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Artes cênicas Teatro para bebês é atração da Caixa Cultural Apresentações são voltadas para crianças de 0 a 4 anos; sessões acontecem a partir desta quinta-feira e vão até o dia 17 de outubro

Por: Isabelle Barros

Publicado em: 08/10/2015 08:40 Atualizado em: 08/10/2015 10:18

A atriz Clarice Cardell apresenta o café da manhã aos bebês. Crédito: Caixa Cultural/Divulgação
A atriz Clarice Cardell apresenta o café da manhã aos bebês. Crédito: Caixa Cultural/Divulgação

Para um bebê, o mundo é uma constante descoberta, dia após dia. Ver, sentir cheiros, reconhecer o toque de quem cuida dele, tudo isso faz parte do desenvolvimento natural do ser humano. Mesmo assim, há poucas iniciativas que tragam a primeira infância para mais perto do universo da arte. Uma das ações pontuais nesse sentido acontece com a companhia hispano-brasileira La Casa Incierta, especializada em apresentações para crianças pequenas. O grupo chega ao Recife com a peça de teatro de objetos Café frágil, que entra em cartaz desta quinta-feira (8) a 17 de outubro na Caixa Cultural.

A montagem da companhia baseada em Brasília é pensada especialmente para crianças de 0 a 4 anos. A ideia do dramaturgo espanhol Carlos Laredo e da atriz Clarice Cardell é apresentar, de forma sensorial, o momento do café da manhã. Ela apresenta nove malas ao público, cada uma com um tipo de café diferente.

Em um espaço em forma de caracol, onde há instalações de esculturas, objetos e pinturas, o ato de comer se transforma em uma aventura. De acordo com Clarice, o teatro para bebês tem uma liberdade que pode faltar em espetáculo para adultos. “Ele não tem porque ser convencional ou contra-convencional, é livre de memórias”. Café frágil estreou em 2011 e foi apresentado mais de 170 vezes no Brasil e exterior.

OFICINA E PALESTRA
A La Casa Incierta dará a oficina Brincando com o invisível, voltada para adultos que querem trabalhar o jogo cênico com crianças de 0 a 5 anos. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas pelo email gentearteirape@gmail.com. São duas turmas, com 15 alunos cada, nos dias 10 e 17 deste mês, das 11h às 12h. É preciso informar o contato do adulto e a idade exata da criança. No dia 16, às 14h30, o grupo teatral também participa da palestra A arte na primeira infância, com senhas distribuídas uma hora antes de cada sessão.

SERVIÇO
Espetáculo Café Frágil, do La Casa Incierta
Quando:
De hoje a sábado (11) e de 15 a 17 de outubro; quintas e sextas, às 17h; sábados às 16h e às 18h.
Onde:
Caixa Cultural Recife - Avenida Alfredo Lisboa, 505, Bairro do Recife
Ingressos:
R$ 10 e R$ 5 (meia), com venda apenas na bilheteria
Classificação indicativa:
Livre
Informações:
3425-1900

ENTREVISTA // Clarice Cardell

De que forma você entrou em contato pela primeira vez com o teatro para a primeira infância?

As primeiras peças as que assisti há 20 anos atrás foram na França, tanto no festival Ricochets de Marne-la-Vallée como na Biennale de Théâtre Jeune Public de Lyon. Mas o teatro “para” a primeira infância não é só “para” um público destinatário específico. A primeira infância é em primeiro lugar fonte “desde” a qual trabalhamos, nos inspiramos, aprendemos, pesquisamos e criamos. Nesse sentido, o nascimento e convivência íntima com os nossos filhos foi sem dúvida um contato fundador e revolucionário para nós. O nosso teatro alimentou-se durante muitos anos da observação de crianças em creches e escolas infantis de muitos países diversos. Às vezes, o “desde” é muito mais importante porque marca as origens do que está sendo escrito e o destino, “o para”, é uma aventura nova em cada representação, em cada encontro com o público e cada individuo recém nascido, bebê, criança ou adulto modifica esse “para” com o seu olhar. Às vezes também fazemos teatro “pela” primeira infância, por uma causa determinada pela discriminação e maltrato da sociedade patriarcal em relação a primeira infância.

