Opinião Luciana Brown: Tinha uma pedra no meio do caminho... A cracolândia e a responsabilidade do Estado Luciana Brown é advogada

Publicado em: 15/08/2017 07:25 Atualizado em:

Desde os anos 90, o crack é um problema de saúde pública nas regiões metropolitanas do país. Resultante da mistura de cocaína refinada com bicarbonato de sódio e água, a droga causa efeitos perversos no corpo humano e contribui na escalada da criminalidade.

As vias das grandes cidades expõem chagas de difícil cicatrização. Longos anos se passaram sem soluções eficientes por parte das autoridades públicas e o espaço segue tomado por histórias de violência, dor, abandono e omissão do Estado.

Diante deste dramático cenário, a voz da Constituição Federal de 1988 ecoa em dois sentidos convergentes, ora atribuindo ao Estado o dever de zelar pela saúde, bem-estar e segurança dos cidadãos, ora chamando o Estado a responder pelos danos que a sua omissão ou ação ineficiente der causa.  
A obrigação de indenizar do Estado está amparada na Constituição Federal, art. 37, parágrafo 6º, de modo que as vítimas de prejuízos decorrentes da inoperância do ente público estão autorizadas a acioná-lo judicialmente. Não se trata de uma exigência de onipresença do Estado, mas sim de se atribuir ao ente estatal o dever primário de observância a princípios que estão presentes no preâmbulo da Constituição, como o direito à vida, à dignidade humana, à segurança.

Um caso clássico de responsabilização civil do Estado, está na recente e abrupta ação praticada pela polícia da cidade de São Paulo, quando, sob a “bandeira” de combate à Cracolância, agiu violentamente, demolindo um prédio, esquecendo, todavia, que ali encontravam-se seres humanos, dormindo, alguns, talvez, embalados pelo efeito do tóxico.  

Logo, a problemática do efeito nefasto da Cracolância às vítimas do vício, analisada sob a ótica da responsabilidade civil do Estado, deve ser observada a partir da ação ou omissão do Estado. É dever do Estado promover políticas públicas voltadas a mitigar os danos provocados pela dependência química. Danos às próprias vítimas. Danos à sociedade em geral.      
  
Na Lei 10.216/2001, que atua na proteção e atendimento médico e assistencial a qualquer pessoa portadora de transtorno mental, temos o artigo 9º, que estabelece a possibilidade da internação compulsória, sendo esta sempre determinada pelo juiz competente, depois de pedido formal, subsidiado por um médico, atestando que a pessoa não tem domínio sobre a sua condição psicológica e física. Logo, no tocante à temática da Cracolândia e a eficácia desta Lei, entendo ser dever do Estado garantir eficiência à finalidade da norma legal, através da promoção de ferramentas reais de trabalho a ser desenvolvida por equipe interdisciplinar, garantindo o devido suporte em clínicas equipadas com infraestrutura adequada para receber e acompanhar esses pacientes e os seus familiares, no pré e pós internação, inclusive com a propositura de medida judicial que vise mobilizar a internação compulsória, sempre que necessário.


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