10 ANOS SEM EDUARDO
"Fez da política um instrumento de esperança", diz Pedro Campos sobre trajetória política de Eduardo Campos
Em entrevista exclusiva ao Diario de Pernambuco, deputado federal comenta legado do pai em Pernambuco e no Brasil
Por: Guilherme Anjos
Por: Ricardo Novelino
Por: Ricardo Novelino
Publicado em: 13/08/2024 05:40 | Atualizado em: 13/08/2024 08:41
Pedro Campos em entrevista ao Diario de Pernambuco (Foto: Priscilla Melo/DP) |
Dez anos depois de sua morte, o ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos, tem seu nome estampado em ruas, praças e obras públicas, e é repetido por militantes e medalhões da política estadual e nacional como um sinônimo de desenvolvimento e liderança.
Hoje, no entanto, sua principal herança política são os seus filhos João Campos (PSB), prefeito do Recife e candidato à reeleição, e Pedro Campos (PSB), deputado federal.
Em entrevista exclusiva ao Diario de Pernambuco, Pedro fala sobre o legado deixado por seu pai, a continuidade do trabalho, e relembra ensinamentos.
Diario de Pernambuco: Como o senhor vê o legado de Eduardo Campos?
Pedro Campos: Um recado de que a política deve ser um instrumento de transformação da vida das pessoas, e deve ser o lugar onde o discurso vira prática. Ele era um político que falava muito bem, com valores e princípios claros, mas conseguia colocar tudo na prática.
Era o grande diferencial dele: construção política, articulações e alianças sempre pensando num projeto de transformação, deixando desavenças para trás.
DP: Eduardo dizia muito “eu acredito no Brasil”. Na última grande frase dele, na entrevista à Globo, ele diz “não vamos desistir do Brasil”. Como era isso de ‘acreditar’ sempre?
PC: Ele tinha uma visão muito esperançosa em relação à capacidade que a política pode ter de melhorar a sociedade. Mas ele não era aquele otimista que ficava esperando acontecer, ele acreditava na força do trabalho, em ter esperança e fazer a coisa certa. Isso vinha de Arraes.
E em oito anos, ele viu isso acontecer em Pernambuco, enquanto muitos acreditavam que era impossível. E sua passagem pelo Ministério da Ciência e Tecnologia mostrou que existe um Brasil com muito potencial de ser vanguardista.
DP: O que Eduardo aproveitou de Arraes? E o que chegou para vocês, os filhos que também estão na política?
PC: Valores e princípios, uma crença na democracia. Valorizar a luta do povo, entender que as pessoas precisam participar através da luta, das associações comunitárias, dos sindicatos rurais, para que políticas públicas tivessem um espaço de discussão e de participação das entidades no desenvolvimento do município.
Eduardo traz uma marca de eficiência na gestão pública, de cobrar resultados, ter grandes programas de gestão voltado para a obtenção dessas políticas públicas. Essa é a linha que une a atuação de Arraes e Eduardo, e nos une em perseguir essa mesma forma de fazer política.
DP: Como Eduardo forjou vocês na política? Era um exemplo para seguir, ou foi planejado?
PC: Ele tinha uma preocupação em relação à nossa formação cidadã, humana. Sabia que isso era produtor de liberdade. Com pensamento crítico, você segue o caminho que quiser. Não tinha uma preocupação, da parte dele, em relação à participação em política eleitoral.
Mas ele sabia que, formando cidadãos, estaríamos prontos se nosso caminho fosse a política. E nunca pressionou de forma nenhuma. Esse caminho surge diretamente após a morte dele.
DP: Um traço que o senhor herdou do seu pai, na figura de político?
PC: Gosto de fazer da política um espaço de fala. É parte do trabalho, até a palavra ‘parlamentar’ vem ‘falar’. Precisamos usar esse espaço para criticar, valorizar, levantar a nossa voz quando quiserem fazer algum retrocesso. Essa era uma característica dele.
Como deputado federal, nosso mandato tem crescido na capacidade de articulação para aprovar projetos importantes. É outro traço dele, construir consensos para fazer acontecer na vida das pessoas.