O teatro para a primeira infância é um campo no qual ocorrem muitas discussões sobre a qualidade do que é fornecido para as crianças. Adaptações de contos da Disney e outros desenhos animados estão em cartaz, enquanto há quem procure outras linguagens. Como você vê o desenvolvimento desse campo no Brasil?
Estamos engatinhando, mas iniciativas vêm acontecendo. Estamos realizando, há 5 anos, o Festival Primeiro Olhar - Arte para a Primeira Infância nas cidades de São Paulo, Brasília, Sao Bernardo do Campo e Rio de Janeiro, em parceria com o Grupo Sobrevento, de São Paulo, que realizou belíssimas criaçoes para a primeira infância. Vários artistas tem começado a entender a arte e a primeira infância como um campo de pesquisa e encontro com a arte. Existe um movimento pioneiro começando no Brasil.

O processo de criação de um espetáculo para bebês difere de alguma maneira do que é pedido em espetáculos para outras faixas etárias?
Não existem regras. O único [desejo] é a necessidade da proximidade física do artista com as crianças e o número de assistentes, para garantir o encontro efetivo entre o artista e o público.

Como prender a atenção dos bebês cenicamente? Vocês investem mais em que materiais e formas de contar suas histórias?

Com catársis, mimésis, evocação, poética e lírica, expressão dramática (tanto trágica como cômica), estética e memória; e tudo isso em forma de rito teatral ou cênico. Ou seja, tudo o que atraía aos espectadores do coro grego quando assistiam ao rito do teatro ou do ditirambo há mais de 2000- 2500 anos. O estudo e a convivência com a primeira infância contribuem de forma eficaz para o encontro do espectador bebê com o intérprete, com a estética e com a dramaturgia de uma obra. É mais importante que a obra emane dos bebês e de seu olhar originário que se destine aos próprios bebês. É uma forma de falar de algo que lhes concerne porque entra no contexto de sua comunicação cotidiana com o mundo adulto e de sua condição arquetípica e mitológica.

Qual o retorno que vocês recebem dos espetáculos que vocês encenam, a partir da visão dos pais que acompanham os filhos?
É sempre uma experiência muito contundente. Quando nos perguntam: "vocês fazem um trabalho pedagógico com as crianças?", dizemos: "com as crianças não, mas muitas vezes com os adultos", pois a experiência de ver o seu bebê atento, em estado de contemplação ao longo de 40 minutos, por uma experiência que não necessariamente segue os padrões estereotipados do que se convencionou em uma estética para a infância, age de forma contundente nos adultos. Abre pelo menos o benefício da dúvida de quem é essa pessoa. E abre perguntas. Acreditamos que o papel da arte está muito mais relacionado com criar perguntas que respostas.

Os cinemas também passaram a investir, por exemplo, em exibições de filmes para bebês. Você acha que essa é uma tendência irreversível, a de ter programações culturais mais inclusivas para a primeira infância?
Acho que vamos avançando no entendimento dos direitos do acesso à cultura para a primeira infância. Nos dias 3 e 4 de setembro, aconteceu em Brasília o 1º Encontro Nacional Cultura e Primeira Infância, uma parceria da Rede Nacional pela Primeira Infância e o Ministério da Cultura. Nós participamos ativamente na realização do Encontro e foi um marco na história do Brasil, onde pela primeira vez foram discutidas políticas públicas da cultura para a primeira infância, com um diálogo com a Educaçao Infantil. É fundamental entender que a primeira infância representa aproximadamente 10 % da população brasileira, e é nesta etapa onde se fundam os pilares da relaçao básica do cidadão com a cultura.



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