Diario Editorial: O futuro ameaçado

Publicado em: 16/10/2017 07:10 Atualizado em:

Os assassinatos de adolescentes, entre 12 e 18 anos, atingiram 3,65 vítimas em cada grupo de mil indivíduos. O Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) disparou. É o mais alto desde que começou a ser medido ,em 2005, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos, o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
O estudo, divulgado no dia 11, abrangeu 300 municípios com mais de 100 mil habitantes e tomou como base os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde. No atual ritmo, em 2021 o país terá perdido 43 mil adolescentes por homicídio, apenas nas grandes cidades. As deficiências nas políticas públicas, a cada ano, indicam que as projeções negativas vão virar realidade. Em 2012, a Uerj previa que o país lamentaria o assassinato de 37 mil crianças e adolescentes até 2016. Nem foi preciso esperar quatro anos.

O Nordeste é a região mais perigosa para os jovens, com 6,5 assassinatos em cada grupo de mil, seguido do Centro-Oeste, com índice de 3,9, do Norte (3,3), do Sudeste (2,8) e do Sul (2,3). Fortaleza, capital cearense, é a mais letal, com IHA de 10,94, enquanto Boa Vista (RR) se destaca entre as menos perigosas (IHA de 1,40). Para os autores, há uma forte relação entre o IHA e as desigualdades socioeconômicas. Ou seja, o índice é mais alto no Nordeste, onde há grandes bolsões de pobreza.

Independentemente da fonte de informação ou do estudo realizado por instituições especializadas, o cenário é trágico. No ano passado, o Mapa da Violência denunciava o avanço da mortandade de adolescentes no país, que havia aumentado 699,5%, entre 1980 e 2014, com base na mesma fonte de informação do estudo do Unicef.

Os levantamentos convergem ainda mais quando fazem o recorte raça/sexo. O menino negro é o que mais morre. Ele tem 13 vezes mais risco de ser assassinado do que a menina negra. Quando considerado o fator raça/cor, mais uma vez o negro está em desvantagem na comparação com um jovem branco. Ou seja, a probabilidade de ele ser assassinado é 2,85 vezes maior do que a de um colega branco ou amarelo.

O Atlas da Violência 2017, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, avalia uma faixa mais abrangente (entre 15 e 29 anos), mas a conclusão é a mesma: de cada 100 pessoas assassinadas no país, 71 são negras. O risco de negros serem vítimas de homicídio é de 23,5% maior do que os demais brasileiros, descontados os fatores idade, escolaridade, sexo, estado civil e local de residência.

Enquanto a mortalidade de não negras caiu 74%, entre 2005 e 2015, a de mulheres negras (pretas e pardas) aumentou 22%. Em um país com 60 mil homicídios por ano, o recorte raça/cor/gênero denuncia ainda que está em curso um processo de genocídio do povo negro, que hoje soma 53,6% da população, de acordo o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2014. Os dados impõem, com urgência, ao poder público revisão das políticas nos campos da segurança, da educação e das voltadas à eliminação das desigualdades. Se as crianças e os jovens são o futuro da nação, o futuro está sendo exterminado.


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