projeto White Flow, que desde 2012 tem atuação social e de consciência ambiental.
“É uma forma de aliar as provas a projetos sociais, para mostrar para meus seguidores problemas sociais e ambientais. A situação dessas montanhas, por exemplo, é preocupante, já que muito lixo é deixado para trás pelos próprios montanhistas e não se decompõe”, afirma a mineira, que tem as aventuras acompanhadas por 50 mil seguidores apenas no Facebook.
DEDICAÇÃO Hoje, a mineira mantém uma empresa no Brasil, que gerencia à distância mesmo quando está acampada a mais de 4 mil metros, e se dedica integralmente a ultramaratonas. Em 2015, ela foi vice-campeã mundial do Ultra Trail World Tour, o circuito mundial de ultramaratonas, após somar pontos nas provas da Austrália, Suíça, Japão e Espanha, em competições que variam de 100 a 170km. Depois de cumprir o desafio no Aconcágua, a mineira terá apenas um mês para se preparar para a maratona de Sables, de 251km divididos em seis dias no Saara. “É desgastante, mas me sinto incrível. Quando estou ali, só eu e a montanha, a gente se vê pequena, mas ao mesmo tempo imensa. Não é só um esporte, é um estilo de vida”, garante a mineira.
RESISTÊNCIA
6.962m
é a altitude do Aconcágua, na Argentina, a mais alta montanha do Hemisfério Sul
14 horas
a mineira levou para subir e descer, do acampamento-base ao topo(a 4.350m), num total de 17km de percurso
20 horas
é o tempo que Fernanda pretende gastar para alcançar o cume desde a porta do parque (a 2.850m)

