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Opinião Maurício Rands: JBS especulando com a própria delação Maurício Rands é advogado, PhD pela Universidade Oxford, professor de direito da UFPE

Publicado em: 22/05/2017 07:34 Atualizado em:

Nas últimas semanas, Joesley e Wesley Batista, bilionários controladores da JBS, ganharam centenas de milhões de dólares especulando a partir da ação controlada que negociaram com a PGR. Compraram cerca de US$ 500 milhões no mercado de câmbio futuro, sabendo que a denúncia do presidente da República e de outros pesos pesados como Aécio Neves valorizaria o dólar. Em abril, pouco antes da divulgação da denúncia, venderam ações de empresas do grupo e embolsaram R$ 328,5 milhões. Ações que logo em seguida perderiam muito valor quando viessem à tona seus depoimentos. Essa dinheirama é apenas uma parcela singela do que ganharam ao se envolver com os governos e o mundo político. E ao faturar bilhões com empréstimos do BNDES a juros camaradas, com subsídios fiscais e corrupção. Impressiona a intimidade que tinham com grandes figurões. Alguns, pelos diálogos até agora vazados, pareciam ser seus amigos íntimos. Amigos traídos. Provocaram o terremoto que afundou a República e sua economia e depois se refugiaram na 5ª Avenida, em Nova York. Devidamente autorizados pelos investigadores. Para o cidadão comum, dois sentimentos afloram. O primeiro é de regozijo porque suas colaborações premiadas permitem avançar a operação de limpeza desejada pela nação. Mas também fica uma nesga de perplexidade. É justo que alguém ganhe impunemente centenas de milhões de dólares especulando com a própria delação e ação controlada? Os institutos da colaboração premiada e da ação controlada estão previstos no art. 3º, I e III, da Lei 12.850/2013. São meios distintos de investigação e obtenção de prova. E complementares. Visam a facilitar a instrução penal para que a lei penal seja efetiva. Não visam a impunidade do colaborador.

Nem muito menos ao seu enriquecimento. A nação está acompanhando os desdobramentos do caso JBS. O que ainda virá, só Deus sabe. Ou pelo menos quem pensa que fala com Ele, como Joesley deve estar se sentindo ao ganhar dinheiro com uma delação que nem tornozeleira lhe trouxe. E como devia se sentir há muito tempo. Quando recebia generosos empréstimos oficiais e alterava a legislação fiscal para ganhar mais. Quando ostentava uma bancada de 167 deputados federais e 28 senadores apoiados, sem contar procuradores e juízes cujos nomes ficou na obrigação de declinar. Agora todos começam a se colocar a seguinte questão. O Ministério Público fez uma negociação generosa para deles obter a colaboração premiada. Quase de mãe para filho. Mas os crimes contra a economia popular e contra o sistema financeiro, cometidos através do uso indevido de informações privilegiadas, não justificam suas prisões imediatas? Não demandam urgentes punições pela CVM, além da lenta abertura de investigações já anunciada? Depois de terem suas delações aceitas e serem autorizados a sair do país, os delatores voltaram a delinquir. Praticaram crimes especulando com o câmbio e com ações da própria empresa. Isso não deveria revogar os benefícios que até agora lhes isentaram de qualquer punição? Por muito menos, o pobre que furta um pão no supermercado vai para o presídio. É preciso cuidar para que institutos tão necessários e positivos para a punição de poderosos %u2013 a colaboração premiada e a ação controlada - não se transformem em verdadeiros alvarás de soltura e de impunidade para alguns deles. O acordo celebrado por Janot emite sinais de que, para corruptores, o crime compensa. Corrompem a República. Depois fazem delação e ação controlada. E então vão usufruir do saque vivendo no exterior. Inclusive transferindo suas empresas, lá gerando empregos e tributos. Devidamente autorizados por Janot.


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