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SOLIDARIEDADE

Grupo de voluntários oferece festa de aniversário para morador em situação de rua no Recife

Publicado em: 16/12/2021 15:08

José Antônio vive nas ruas do bairro da Iputinga e ganhou festa de aniversário  (Foto: Divulgação)
José Antônio vive nas ruas do bairro da Iputinga e ganhou festa de aniversário (Foto: Divulgação)
Um ato simples de solidariedade comoveu, de maneira surpreendente, os voluntários do grupo Nossa Ronda Solidária, que atua, na cidade do Recife - Pernambuco, sob a coordenação do coletivo Unificados Pop Rua, no dia 12 de dezembro de 2021.

A cada quinze dias, nas noites de sexta, o grupo Nossa Ronda Solidária assiste algumas das mais de 1.700 pessoas em situação de rua, no Recife, distribuindo comida e kits de higiene. Uma dessas pessoas é o Seu José Antônio, natural de Bom Jardim-PE e personagem principal dessa história que, além de emocionante, é uma verdadeira lição para a vida. 

Seu José Antônio, nascido em 12 de dezembro de 1955, costuma ser encontrado em uma das ruas do bairro da Iputinga. Como as rondas de distribuição acontecem à noite, ele é sempre visto já deitado, com um pouco da mobilidade comprometida pela idade e situação vulnerável, dormindo ou pronto para dormir, sobre alguns papelões e lençóis velhos. Apesar da sua condição, sempre recebe os voluntários, como a grande maioria das pessoas assistidas pelo grupo, de maneira muito afetuosa.

Em uma das rondas, o seu José foi presenteado com um colchonete e ao recebê-lo, agradeceu de maneira até emocionada e fez questão de dizer: "obrigado, vai ficar mais quentinho, eu mereço". Essa frase tocou o coração do coordenador do grupo, Luchino Marchi, levando-o a sugerir uma mobilização para realizar uma pequena festa de comemoração pelo aniversário do Seu José. A intenção era reforçar a sensação de merecimento, tão distante para muitas da pessoas como o Seu José Antônio que, por vezes, são ditas como invisíveis aos olhos da sociedade, como se não possuíssem identidade ou valor, e excluídas do exercício legítimo da cidadania.

Então, após algumas semanas de organização, o grupo chega, no final de tarde do domingo, 12 de dezembro, ao encontro de Seu José Antônio, com bolo, refrigerantes, doces e balões. Seu José Antônio estava de pé, tomado banho, com roupa nova e braços abertos esperando ansioso pela sua festa. Ele estava erguido, como quem se põe digno dele mesmo. Sem dúvidas, essa cena tão significativa e as emoções despertadas por ela ficarão vivas na memória do grupo, fortalecendo ainda mais esse serviço à fraternidade.  
 (Foto: Divulgação )
Foto: Divulgação

Seu José, que dribla a matemática fazendo a conta da idade do jeito que quer (diz ter 67 anos), em meio à comemoração, animada pela presença de muitas crianças do entorno, contou sobre o falecimento dos pais, o sentimento de solidão e, saudosamente, sobre a Pedra do Navio - ponto turístico da sua cidade natal. Durante o papo, não se fez de rogado e posou, feliz, para muitas fotos. Aliás, ele mesmo sempre pedindo mais cliques, com seus olhinhos apertados, emoldurados pelo tempo e pela dura vida na rua, transbordando em emoção.

Ele, com seu jeito manso, ensina, também, sobre ouvir. Durante as conversas, olha sempre nos olhos e, quando perguntado sobre qualquer coisa, espreme um pouco os lábios, engole a saliva e, com doçura, responde depois de um breve silêncio. Esse espaço vago que seu José Antônio imprime, naturalmente, na conversa, é, também, lição necessária à sociedade da pressa e da desatenção. Talvez, se aprendêssemos com o Seu José Antônio, tornaríamos melhor a vida através do estabelecimento de diálogos mais humanos.

E, por falar em lição, Seu José Antônio foi muito generoso. Durante a oração de encerramento da celebração, ação que o grupo cultiva em todos os trabalhos, tanto na abertura quanto na finalização das rondas, o grupo agradeceu pela vida do Seu José Antônio, como era conhecido, ao que ele, em alto e bom tom, fez questão de responder com seu nome completo, como quem diz: eu existo.

Sim, pessoas como o Seu José Antônio, realmente, existem e são preciosas com suas histórias e sonhos. O Nossa Ronda Solidária é, sem dúvidas, um grupo renovado depois de se permitir passar pelo abraço do Seu José Antônio. Um grupo depurado, mais conectado ao amor e à lembrança de que elas, as pessoas "invisíveis", existem e merecem uma vida melhor, digna de pessoas íntegras e amparadas, equanimemente, para expressarem suas riquezas de alma humana.

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