Pandemia

Médico relata depoimentos emocionantes de famílias de pacientes com a Covid-19

Publicado em: 12/05/2020 17:39 | Atualizado em: 12/05/2020 17:56

Bruno Ishigami faz ligações diárias para atualizar famílias sobre estado de saúde de pacientes (Foto: cortesia)
Bruno Ishigami faz ligações diárias para atualizar famílias sobre estado de saúde de pacientes (Foto: cortesia)
“Diga que mandei a ‘bença’ pra ele.” Bruno Ishigami, 29 anos, médico infectologista, encerra a ligação após ouvir o recado. É de uma filha para o pai, internado com a Covid-19 em um hospital público de Pernambuco. Todos os dias, Bruno mantém as famílias informadas sobre o estado de saúde dos pacientes. Desde quando passou a atuar no combate à pandemia, o médico se descobriu ouvindo narrativas repletas de humanidade sobre os ocupantes dos leitos da Covid-19. O distanciamento entre os familiares, diz Bruno, é uma das maiores dores durante o tratamento. 

Dia desses, Bruno decidiu divulgar em seu perfil no Twitter algumas falas de famílias que têm marcado o dia a dia dele nos dois hospitais públicos onde trabalha no combate à Covid-19. Bruno entende suas postagens como uma forma de extravasar as próprias angústias. “Não é a conclusão dos casos que me marca, e sim o laço de amor que une pacientes e familiares.” A maioria das narrativas é de filhos e filhas para os pais e mães. “Ela lutou tanto para nos criar e agora a gente não pode dar um abraço, um cheiro. Ela é a rainha da família. Só quero que ela volte para casa para eu falar: mãe, eu te amo”, escutou Bruno, do filho de uma paciente.

No Dia das Mães, celebrado no último domingo, as famílias das pessoas internadas estavam ainda mais sensíveis nas conversas ao telefone. Mas havia planos felizes. “Eu disse a ela que vai ser prorrogado o nosso Dia das Mães! Vai ser só na semana que vem”, disse uma filha. Naquele dia ela nem sabia. Mas a mãe teria alta na segunda-feira (11). E assim foi. Uma outra mensagem escutada por Bruno falava de cuidados com a matriarca. “Cuide da minha mãezinha. É o primeiro Dia das Mães que a gente passa longe dela. Quando a gente recebe esse telefonema é um alívio muito grande. Antes, quando ela se internava, a gente podia ficar junto dela. Agora não. E essa é a pior parte.”

As ligações seriam apenas para atualizar o quadro de saúde dos pacientes. Mas elas têm sido muito mais. Bruno é ponte importante no processo de cura e de alento das famílias atingidas pelo coronavírus. As declarações de amor nunca ditas terminam confessadas do outro lado da linha. E Bruno escuta. E repassa. “Doutor, o senhor me ajude, por favor! Traga a minha esposa de volta”, apelou um homem.

Nesta segunda-feira (12), o médico preparou uma surpresa para as famílias. No lugar de uma ligação simples, fez chamadas de vídeo para os parentes dos pacientes que vinham relatando saudade. Cinco encontros virtuais foram possíveis nesta manhã. Todas as ligações foram feitas do próprio telefone de Bruno. “Um dos pacientes estava muito ruim. Quando a ligação acabou, ele estava feliz, sorridente. Também chorou. Foi bem bonito.”

Para Bruno Ishigami, as chamadas em vídeo resgatam a humanidade. Da mesma forma que as famílias e amigos também se falam com essa ferramenta quando estão fora do hospital. “No domingo, falei com minha família. Chorei muito. Sinto saudade. Não sei quando vou abraçar meus parentes novamente.”

Bruno mora com a companheira, também médica em ação no combate à Covid-19, e está afastado de outros parentes para evitar contaminação. As ligações para repassar o quadro de saúde dos pacientes, ele faz de casa. Conta que é menos tempo exposto nos hospitais. Ao todo, são 54 horas por semana dedicadas ao combate à pandemia.

“A gente percebe que no momento mais sofrido de nossas vidas, quem está junto é a família, sempre. Pode ser um parente distante, uma sobrinha, um tio, mas sempre tem alguém da família no momento de fragilidade. É onde os pacientes encontram suporte e motivação para seguir em frente e enfrentar a doença. Por mais que a gente veja histórias tristes, o que mais me marca é ver o amor das relações familiares e a importância delas”, reflete Bruno.

Em um dos hospitais, o médico coordena uma equipe com três médicas, onde cada uma delas acompanha dez pacientes. Bruno também precisa falar com as famílias sobre pacientes que não resistiram. E esse é o pior momento. Porque ele não olha nos olhos. Quase impossível encontrar formas de confortar quem está do outro lado da linha. Mas essas ligações são em menor número, conta. Sua maior prioridade hoje é ser mensageiro de boas novas.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.
MAIS NOTÍCIAS DO CANAL