Opinião Maurício Rands: Educação: A MP 746 e a hora de passar do debate à ação "Como a reforma política, a reforma da educação no Brasil parece ser unanimidade quanto à sua necessidade"

Por: Diario de Pernambuco

Publicado em: 26/09/2016 07:03 Atualizado em:

Por Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, professor de Direito da UFPE

O Brasil precisa sair do debate para a ação na questão da educação. Nosso modelo deixa a desejar em qualquer indicador e reproduz o apartheid social. Iniciativas bem-sucedidas, como as dos governos de Pernambuco desde Eduardo Campos deixam três lições. Primeira, a da continuidade das políticas públicas exitosas que precisam de um arco de tempo superior ao dos mandatos. Depois, a de que a prioridade à educação passa por qualidade de gestão e inovação gerencial. Finalmente, a do modelo da educação integral, com aumento do tempo dos alunos na escola, integração escola-família-comunidade, e valorização dos professores em sala de aula.

A iniciativa do ministro Mendonça Filho com a MP 746, ao “instituir a política de fomento à implementação de ensino médio em tempo integral”, incorpora muito do que já se vem debatendo. Inclusive experiências que tiveram sucesso em Pernambuco, cujos resultados acabam de ser comprovados pela ascensão ao 1o lugar do IDEB, já na gestão do governador Paulo Câmara e do secretário Fred Amâncio. A ideia é criar uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o ensino médio, complementada por uma parte diversificada em cada sistema de ensino dos entes federados. Permanece a obrigatoriedade “do estudo da língua portuguesa e da matemática, o conhecimento do mundo físico e natural e da realidade social e política, especialmente do Brasil” (redação dada pela MP ao art. 26, §1º, da Lei 9394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB). 

A polêmica veio em cima do novo art. 36 da LDB. Adotou-se uma regra de flexibilidade. Os sistemas de ensino poderão compor seus currículos com a BNCC acrescida de conteúdos específicos em linguagens, matemática, ciências da natureza, humanas e formação profissional. Diminui-se o rol de disciplinas obrigatórias em todos os anos do ensino médio (como artes, educação física, filosofia e sociologia, eis que o novo art. 36 da LDB não repete o inciso IV anterior). Algumas delas (artes, educação física) ficam obrigatórias na educação infantil e na fundamental. A compulsoriedade sai apenas do ensino médio. Essas disciplinas não são eliminadas. O inglês, p. ex., torna-se obrigatório, mas não em todos os anos. Ficam obrigatórios nos 3 anos do ensino médio apenas matemática e português (nova redação do art. 36, § 9º, da LDB). Amplia-se a margem de escolha e adaptação aos contextos locais. Pedagogicamente, a maior liberdade nas disciplinas a serem cursadas pode ter um efeito positivo no interesse do aluno.  A MP altera também o art. 24 da LDB para ampliar progressivamente a carga horária mínima anual do ensino médio das atuais 800 para 1.400 horas.

Como a reforma política, a reforma da educação no Brasil parece ser unanimidade quanto à sua necessidade. Mas o consenso para aí. Quando se debate o conteúdo da reforma, cada um tem o seu modelo ideal. Porque os tempos são de muito fundamentalismo e intolerância, os espíritos se armam num tema tão candente. Justamente onde a urgência da mudança deveria induzir convergências sobre os passos concretos viáveis. Não deveria vir por medida provisória, contraditam alguns, movidos mais por suas posições contrárias ao governo. Quando estava na Câmara, muitas vezes ouvi o argumento de deputados da oposição que não votariam certas propostas para “não dar uma medalha ao governo”. Que o raciocínio não se reproduza num assunto tão importante. A BNCC deve ser concluída em meados do ano que vem e deixará espaço para adaptações pelos entes federados, a partir de um núcleo básico obrigatório. Claro que a deliberação sobre a MP deve contemplar alterações ao texto inicial. Mas que a boa iniciativa do ministro Mendonça Filho não seja desperdiçada. Sob pena de que, à espera do modelo ideal de cada um, permaneçamos com um sistema educacional que não tem servido aos desafios de um país que se quer grande e justo.


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