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O Misterioso Jacob Tirado de Amsterdã

Leonardo Dantas Silva
Escritor e historiador

Publicado em: 23/07/2020 03:00 Atualizado em: 23/07/2020 06:29

No final do século 17 em Olinda, uma das figuras de destaque da sociedade, era o exportador de açúcar James (Jaime?) Lopes da Costa, o mesmo que aparece nas Denunciações do Santo Ofício como onzeneiro (indivíduo que pratica onzena; usurário, agiota), em 1593.

Era ele senhor do Engenho da Várzea e, por conta de tal denúncia, transferiu-se para Lisboa, onde residia sua mulher e filhos, e de lá para Amsterdã, já lá se encontrando em 1598.

Natural da cidade do Porto (Portugal), nascido em 1544, logo se transformou em um dos mais ilustres membros da comunidade judaica de Amsterdã; na qual foi alvo de significativa homenagem do rabino Moses Uri B. José Halevi, que lhe dedicou o seu livro por ele editado em 1612. Na Holanda, tornou-se “um dos pais fundadores da comunidade portuguesa de Amsterdã”.

Em Amsterdã, conhecida como a Jerusalém do Ocidente, declarou-se judeu, passando a usar o nome de Jacob Tirado, sendo responsável pela criação da primeira sinagoga portuguesa daquele grande centro, chamada Bet Yahacob (Casa de Jacob).

Sua passagem pelo Brasil é totalmente desconhecida dos seus biógrafos europeus; daí o seu epiteto de Misterioso Tirado.

Por volta de 1608, encontrava-se ele entre os fundadores da comunidade sefardita de Amsterdã, juntamente com Samuel Palache e o poeta Jacob Israel Belmonte” (...) “Em documentos notariais da época, o seu nome aparece como um comerciante rico com o nome de James (Gammez) Lopes da Costa. Seu comércio concentrou-se em Portugal e Veneza. Os serviços da sinagoga foram realizados em sua casa, pelo menos em 1610. A comunidade foi chamada Bet Ya’akov. Ele estava entre os primeiros subscritores do parnassim da comunidade tendo doado os rolos da Sefer Torá.

Depois de 1612, ele deixou Amsterdã e se mudou para Veneza, onde atuou em caridade e angariação de fundos para Ere E Israel. Ele pode ter passado os últimos anos de sua vida em Jerusalém, onde veio a falecer em 1620,

Foi ainda James Lopes da Costa que, em 1615, constituiu, com um grupo de 15 judeus portugueses, a Santa Companhia de Dotar Órfãs e Donzelas, mais conhecida entre os sefardins pela sigla Dotar, ao qual foram acrescidos os nomes de quatro judeus ausentes, dois dos quais residentes em Pernambuco, João Luís Henriques e Francisco Gomes Pina.

No final do século 16, quando da Primeira Visitação do Santo Ofício às partes do Brasil (1593-1595), já era considerável o número de cristãos-novos em Pernambuco. Numa mostragem com base nos depoimentos, constantes das denunciações e confissões, pode-se estimar em 14% da população desta capitania.

Em 1593, estava a Capitania Duartina posta em sossego quando, em 21 de setembro, desembarca no Arrecife, como era então chamado o Recife, o visitador do Santo Ofício Heitor Furtado de Mendoça (sic) e seus oficiais provenientes da capitania da Bahia.

A presença em Pernambuco de um representante da Inquisição de Lisboa, em busca de possíveis práticas judaizantes, veio a revelar aspectos da vida privada dos habitantes de Olinda, Recife, Itamaracá e Paraíba, naquele final de século 16, como se depreende dos depoimentos que integram os volumes das Confissões e Denunciações, cuja edição conjunta vem a ser publicada no Recife (Coleção Pernambucana – v. 72, 2ª fase, 1984),

Caracterizou-se a Primeira Visitação do Santo Ofício a Pernambuco pela criação de um Tribunal da Inquisição em Olinda, como bem observa José Antônio Gonsalves de Mello. O inquisidor Heitor Furtado de Mendoça (sic), não somente determinou a prisão de alguns denunciados, como também os mandou aos cárceres da Inquisição em Lisboa. Mas, no que diz respeito aos processos cujas culpas exigissem apenas abjuração de levi, como bigamia, sodomia, blasfêmia e outros, tinham o visitador e seus assessores autoridade suficiente para pronunciar a decisão final.

Observa o autor de Gente da Nação (1989), serem amplos pois, os poderes do tribunal olindense, e as penas por ele impostas eram acatadas por autoridades civis fora do Brasil, inclusive da metrópole, como nos casos de degredo e de galés.

Justificando o seu raciocínio, Gonsalves de Mello chega a relacionar, com a devida numeração contida nos autos que se encontram no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, 55 processos de réus cujas sentenças foram prolatadas pelo tribunal olindense.

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