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Nobel Vencedor do Nobel, Bob Dylan já lançou 69 álbuns e uma série de livros Aos 75 anos, o cantor e compositor americano foi o escolhido pela Academia Sueca para receber o principal prêmio de literatura do mundo

Por: Correio Braziliense

Publicado em: 14/10/2016 21:21 Atualizado em:

Compositor é um dos maiores ícones da música folk americana. Foto: THR/Reprodução
Compositor é um dos maiores ícones da música folk americana. Foto: THR/Reprodução


Nem o japonês Haruki Murakami nem o queniano Ngugi wa Thiong’o. O bardo americano Bob Dylan destronou todos os favoritos das casas de apostas e levou o Nobel de Literatura de 2016, anunciado ontem. Pela poesia singular (destilada em canções), Dylan, aos 75 anos, se torna o primeiro compositor a receber o prêmio da Academia Sueca e leva para a casa, além da glória, cerca de R$ 2,9 milhões.

No anúncio, a academia justificou a escolha pelo fato de Dylan ter criado novas formas de expressão poética dentro da tradição da música americana. Secretária permanente da academia, Sara Danius falou rapidamente sobre a importância de Dylan para a poesia em língua inglesa. Ela citou o álbum Blonde on blonde, de 1966, como uma amostra da capacidade do americano. “É um exemplo extraordinário da sua forma brilhante de rimar e do seu pensamento imagético”, disse.

Lenda do folk e da contracultura iniciada nos anos 1960 nos Estados Unidos, Bob Dylan se tornou um dos músicos mais influentes do mundo com a maneira original e particular de entoar as longas e poéticas letras em canções. Ao longo da carreira, que passa dos 50 anos, Dylan lançou oficialmente 69 álbuns e uma série de livros. “Ele foi um artista altamente versátil e trabalhou como pintor, ator e autor de roteiros”, citou também a academia na justificativa para a escolha. O mais recente disco de Dylan é Fallen angels, deste ano. No álbum, ele canta canções imortalizadas por Frank Sinatra.

Doutor em literatura, professor da Universidade Federal Fluminense e autor de um ensaio sobre a poesia de Dylan, Adalberto Müller explica que o compositor reinventou a tradição da balada nos Estados Unidos. “Ele se valia da balada, que é um gênero narrativo dentro da poesia e da música, em que é possível contar uma história. A diferença é que Dylan fundiu essa possibilidade a um aspecto muito mais lírico”, comenta. “Ele carrega nesse aspecto poético, lírico. Cria uma narrativa, mas, ao mesmo tempo, faz algo muito complexo dentro da estrutura literária”, completa.

Para o professor, o reconhecimento de Dylan é importante para a valorização de compositores que dialogam com a tradição literária, mas, além disso, é fundamental para que a própria literatura reconheça uma outra forma de se apresentar. “O que Dylan e outros compositores fazem é uma maneira de levar a alta literatura às massas. É importante para a canção pop, mas mais ainda para reconhecer esse espaço onde a literatura se realiza.”

Letrista genial
O escritor Ricardo Lísias, também doutor em literatura (pela Universidade de São Paulo), elogiou a escolha da Academia Sueca. Em Nova York para uma série de encontros em universidades americanas, Lísias acredita que o prêmio é um reconhecimento da importância da contracultura americana. “A contracultura aqui é muito forte, algo artisticamente muito relevante. Os artistas sempre se aliaram aos movimentos progressistas, os artistas da contracultura. E Dylan é o maior de todos, um letrista genial e um cronista brilhante”, disse. Ele comentou também a recepção dos americanos à vitória de Dylan. “É uma escolha mesmo muito feliz. Eu estava comprando café na Grand Central quando vi dois caras de terno um pouco mais velhos que eu comemorando felizes. É a geração deles, da contracultura. Achei magnífico.”

Poeta e tradutor, Claudio Willer lembra que Bob Dylan foi muito influenciado pela literatura beat. Pesquisador do movimento, Willer conta que o compositor assumiu o nome Bob Dylan depois de ter lido On the road, de Jack Kerouac — seu nome de batismo é Robert Allen Zimmerman. “Acrescento que sou capaz de apontar qualidades poéticas em letras dele. E que isso de criticar ser pop e de um centro hegemônico, não aceito, pois, Nobel premiou gente de tudo quanto é parte, todos os confins, embora estivesse faltando Brasil”, argumenta.

Influenciado pela poética de Dylan, o compositor Walter Franco ressalta a importância do prêmio, sobretudo por colocar um artista como Dylan ainda mais nos holofotes. “O Nobel, na minha opinião, é um facho de luz que é colocado sobre o premiado. E as pessoas passam a vê-lo de uma maneira diferente. O trabalho de Dylan é estimulante, ele é o avô, o bisavô de todos nós e tem uma obra toda de uma poesia extraordinária.”

Polêmicas
Sempre anunciado em uma quinta-feira, geralmente na primeira semana de outubro, o Nobel de Literatura neste ano demorou mais. A Academia Sueca atribuiu a demora a questões de calendário, mas a imprensa sueca afirmou que os membros do júri estariam com dificuldades de chegar a um consenso. A entrada de Sara Danius, segundo os suecos, teria provocado embates sobre o rumo que o prêmio tomaria e qual o perfil do escolhido. Depois da escolha de Dylan, há quem tenha questionado a decisão de premiar um músico. Em 2015, a bielorrussa Svetlana Aleksievtich venceu o prêmio. Desde 1901, quando o escritor francês Sully Prudhomme recebeu o primeiro Nobel de Literatura da história, 108 nomes foram agraciados com o prêmio. Dylan torna-se o primeiro compositor na lista de vencedores da premiação.

O vencedor
Apesar do ineditismo e da importância do Nobel de Literatura para um compositor, ganhar prêmios não é uma novidade para Bob Dylan. O compositor venceu 11 prêmios Grammy, 1 Globo de Ouro e 1 Oscar. Em 2007, Dylan também foi escolhido para o prêmio Príncipe de Astúrias das Artes. Em 2008, Dylan recebeu 1 Pulitzer honorário pelo impacto de sua obra.

No cinema
Como tema de filmes ou parte da produção deles, Bob Dylan também esteve em várias produções da sétima arte. Um dos mais importantes filmes da história da música pop, o documentário Don’t look back, por exemplo, mostra uma turnê de Dylan em 1965. O próprio Dylan dirigiu um documentário sobre outra tunê sua, em 1966. Eat document traz uma icônica conversa entre Dylan e John Lennon. Outra importante produção sobre Dylan, Não estou lá (de Todd Haynes) apresentou, em 2007, a vida do cantor, por meio da ficção.

Nos livros
Além das músicas, Dylan também publicou alguns livros. O primeiro foi a coletânea de poemas Tarantula, de 1971. Ele lançou também Writings and drawings, em que explorava a veia de desenhista e pintor. Em 2004, lançou Chronicles: Volume one, uma autobiografia, que teria outras duas continuações (ainda não lançadas).



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