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Eventual licença de Covas pode tornar Prefeitura de SP dilema para interino

Por: FolhaPress

Publicado em: 02/11/2019 11:31

O último ano da gestão do prefeito Bruno Covas, que iniciou o tratamento de um câncer no esôfago, poderá impor uma questão difícil de resolver na política paulistana (Rovena Rosa/Agência Brasil)
O último ano da gestão do prefeito Bruno Covas, que iniciou o tratamento de um câncer no esôfago, poderá impor uma questão difícil de resolver na política paulistana (Rovena Rosa/Agência Brasil)
O último ano da gestão do prefeito Bruno Covas, que iniciou o tratamento de um câncer no esôfago, poderá impor uma questão difícil de resolver na política paulistana se os cuidados médicos levarem o tucano a tirar alguma licença do cargo, mesmo que brevíssima, a partir de abril de 2020. 

O motivo está na Constituição. O artigo 14 determina que presidente, governadores e prefeitos podem disputar uma vez a reeleição e, para concorrer a outro cargo, precisam renunciar até seis meses antes do pleito. 

Eleito vice-prefeito e elevado ao cargo máximo do município pela saída de João Doria (PSDB), que deixou a Prefeitura em 2018 para concorrer ao governo do estado, Covas tem como primeiro da linha sucessória o presidente da Câmara, hoje o vereador Eduardo Tuma (PSDB).

Se mantida a tradição, Tuma será reconduzido em dezembro, quando há eleição na Câmara –os chefes do Legislativo têm ocupado o posto por dois mandatos de um ano.
É o presidente da Câmara que assume a prefeitura se Covas tirar licença por qualquer motivo. Depois de abril, contudo, tal ascensão impediria Tuma de disputar as eleições de outubro para o Legislativo, mesmo que ele comande a prefeitura por um só dia. 

Nesse caso, o hoje vereador poderia concorrer apenas a prefeito, ressaltam analistas.
"Se o Eduardo Tuma assumir a prefeitura dentro dos seis meses [anteriores à eleição], ele só pode ser candidato a prefeito. A vereador não pode mais [ser candidato]", diz o advogado Alberto Rollo, especializado na área eleitoral.

Em 2018, situação similar aconteceu mais de uma vez na esfera federal. 
Sempre que o então presidente Michel Temer viajava, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, respectivamente presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado à época, também deixavam o país para evitar o risco de serem impedidos de disputar as eleições legislativas em outubro daquele ano.

Nessas ocasiões, Cármen Lúcia, que então era presidente do Supremo Tribunal Federal, exercia a Presidência.

O cenário municipal é mais complexo. Caso Tuma se licencie ao mesmo tempo que Covas, a linha sucessória seguiria um a um pela mesa diretora da Câmara, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.

Hoje, a missão caberia a Milton Leite (DEM, vice-presidente) e, depois, Rute Costa (PSD, 2ª vice-presidente). O segundo e a terceira na linha sucessória, entretanto, provavelmente não gostariam de trocar a possibilidade de concorrer a mais quatro anos no Legislativo por períodos curtos como prefeitos da cidade.

"Vai achar o vice-presidente da Câmara, vai achar o primeiro secretário, alguém da mesa vai ter que assumir. Não vai poder ficar a prefeitura acéfala", afirma Hélio Freitas de Carvalho da Silveira, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional São Paulo). 

Ao tratar do tema, a Lei Orgânica do Município, uma espécie de Constituição de São Paulo, estabelece, em seu artigo 63, que assume a prefeitura em caso de vacância ou impedimento do prefeito e do vice o presidente da Câmara ou seu "substituto legal" –um dos membros da mesa diretora, em ordem hierárquica.

Segundo Thales Tácito Cerqueira, promotor de Justiça eleitoral em Minas Gerais e autor do livro "Direito Eleitoral Esquematizado", caso nenhum desses vereadores da mesa ascenda ao cargo, um representante da Justiça que atue no município teria que fazê-lo, por simetria com o que ocorre na esfera federal.

A Constituição mostra, em seu artigo 80, uma linha sucessória que passa por presidente, vice, presidente da Câmara dos Deputados, do Senado e, por fim, do STF.
Em casos assim como o de São Paulo, explica Cerqueira, o juiz diretor do foro da cidade vira o prefeito. 

