Diario de Pernambuco
Busca
TV Nova minissérie da Globo, Dois Irmãos tem conflitos familiares com violência física e psicológica Produção estreia nesta segunda-feira e conta com Cauã Reymond no elenco, que interpreta irmãos gêmeos

Por: Breno Pessoa

Publicado em: 09/01/2017 14:20 Atualizado em: 09/01/2017 14:33

Rixas entre parentes estão no cerne da produção adaptada de romance homônimo. Foto: TV Globo/Divulgação
Rixas entre parentes estão no cerne da produção adaptada de romance homônimo. Foto: TV Globo/Divulgação


Conflitos familiares são elemento frequente em histórias das mais diversas. De passagens bíblicas a obras da literatura ou TV, é comum encontrar narrativas que abordem desde simples desentendimentos a sérias rixas entre parentes. O tema está no cerne de Dois irmãos, minissérie da Globo que adapta o romance homônimo de Milton Hatoum, vencedor do Prêmio Jabuti de 2001. Exibido de segunda a sexta, o programa estreia nesta segunda-feira (9), logo após A lei do amor. Os três primeiros episódios já estão disponíveis no GloboPlay, plataforma de streaming da emissora.

"É um tema básico", diz Hatoum sobre o mote da obra, explorado largamente por autores. "A decadência da família tem a ver com o romance do século 19, o romance da formação, que é a história da trajetória de um indivíduo, a passagem da ingenuidade para a vida adulta", explica o escritor.

Influenciado por autores como Tolstói, Tchekhov e Dostoiévski, Hatoum considera que "a grande sondagem da alma humana foi feita pelos escritores russos". E essa carga emocional está bastante presente em Dois irmãos. O drama, da série e do livro, parte da problemática relação entre os gêmeos Omar e Yaqub (interpretados por Cauã Raymond) e as consequências para a família. Com temperamentos e personalidades diferentes, eles se desentendem desde a infância, nutrindo ódio mútuo até a vida adulta.

Outro personagem essencial da trama é Nael (o pernambucano Irandhir Santos), o narrador da história e filho bastardo de um dos irmãos com a empregada da casa, a indígena Domingas (Zahy Guajajara). A mãe Zana (Juliana Paes/Eliane Giardini) mostra predileção e até protecionismo por Omar, o mais impetuoso dos irmãos. Equanto o pai, Halim (Antonio Caloni/Antonio Fagundes), se ressente do distanciamento que o filho mais desordeiro acaba por provocar entre o casal, preferindo, assim, o mais pacífico dos gêmeos, Yaqub.

A postura passional da mãe em relação a Omar, a disputa pela mesma garota na adolescência e os diferentes caminhos seguidos na vida adulta são pontos cruciais do romance, ambientado em Manaus e situado entre os anos 1910 e 1960. Embora o período em que a história se passa seja extenso, o romance não chega a ser um calhamaço, mérito da escrita concisa de Hatoum, que provavelmente será refletida na adaptação televisiva, dividida em dez episódios. A produção das obras, no entanto, demandou bastante tempo. "Foi um longo processo de maturação, reflexão, passei mais tempo pensando do que escrevendo", diz o autor.

E o processo para chegar à TV também foi penoso. A roteirista Maria Camargo desenvolveu o projeto de adaptação em 2003, que acabou não indo para a frente. Quando finalmente a minissérie saiu do papel e as gravações foram feitas, a produção foi interrompida quando os episódios estavam em fase de edição, em 2015. O motivo: o diretor, Luiz Fernando Carvalho, assumiu a novela Velho Chico.

O protagonista, Cauã Reymond, também tem envolvimento de longa data com o romance, aproximadamente uma década atrás, ainda no início da carreira, aos 26 anos. "Quem me deu o livro foi minha mãe e eu falei: 'Eu posso fazer esses dois irmãos'", diz o ator. "Quando aconteceu, eu sabia que tinha o papel da minha vida nas mãos", acrescenta.

Entre letras e imagem
Dois irmãos segue uma tradição de longa data de adaptação de livros para a televisão. Apenas na Globo, foram mais de 200 produções televisivas baseadas em obras literárias, desde a década de 1960, com a novela A moreninha (1965). Antes de Dois irmãos, o próprio Luiz Fernando Carvalho foi responsável por adaptar Dom Casmurro, de Machado de Assis, para a série televisiva Capitu (2008), além do filme Lavoura arcaica (2001), baseado no livro de Raduan Nassar.

Para Milton Hatoum, ter a obra transposta para a tela tem potencial para além da venda de exemplares de Dois irmãos (Companhia de Bolso, R$ 27,90, 200 páginas), agora facilmente encontrados nas prateleiras de livrarias com uma sobrecapa promocional da série televisiva. Antes, em 2015, o livro foi transformado em HQ pelos irmãos gêmeos Fábio Moon e Gabriel Bá. O quadrinho saiu vencedor no Eisner Awards, a maior premiação das HQs, na categoria Melhor Adaptação de Outro Meio.

"Acredito mais do que na quantidade, na qualidade", diz o escritor, otimista com a possibilidade de leitores habituais de best-sellers se arriscarem a embarcar em outras obras. A emissora também parece enxergar o potencial e lança com a série o projeto Assista a Esse Livro, realizado junto a editora Companhia das Letras, para viabilizar o relançamento de títulos adaptados à TV em formato e-book, com cenas das produções televisivas. A primeira obra a sair nesse formato híbrido será Gabriela, cravo e canela, de Jorge Amado, transformada em novela protagonizada por Sonia Braga em 1975.  

3 perguntas: Milton Hatoum // escritor

Dois irmãos foi adaptado para HQ e para a TV. Sente ciúme pelo fato de outros autores deixarem uma marca na sua obra?

Não sinto ciúme dos meus livros, nem um pouco. São outras linguagens, bem diferentes do romance. As adaptações foram feitas com muito rigor. Não fiquei preocupado, já conhecia o trabalho d’Os Gêmeos (os quadrinistas Fábio Moon e Gabriel Bá), os filmes e as séries do Luiz Fernando Carvalho e o roteiro da Maria Camargo, que é excelente. Essas adaptações são como traduções para outra linguagem.

Algo do romance foi perdido na transposição para TV?

Você pode fazer uma adaptação muito inventiva, toda a ação dramática do romance está no roteiro, que não excluiu quase nada do romance, dos conflitos, do quadro histórico. Aliás, o Luiz e a Maria ampliaram o quadro político da ditadura, que no romance não cabe. O que se perde com as palavras e subjetividade do romance pode se compensar com imagens e com outros símbolos, que só o audiovisual pode transmitir ao espectador. A literatura só tem palavras, por isso ela é complexa, por isso ela dá a cada leitor a possibilidade de imaginar coisas, de não fechar a interpretação e a leitura está aberta para muitas possibilidades.

A obra pode ser bem apreciada pelo público da TV?

Sim. Acho que não podemos subestimar a capacidade de compreensão e discernimento das pessoas. Um grande erro dos programas "fuleiros", muito rasos, é esse: desprezar a capacidade das pessoas, até mesmo no quesito estético, político. É esse preconceito que a gente tem que romper. No geral, são muito rasos os programas de TV porque pensam que a população não consegue absorver. O brasileiro, de modo geral, é humilde, pobre, mas isso não tira a capacidade de refletir sobre muitas coisas. Eles têm na vida algo que a classe média e a elite não têm, que é a experiência de vida, a experiência da escassez, de leitura da vida.

Acompanhe o Viver no Facebook:

[VIDEO1]

MAIS NOTÍCIAS DO CANAL