DP: Politicamente, Eduardo deixou uma lacuna. Ele conseguia agregar, e negociava com qualquer um, até rivais históricos. Hoje, está faltando um Eduardo?
PC: Quando ele renunciou ao governo para disputar a presidência, estavam presentes todos os ex-governadores vivos do estado, que não necessariamente subiram no palanque dele, mas o entendiam como uma grande liderança.
O que João tem feito na Prefeitura do Recife nos dá esperança de ter uma liderança do estado que fale com o Brasil. Isso faz falta. Eduardo participou de discussões importantes onde ele era uma voz escutada na política nacional.
Outros políticos da história de Pernambuco conseguiram ter essa proeminência, mas desde Eduardo sentimos falta de lideranças com peso e relevância nacionalmente.
DP: Eduardo faz falta nesse momento em que ele poderia ser uma ‘terceira via’?
PC: Ele faz falta no sentido de ser uma pessoa que era capaz de dialogar com quem pensava diferente, mas ele sempre foi muito firme nas suas posições e convicções. Hoje, vemos surgir pessoas que se colocam como alternativa, mas se escondem, não mostram quais os seus valores, princípios, pretensões.
Eduardo tinha mais de 20 anos de trajetória política, e deixava claro quais eram os valores e os princípios que o norteavam enquanto ator político. Mesmo assim, conseguia se colocar como uma alternativa.
DP: Houve algum ensinamento póstumo que vocês obtiveram do seu pai?
PC: A própria partida dele é algo que ficou marcado na nossa vida para vivermos um dia de cada vez e sermos intensos naquilo que fazemos. É preciso fazer as coisas no tempo presente, ser intenso no hoje e entregar o amanhã nas mãos de Deus.
Também tivemos a oportunidade de aprender muito com as pessoas que conviveram com ele, como amigos, a minha mãe, pessoas que trabalharam com ele diretamente. Hoje, João tem Fred Amâncio na Prefeitura, que foi secretário (de Eduardo). Eu trabalho com Evaldo Costa, ex-secretário de imprensa.
O próprio presidente do PSB, Sileno Guedes, e os deputados estaduais Waldemar Borges e José Patriota foram parceiros de política, são grandes conselheiros, e nos ajudam a fazer uma reflexão do que Eduardo faria se estivesse aqui nesse momento.
DP: O que o senhor acha que Eduardo estaria fazendo agora? Como ele estaria vendo o mundo e o Brasil depois desse duelo de esquerda com extrema-direita?
PC: O cenário do país poderia ser muito diferente se ele estivesse vivo. Tenho plena convicção que ele seria eleito presidente em 2014. Muita gente acredita que ele poderia ser presidente em 2018, mas ele estava animado para 2014.
Ele estava numa estratégia de crescer ao longo da campanha. Ele era muito bom de debate. A expectativa dele era que, a partir do debate da Globo, ele poderia ir para o segundo turno. E acredito que ele teria grandes chances de vitória.
O fato de ter sido governador do Nordeste, ter o estado de Pernambuco junto com ele, e o Nordeste também ter esse sentimento, poderia ser o ponto de mudança em um segundo turno com Dilma, que era o cenário mais natural. A diferença de resultado no Nordeste poderia ser suficiente para dar a ele a vitória. E eu acho que isso mudaria muito os rumos do país.
Agora, se ele voltasse no cenário de hoje, acredito que ele estaria engajado nesse projeto de estabilização política do país, de consolidação da democracia, que era uma coisa que não era para a gente estar precisando falar depois de quase 40 anos da redemocratização.
E isso ele já falava desde 2013, naqueles movimentos de junho. Havia uma inquietação com a incapacidade do Estado brasileiro de entregar melhoria na vida das pessoas. E ele percebia que você só consolida a democracia do país se for vantajosa para as pessoas, se garantir emprego, educação de qualidade, saúde. É preciso que a democracia dê resultado na prática.
DP: Como você definiria Eduardo Campos em uma frase?
PC: É muito difícil definir Eduardo em uma frase. Ele teve uma trajetória e uma força que merecia um livro. Foi alguém que viveu intensamente a política, e que fez da política um instrumento de esperança para as pessoas.
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