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O dia em que o Recife recebeu a visita de um santo

João Alberto Martins Sobral
Jornalista

Publicado em: 09/04/2021 03:00 Atualizado em: 09/04/2021 06:24

No dia 7 de julho de 1980, às 15h45, João Paulo II chegava à Base Aérea do Recife, a bordo do avião da Força Aérea Brasileira, na primeira e única visita de um papa a Pernambuco. Mais do que isto: foi o primeiro santo a estar no nosso estado, pois foi beatificado em 2014. Foi recebido pelo arcebispo de Olinda e Recife, Dom Helder Camara e pelo governador Marco Maciel. A bordo de um Papa Móvel, construído pela Imperial Diesel, que era concessionária Mercedes Benz no Recife,  seguiu pela Mascarenhas de Morais, General Mac Arthur, Antônio Falcão, Avenida Boa Viagem, Antônio de Góis, Ponte do Pina até chegar ao Viaduto Joana Bezerra, um percurso de 24 quilômetros, que demorou uma hora e meia, com o carro a 20km por hora e uma multidão incalculável em todas as ruas, saudando o pontífice.

Na Avenida Boa Viagem, um espetáculo inesquecível, com as pessoas nos prédios acenando lenços brancos para saudá-lo. No viaduto (que durante alguns anos se chamou Viaduto do Papa) foi armado uma enorme estrutura, com um altar, onde ele celebrou a missa e um camarote, para 100 convidados, entre autoridades civis, militares e religiosas. Fui um deles e não esqueço da emoção de estar bem junto do papa, mesmo não tendo a chance de beijar seu anel, como muitos conseguiram. A liturgia da missa foi organizada pelo padre José Augusto Rodrigues Esteves, pároco da Matriz de São José.

Na missa, ficaram célebres suas palavras dirigindo-se ao arcebispo: “Dom Helder, irmão dos pobres e meu irmão”. Na época, pensava-se que depois da declaração, Dom Helder seria nomeado cardeal, o que nunca aconteceu. Por razões que a própria razão desconhece. Já no aeroporto, o papa tinha dado um abraço carinhoso em Dom Helder e beijado sua testa.

Depois da missa, o papa seguiu para o Palácio dos Manguinhos, sede da Arquidiocese, onde foi à sacada falar para as pessoas que se aglomeram em frente. Já havia a fama de que João Paulo II gostava muito de doces e não abria mão deles nas refeições e Dona Fernanda Dias levou para o papa um bolo de frutas, preparado pela Casa dos Frios, que fica bem em frente e que também havia preparado o jantar.

O quarto em que o papa dormiu era extremamente simples, como ele havia pedido. No dia seguinte, ele se levantou cedo, celebrou uma missa pessoal, tomou café e seguiu para o aeroporto, para pegar o avião para Teresina, a nova escala da sua visita ao Brasil, que durou 12 dias e teve visitas a Brasília, onde foi recebido pelo presidente João Figueiredo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Aparecida, Porto Alegre, Curitiba, Manaus, Recife, Salvador, Belém, Teresina e Fortaleza. Ao todo, percorreu 14 mil quilômetros. João Paulo II esteve quatro vezes no Brasil. Ele foi um grande peregrino: no seu papado de 26 anos, visitou 129 países.

A visita ao papa reuniu no Recife, 500 mil pessoas, tendo atraído pessoas de vários estados do Nordeste, a começar de muitos bispos, padres e freiras, e transcorreu sem problemas para os 300 policiais responsáveis pela segurança. Tivemos apenas o atendimento a pessoas que passaram mal. A visita foi numa segunda-feira, que foi considerada feriado para que as pessoas pudessem participar da visita do papa.

Dom Fernando Saburido, arcebispo de Olinda e Recife recorda bem da visita. Na época, ele era monge no Mosteiro de São Bento e seguiu a pé, de Olinda até o Joana Bezerra, para acompanhar a missa no meio da multidão. Depois, ele esteve três vezes com João Paulo II; em 2001, no Castel Gandolfo e no Vaticano, quando se tornou bispo auxiliar do Recife. No ano seguinte, esteve num encontro de bispos, quando cantou o “João de Deus” e fez um discurso para ele. Já naquela época, confessa, tinha certeza que estava diante de um santo, o que acabou sendo realidade. Hoje, Dom Fernando confessa que é devoto do Santo João Paulo II.

Outra curiosidade da visita: naquele dia, oito crianças que nasceram em maternidades do Recife ganharam o nome de João Paulo. Hoje, eles têm 41 anos. Conheci um deles, advogado, que me contou a origem do seu nome.

Estive outra vez com João Paulo II, junto com Jarbas Vasconcelos, que, então governador do estado, visitou no Vaticano o sumo pontífice já muito debilitado, mas que falou a palavra Recife, certamente recordando a forma carinhosa como foi recebido na nossa cidade. E pude beijar o anel papal, uma experiência marcante na minha vida.

Foi uma visita que durou poucas horas, mas que ficou marcada na vida de milheres de recifenses, que tiveram a chance de estar perto de um santo da Igreja Católica.

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