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Opinião Sejamos todos feministas

Publicado em: 30/04/2016 08:34 Atualizado em:

Por Luciana Grassano Melo
Professora de Direito da UFPE

Além de impeachment e coup (golpe), de que temos escutado falar muito ultimamente, gostaria de apresentar aos leitores uma outra palavra inglesa, no caso um adjetivo: flawless. Além de ser o nome de uma música de Beyoncè, flawless é a melhor palavra inglesa para definir a imagem que a revista Veja quis transmitir de Marcela Temer, esposa do vice-presidente: sem defeitos, impecável e perfeita. Melhor dizendo: bela, recatada e do lar.
Na música Flawless, Beyoncè fez rodar o mundo as ideias feministas da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, que oferece uma definição original do feminismo para o século 21. Li o seu livro que, no Brasil, tem como título Sejamos todos feministas, e foi publicado, em 2014, pela Companhia das Letras. Trata de um ensaio muito pessoal em que a escritora chama a atenção para o perigo dos estereótipos, que limitam e cristalizam o nosso modo de pensar.
Já no primeiro capítulo, a autora se autodefine: sou uma “feminista feliz e africana que não odeia homens, e que gosta de usar batom e salto alto para si mesma, e não para os homens”. E segue contando diversas passagens de sua vida, entre a Nigéria e os Estados Unidos, para exemplificar as injustiças cometidas por uma questão de gênero e experimentadas, ainda hoje, por mulheres de todo o mundo.
E ela é enfática quanto ao que entende ser o ponto de partida: “Devemos mudar o que ensinamos às nossas filhas. Devemos mudar também o que ensinamos aos nossos filhos”. Sobre as meninas, ela diz: “Ensinamos a se diminuírem, a fazerem-se pequenas. Dizemos às meninas: Podem ser ambiciosas, mas não tanto. Podem querer ter sucesso, mas não tanto, porque senão ameaçam o homem”. Vai além: “Nós criamos as garotas e estimulamos a competição entre elas, não por empregos ou por conquistas, o que eu penso que seria uma coisa boa, mas para competirem pela atenção do homem”.
E para ser assim competitiva, além de ser bela, a mulher não pode expressar raiva. Deve ser recatada e pacata. Não se espera de uma mulher que expresse raiva, porque a raiva é ameaçadora. E ela não vai querer afugentar os homens. De outro lado, se os homens reagem com raiva, isso é visto com normalidade e é sinal de sua virilidade. E se espera da mulher, mesmo se trabalhar fora, que quando volte a casa seja a que mais se ocupa das questões domésticas e da criação dos filhos, no caso, que seja a mulher do lar.
E esse estereótipo perpetua o problema de gênero, porque prescreve como devemos ser ao invés de reconhecer como somos. E como Beyoncè e Adichie, eu também sou feminista: uma pessoa que acredita na igualdade social, política e econômica de ambos os sexos. E espero que se multipliquem as mulheres e os homens que reconhecem que existe, sim, um problema de gênero, e que devemos procurar resolvê-lo. Todos nós devemos fazer o nosso melhor para construir um mundo de homens e mulheres mais felizes e mais fiéis a si mesmos.


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