Diario de Pernambuco
Busca
Orgulho Jovens negros redescobrem a beleza dos cabelos, assumem o formato natural e se sentem mais livres

Por: Marcionila Teixeira

Publicado em: 19/11/2015 07:26 Atualizado em: 19/11/2015 08:28

Isa abriu mão da química para os alisamentos e se sente mais bonita. Foto: Nando Chiappetta/ DP/ DA Press
Isa abriu mão da química para os alisamentos e se sente mais bonita. Foto: Nando Chiappetta/ DP/ DA Press
A transformação de Isa Gabriela Sena, 17 anos, começou de dentro para fora. Em outubro do ano passado, quando convidou a mãe para cortar seus cabelos bem curtos, tinha total consciência sobre tal ato. Desde aquele dia, ganhou cachos volumosos no lugar de fios repletos de química de salão de beleza. Ganhou liberdade e deixou para trás obediências a convenções. Hoje, se considera uma mulher mais bonita, empoderada como negra.

O cabelo de Isa, na realidade, é apenas um dos símbolos de suas ideias. Ela não deseja ser exótica, nem estar na moda. A adolescente sabe do tamanho da luta a ser travada diariamente para a garantia de conquistas da pessoa negra. E a batalha não é ganha apenas com um cabelo crespo. “Desde os 13 anos, minha mãe me levava para alisar o cabelo no salão porque dizia que dava trabalho para pentear. Na escola, muitos colegas chamavam meu cabelo de bombril. No ano passado, comecei a conhecer nas redes sociais histórias de mulheres negras deixando a química para trás, empoderadas. Percebi que por muito tempo quis me encaixar no padrão e na realidade de meninas brancas, com cabelos grandes e lisos. Aos poucos, descobri que meu cabelo natural era bonito.”, lembra.

Victor Gomes, 17, diz não entender porque a estética do branco é dominante no Brasil se a maioria da população é negra. Há três anos, resolveu fazer diferente. Mudou as ideias. Mudou o cabelo. “Até hoje algumas pessoas da família falam que eu devia cortar. Como a raça negra é associada à criminalidade, nos ônibus, de madrugada, tem gente que tem medo de mim. Percebo os olhares”, lembra.

Victor não está incomodado. "Acho que minha imagem ajuda a aumentar a auto-estima de outras pessoas negras". A professora Carmem Dolores Alves, mestre em educação com o trabalho A implementação da lei 10.639 nas escolas municipais do Recife e ganhadora do Prêmio Geledés, com o projeto Conhecendo a África através das brincadeiras, defende a valorização da identidade dos alunos e alunas negras nas escolas. “As pessoas estão se empoderando cada vez mais de uma estética antes considerada feia. Hoje os casos de racismo parecem ser mais gritantes porque os negros estão mais empoderados, não têm mais vergonha de exibir suas características”, explica. Algo que não se resume ao cabelo, diz, mas também ao jeito de vestir, por exemplo.

Carmem desenvolve atualmente o projeto Ciranda da leitura de contos africanos e afro-brasileiros para incentivar a produção autoral de crianças e adolescentes do 4º e 5º anos da Escola Reitor João Alfredo, na Ilha do Leite. A ideia é difundir a valorização da identidade. Respeite o cabelo pixaim foi uma das publicações resultantes do projeto. Com base na releitura do conto afro-brasileiro O mundo começa na cabeça, que conta a história de como os penteados das crianças são valorizados em aldeias africanas, as crianças prepararam a obra com a ajuda da professora. A mesma iniciativa deu certo na Escola Paulo Freire, nos Torrões.

MAIS NOTÍCIAS DO CANAL