Teatro Joelma Fox: quando a drag queen é quem faz a piada e desmistifica o universo gay Comediante desbrava universo (em geral) machista dos stand up como uma das raras drag queens do país a encarar o gênero humorístico

Por: Larissa Lins - Diario de Pernambuco

Publicado em: 22/06/2015 10:30 Atualizado em: 22/06/2015 13:13

Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres
Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres


Na manhã de uma data qualquer, no início dos anos 2000, José Urbano Bruno da Silva acordou listando os compromissos de mais um dia comum. Estava começando a ganhar espaço nos palcos dos teatros e das casas de show do Recife no papel da drag queen Joelma Fox, batizada em alusão à vocalista da banda paraense Calypso, que despontava àquela época.

À noite, acompanharia a “madrinha” (título dado às drags que ajudam outras no início da carreira) Samantha Fox em mais uma performance, com figurino organizado pela mentora. Antes de sair de casa, porém, foi surpreendido. Samantha lhe pediu que vestisse os trajes caricatos ali mesmo, na sala de estar. Poupar tempo não era o intuito, mas conscientizar os pais de Bruno, que circulavam pelo ambiente, sobre a existência da personagem. “Essa é a Joelma”, explicou o ator à família, concluída a caracterização. “E eu ainda sou Bruno.”

Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres
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Quinze anos depois, já firmada como um dos maiores artistas do mundo LGBT no Nordeste, Joelma continua dando o que falar nos palcos, mas agora como uma das raras drag queens do país a fazer um espetáculo de stand up comedy. O desafio seria fazer um texto que levantasse a moral gay num universo basicamente dominado por piadas machistas e homofóbicas profanadas, sobretudo, por humoristas homens.

“Acho que a temática gay - assim como as drag queens - está ganhando espaço. Isso abre portas. As drags se multiplicam. A linguagem também se aprimora. Muitas pessoas chamam a drag para animar festas, e nós nos preocupamos em passar humor sadio. Despido de preconceitos”, comenta.

O projeto do stand up estreou no dia 24 de maio, quando abriu o espetáculo A minha mãe deixa, do mineiro Eraldo Fontiny, famoso pela personagem Lili, no Teatro Boa Vista. A previsão era de que Joelma Fox permanecesse durante 20 minutos no palco, mas o tempo foi duplicado, graças aos aplausos massivos. “Me surpreendi com o sucesso. Foi inegável que deu certo”, comemora Bruno, que elegeu o tema A biografia de um frango, narrando as descobertas de um menino gay.

Agora, pretende retornar ao Boa Vista com montagem solo de uma hora de duração, também no formato stand up. Além disso, engatilha para o próximo mês um projeto que classifica como inovador, no cenário alternativo do Recife, sobre o qual prefere manter segredo. Declarada e sem volta, só mesmo a vontade de seguir carreira como Joelma Fox: “Já somos um só.”

Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres
Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres


No início, trabalhava como vendedor, de dia, e se apresentava, às noites, como drag. Abriu mão da carteira assinada para se dedicar só ao papel de Joelma, após ganhar o aval dos pais. Entre 2002 e 2003, a personagem - criada para entreter a plateia durante a troca de cenários de uma peça, em 2001 - ganhou o Nordeste: Maceió, Natal, Teresina e João Pessoa, já como figura popular entre a comunidade LGBT de Pernambuco. No Centro do Recife, animava as noites da Sauna Thermas Boa Vista, vitrine para empresários da região. Surgiu espaço para a veia comediante.

Participou de Branca de neve e um anão, a convite de Jason Wallace, entre 2012 e 2013, no papel da Rainha Má. Decidiu pesquisar sobre artes cênicas e investir no setor. “Conheci [o empresário] Silvio Ramos, que me propôs assinar a coluna As aventuras de Joelma Fox, na revista Antena Mix”, conta Bruno. E a personagem deu certo.

>> NÚMERO
40 a 60 minutos
é o tempo para José se transformar em Joelma Fox

Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres
Foto: Brenda Alcantara/Esp DP/D.A Pres


>> ENTREVISTA: Joelma Fox
Como foi a experiência no ramo de stand up comedy?

Os textos brincam com essa história de chamar os gays de frango. Faço associações com nomes de animais, questiono essa piada batida. Brinco com a rotina de um homossexual, no papel de drag queen, a fim de passar a mensagem de que o dia a dia de um gay não difere em nada do dia a dia de um hetero. Na estreia, eu tremia, suava. Os 20 minutos previsto se transformaram em 50.

Qual o diferencial da Joelma? Os pontos fortes?
Meu ponto forte é minha comunicação com a plateia. Gosto de me comunicar como se fosse com meu irmão, amigo... Informalmente. Para mim, funciona como conversa, não como prestação de serviço [à plateia]. Quero que o público saia satisfeito. É o que as pessoas merecem, depois de um dia exaustivo de trabalho, de uma rotina que nem conheço. Você nunca sabe das tragédias por trás da plateia. Me preocupo muito com isso. Quero que a pessoa saia feliz. E só. Piadas e brincadeiras de mau gosto não colam.

>> O QUE ELES PENSAM

BRUNO ROMANO, semifinalista do Prêmio Multishoh de Humor:
É importante esclarecer que o stand-up trabalha com textos próprios e comediantes de cara limpa, mas acho fantástico esse trabalho de dar vida a uma nova pessoa. É mais fácil a Joelma passar cinco minutos fazendo o texto dele de cara limpa do que eu, como comediante de stand-up, fazer um personagem.”

GUSTAVO PARDAL, campeão da 2ª Maratona do Humor do programa Tudo é possível, da Record: “Nunca vi a Joelma Fox no palco, mas, como ela já trabalha com humor, vai ter mais facilidade de fazer stand-up. Esse tipo de comédia traz histórias do dia-a-dia. Se ela colocar situações que vive, vai ficar muito engraçado. Só é preciso tomar cuidado com esse início de trajetória. É bom que vá se adaptando aos poucos a essa linguagem para ir melhorando com o tempo”.






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