RELAÇÕES

Silêncio de Bolsonaro sobre ataque russo gera desconforto diplomático

 (Foto: Gustavo Magalhães/MRE)
Foto: Gustavo Magalhães/MRE
O silêncio do presidente Jair Bolsonaro (PL) sobre o ataque da Rússia à Ucrânia, gesto que contrastou com outros presidentes latino-americanos que condenaram a agressão, gerou grande desconforto diplomático para o Brasil. A única menção que fez à guerra foi quando publicou, no Twitter, que está "totalmente empenhado no esforço de proteger e auxiliar os brasileiros" em solo ucraniano. Na verdade, ele reproduziu a nota do Ministério das Relações Exteriores (MRE) com orientações para quem quiser deixar o país.

A atitude de Bolsonaro levou o encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos, Douglas Koneff, a cobrar uma postura clara. "As falas que condenam as ações russas que violam as leis ajudam muito a diminuir essa crise", observou.

Cobrança semelhante fez o encarregado de negócios da embaixada da Ucrânia no Brasil, Anatoliy Tkach."Esperamos que o governo brasileiro condene esse ataque ao nosso país", anotou.

Bolsonaro, que esteve há poucos dias em Moscou com Vladimir Putin e chegou a dizer que apoiava as ações russas, não fez qualquer comentário relacionado à guerra em uma inauguração da qual participou em São José do Rio Preto. Antes do evento, o presidente comandou uma motociata.

Crítica eleitoral
Nesse evento, preferiu atacar o PT a mencionar o ataque russo. "Outras pessoas que diziam que olhavam pelos nordestinos, olhavam, talvez, como uma fonte de receita para a sua quadrilha, e não uma fonte de recurso do caso da Petrobras e BNDES para ajudar o seu povo", disse.

O silêncio de Bolsonaro foi percebido na internet. De acordo com levantamento da Modalmais/AP Exata, divulgado ontem, a rejeição ao presidente no Twitter chegou a 77% por não se posicionar sobre a guerra.

Para Günther Richter Mros, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), "o Brasil não tem uma relação direta com o conflito, mas a situação nos afetará diretamente se os bloqueios econômicos atingirem os fertilizantes e o país, mesmo assim, comprá-los da Rússia. O Brasil vai se indispor com mais países ainda".

Apesar do silêncio durante o dia, na live de ontem à noite Bolsonaro criticou o vice-presidente Hamilton Mourão. "Com todo respeito à pessoa que falou isso, está falando algo que não deve. Não é de competência dela. É de competência nossa. [O posicionamento] É acertado".

Mourão, por sua vez, afirmou que o Brasil não se omitiu, discorda da invasão e ainda comparou Putin ao ditador nazista Adolf Hitler. Segundo o vice-presidente, "tem que haver o uso da força. Se o mundo ocidental deixar que a Ucrânia caia, a próxima será a Bulgária, depois os Estados Bálticos, assim como a Alemanha hitlerista fez".

Para Mourão, as concessões a Putin se assemelham às que foram feitas a Hitler, na década de 1930, quando a Alemanha anexou a Áustria e a extinta Tchecoslováquia. "Se a invasão prosseguir, vai haver um êxodo em massa dos ucranianos na direção da Europa Ocidental", salientou.

Neutralidade
Se Bolsonaro foi criticado por não assumir uma posição sobre o conflito, a nota emitida pelo Itamaraty foi tratada com mais benevolência e vista como a tradicional postura de cautela e neutralidade assumida pelo Brasil diante de crises dessa magnitude. Segundo o diretor de Comunicação Social do MRE, ministro Adriano Pucci, a posição é de "equilíbrio" e de buscar "viabilizar a paz".

"O Brasil não pretende contribuir para rufar os tambores de guerra. A posição do Brasil é de viabilizar a paz a qualquer momento, de acordo com a nossa Constituição e de acordo com a Carta das Nações Unidas", salientou.

Para analistas, a nota neutra do Itamaraty manteve o tom diplomático histórico do país. "A moderação é o que se espera do Brasil. O que destoa é a atitude palaciana no exterior", disse o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Laerte Apolinário Júnior.

O também professor de relações internacionais da PUC-SP Arthur Murta alertou que manter a neutralidade é o ideal. "Washington não está olhando para cá, agora, mas olhará. Nossa política externa tem se mantido bem-sucedida pelo pragmatismo. A nota preserva isso", observou.
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