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Em Pernambuco, R$ 150 milhões da Lei Aldir Blanc não alcançarão toda a classe artística

Publicado em: 14/07/2020 14:31 | Atualizado em: 14/07/2020 19:08

 (Crédito: PMO/Divulgação)
Crédito: PMO/Divulgação

A Lei Aldir Blanc, criada em articulação de parlamentares, gestores e sociedade civil e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no final de junho, emergiu como um fio de esperança para o setor cultural, um dos mais prejudicados pela pandemia do novo coronavírus. A lei institui liberação de R$ 3 bilhões do Fundo Nacional de Cultura, que será repartido para os estados, prevendo o pagamento de três parcelas de R$ 600 para trabalhadores informais da área, além de subsídios para manutenção de espaços artísticos e culturais. Pernambuco, um dos estados com maior diversidade cultural do país, receberá em torno de R$ 150 milhões. Desse montante, R$ 74 milhões serão destinados ao Governo de Pernambuco, enquanto R$ 74 milhões vão para os 184 municípios, de acordo com cota de participação.

O desafio agora é entender como distribuir esse dinheiro de uma maneira que contemple artistas e equipamentos economicamente frágeis. Para isso, a Secretaria de Cultura de Pernambuco e a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco realizam webconferências com representantes das microrregiões. De acordo com Gilberto Freyre Neto, secretário de Cultura, e Marcelo Canuto, presidente da Fundarpe, em entrevista ao Viver, a lei ainda apresenta uma carência de regulamentações que expliquem mais o papel do estado e dos municípios, como um regramento dos repasses. Bolsonaro já editou uma medida provisória que abriu o crédito extraordinário de R$ 3 bilhões aos estados, mas ainda faltaria uma segunda MP que explicaria melhor as regulamentações.

"O grande desafio é a execução em si. Apesar de ser emergencial, faltam amarrações legais. Isso em um período emergencial se transforma em um cabedal. É preciso muita energia. Os órgãos de controle estão sendo muito duros, com razão. A sociedade também está fiscalizando”, diz Canuto. "Essa é a maior transferência de orçamento para o setor cultural de estados e municípios desde a criação do Ministério da Cultura, que atualmente está desativado. Vamos precisar construir uma filosofia de trabalho, entendendo que essa é uma ação emergencial, para ter um controle desses recursos", afirmou Freyre.

Segundo o secretário, o montante "não vai salvar a vida de todos no estado". "A base da dados do Mapa Cultural de Pernambuco revela uma quantidade absurda de pessoas. A criação de critérios de seleção é um papel que estamos dividindo com os conselhos dos municípios, mas ainda precisamos aguardar definições de regras e tipologias. Esses critérios são fundamentais para que a transferência de renda se torne uma ferramenta de justiça social", completa Freyre.

Em abril, antes da aprovação da Lei Aldir Blanc, a Secult e a Fundarpe apontaram suas prioridades para o setor: o pagamento do Ciclo Carnavalesco (R$ 5,6 milhões), parcelas do Funcultura (R$ 7,1 milhões já pagos + R$ 4 milhões a serem pagos até 22 de julho), apoio a festivais e eventos culturais nos municípios antes da pandemia (R$ 2 milhões), mensalidades dos patrimônios vivos (R$ 616 mil e R$ 1,5 milhão até o fim do ano) e a recuperação de equipamentos (R$ 2 milhões), totalizando R$ 21,3 milhões.

"Começamos 2020 equilibrados. Tivemos ações em janeiro, o carnaval, mas aí veio a pandemia em março, quando pactuamos prioridades. Nós decidimos pagar coisas que já ‘rodaram’. Tem uma turma que está sofrendo muito, sabemos como está complicado, mas nós tivemos que honrar esses compromissos”, diz o presidente da Fundarpe. "O orçamento do poder público é feito com projeções de arrecadação. Ouvimos perguntas do tipo: ‘Por que não usam o dinheiro do São João ou do Festival de Inverno de Garanhuns?’. Mas não existiu arrecadação suficiente para a existência das verbas desses eventos. Houve uma retração financeira geral. A queda de receita tem sido de 30%, e também temos que levar em conta que houve um investimento de R$ 1 bilhão na saúde”, continuou Canuto.

EDITAIS
Nas redes sociais, muito se comenta sobre o uso da verba da Lei Aldir Blanc para a criação de editais que estimulem a criação de projetos virtuais para agregar linguagens, ou até mesmo a criação de prêmios. Freyre Neto aponta que Pernambuco, pela sua diversidade cultural, conta com muitas linguagens e artistas de praças sociais diversas. "Quando criamos um edital de chamamento público, existe uma reação. Talvez não consigamos atingir as pessoas que queremos proteger. Não é todo mundo que, nesse momento, tem acesso a determinadas condições técnicas e tecnológicas, a exemplo do maracatu ou do cavalo-marinho. Nem tudo consegue migrar para o universo eletrônico”. Em meio à pandemia, o edital que tem lançamento previsto é o Prêmio Palhaço Cascudo de Incentivo às Artes, que contempla a linguagem circense com montante de R$ 150 mil.

Ainda de acordo com os gestores, a falta de interlocução com a Secretaria Especial de Cultura, vinculada ao Ministério do Turismo, também é um obstáculo no atual contexto. “Faz uma semana que ocorreu o primeiro encontro entre representantes do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de Cultura e um representante do governo federal. Em quase um ano, não tivemos a oportunidade de discutir alguma política. E isso é muito ruim. A movimentação para a Lei Aldir Blanc foi feita para além do executivo, convergindo no projeto de lei”, diz Freyre Neto. “A extinção do Ministério da Cultura é uma sinalização clara de não prestígio da cultura na gestão. A cultura sofre muito porque depende muito da integração”, finaliza Canuto.
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