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Polêmica

Pessoas trans deixam espetáculo da Paixão de Cristo de Casa Amarela

Decisão aconteceu após comentário de um dos organizadores do evento

Publicado em: 18/01/2019 12:13 | Atualizado em: 18/01/2019 12:29

Espetáculo acontece há 17 anos e é um dos mais importantes do Recife. Foto: Nando Chiappetta

Às vésperas do Dia da Visibilidade Trans, lembrado em todo o país em 29 de janeiro, um fato ocorrido nos bastidores da Paixão de Cristo de Casa Amarela, na Zona Norte do Recife, provocou insatisfação e a posterior saída das pessoas transexuais chamadas para participar do espetáculo, que acontece nos dias 18, 19 e 20 de abril, no Sítio da Trindade, no Recife. A Articulação e Movimento para Travestis e Transexuais de Pernambuco (Amotrans) publicou uma nota de desagravo em sua página do Facebook lamentando o episódio.

Genivaldo Francisco, fundador do projeto Fábrica fazendo arte, contou ter sido convidado para fazer a produção do espetáculo e pensou em uma apresentação inclusiva, com a participação de pessoas em situação de rua, trans ou em tratamento de dependência de álcool e outras drogas, público-alvo de seu projeto. “A ideia era convidar mulheres trans pela primeira vez para papéis que não fossem na cena do bacanal de Herodes. Ficamos surpresos que, durante o processo de construção do espetáculo, fomos questionados e obrigados a censurar a participação dessas pessoas em outras cenas ou mesmo divulgar que haveria pessoas trans na peça para evitar problemas com a Igreja Católica. Justificaram que o arcebispo e alguns padres que iriam assistir à peça não iriam gostar”, criticou Genivaldo.

Gigi é arte-educadora e sentiu-se ofendida com comentário, segundo ela, excludente. Foto: arquivo pessoal

A arte-educadora Gigi Abagagerry, 34 anos, era uma das mulheres trans integrantes da produção do espetáculo. “Tive a oportunidade de fazer este ano as oficinas de seleção de atores, mas já participei da cena do bacanal em outra ocasião. Os idealizadores do espetáculo vieram com uma história de que o arcebispo não gostaria de ver transexuais no palco e só queria que a gente participasse do bacanal. Nossa visibilidade só é vista como prostituição”, criticou.

Gigi foi moradora de rua e usuária de crack durante dez anos. Hoje, vive com o companheiro em um imóvel e livrou-se da dependência das drogas. “Passei dez anos na exclusão e me senti ofendida com o comentário. Quando penso que tudo isso já tinha acabado, de ser maltratada, de repente, quando estou me levantando, à frente da produção de um elenco, sou excluída por ser trans. Se uma sai, saem todas”, disse, referindo-se à participação de outras trans.

José Muniz da Silva Moura integra a coordenação do espetáculo e convidou o grupo Fábrica fazendo arte. Ele disse que a informação não procede. “Sou uma pessoa que sempre lutou pelos direitos humanos. Apenas falei para Genivaldo que a paixão tem 17 anos e temos um elenco antigo, que faz parte todos os anos. Então, queria saber onde o pessoal que ele propôs participar se encaixaria. Por isso, acharam que eu estava discriminando. Eles podem participar da cena que quiserem, sem problemas. Jesus Cristo veio para as minorias”, justificou. Genivaldo disse que a decisão de deixar a peça, no entanto, já está tomada e que não irá voltar atrás.
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