Em 2010, por exemplo, em Dourados, no Mato Grosso do Sul, o juiz Eduardo Machado Rocha assumiu o Executivo após o prefeito, o vice-prefeito, o presidente da Câmara e mais nove vereadores terem sido presos em operação da Polícia Federal.

Como São Paulo tem diversos foros, adverte Cerqueira, a jurisprudência indica que o presidente do Tribunal de Justiça estadual teria que organizar um modelo de decisão entre esses juízes diretores.

Outro cenário que se tornou palpável para 2020 é a renúncia de Covas, caso o tratamento se estenda e assim exija. O prefeito tem dito a seus médicos que tem a responsabilidade de ficar no comando da prefeitura enquanto possível e que terá a responsabilidade de deixar o cargo se assim precisar.

A Lei Orgânica do Município de São Paulo estabelece que, caso o prefeito e o vice não concluam o mandato, após os dois primeiros anos, devem ser realizadas novas eleições indiretas para ambas as vagas no prazo de 30 dias.

Na opinião de Alberto Rollo e Hélio da Silveira, no caso de uma renúncia ou afastamento mais longo, é um dos deveres do presidente da Câmara assumir o posto do prefeito. O responsável por convocar eleições é ele, uma tarefa da qual seria difícil de fugir, mesmo que ela o tornasse inelegível para a casa legislativa. 

"Quem vota são os vereadores. Em tese, os candidatos poderiam ser as mesmas pessoas aptas a se candidatar para qualquer eleição", diz Diogo Rais, que é professor de direito eleitoral da Universidade Mackenzie.

À reportagem Tuma afirma que não crê na possibilidade de ter que assumir o posto: "Não acredito nisso pela força e pela disposição do prefeito". 

A nebulosidade desse cenário de eventual licença ou mesmo de sucessão e as múltiplas possibilidades dele decorrentes impactam as eleições para prefeito em 2020.

O candidato do PSDB à prefeitura é Bruno Covas. Caso o atual prefeito faça uso de licenças ou da renúncia e opte por não perseguir a reeleição, discute-se entre tucanos que Tuma possa ganhar a chance de disputar o Executivo pelo partido, já que terá aberto mão de sua candidatura como vereador para ajudar na administração atual.

Tuma, ainda dentro dessa hipótese, acabaria com as esperanças da ala do PSDB mais próxima de Doria de atrair a deputada federal Joice Hasselmann (PSL) para o partido e lançá-la como candidata tucana à Prefeitura de São Paulo.

Covas, 39, recebeu na segunda-feira (28) diagnóstico de câncer localizado entre o estômago e o esôfago e terá que fazer, inicialmente, três sessões de quimioterapia. Internado no hospital Sírio-Libanês, ele já passou pela primeira delas e declarou que não pretende se licenciar do cargo.

O adenocarcinoma, um tipo de câncer formado a partir de células glandulares ou secretórias, foi descoberto rapidamente, segundo os médicos, e está localizado na junção entre o esôfago e o estômago chamado cárdia. No entanto, a doença avançou, comprometendo linfonodos e gerando metástase no fígado.

Covas tem mantido uma rotina intensa de trabalho, com diversas reuniões com secretários e vereadores ao longo dos últimos dias no próprio hospital, e se mostra otimista, reafirmando que superará a doença. Nesta sexta-feira (1º), ele receberá o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) no começo da tarde.

Substitutos de Bruno Covas Inelegíveis
Quem assumir o cargo de prefeito, mesmo que temporariamente, nos seis meses anteriores à eleição fica inelegível para qualquer outro cargo. É possível a reeleição para o cargo de prefeito substituto. No caso do prefeito e do vice saírem do cargo, quem assume é o presidente da Câmara ou seus substitutos legais.

Os substitutos legais na Câmara
Presidente da Câmara - Eduardo Tuma (PSDB) 1º Vice-presidente - Milton Leite (DEM) 2º Vice-presidente - Rute Costa (PSD). Em caso de dupla vacância dos cargos de prefeito e vice: Presidente da Câmara assume e convoca eleição indireta por 15 dias. Qualquer pessoa apta para disputar eleições pode assumir.  Prefeito pode tirar licença: Quando está a serviço ou em missão de representação, quando está impossibilitado de exercício do cargo, por motivo de doença devidamente comprovada ou em licença gestante e paternidade. A Câmara precisa aprovar ausência do município superior a 15 dias.
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