As amantes de Nassau
Leonardo Dantas Silva
Escritor e historiador
Publicado em: 09/07/2020 03:00 Atualizado em: 09/07/2020 03:07
Apesar de nunca haver casado, o conde João Maurício de Nassau sempre nutriu um saudável interesse pelo sexo oposto. Inicialmente, por Margarida Soler, a filha do pregador calvinista Vicent Joachim Soler, apontada como sua amante no Recife pelo frei Manuel Calado, tendo a desprezado esta pelos amores da filha do sargento-mor Cornélio Bayer.
Porém, o seu caso mais propagado foi com Dona Anna Paes d’Altro (c.1617-1674), rica senhora de nobre linhagem, proprietária do Engenho Casa Forte, que era casada com o capitão Charles Tourlon, de sua guarda pessoal.
Dela se conhece uma carta de seu próprio punho oferecendo ao Conde de Nassau “seis caixas de açúcar branco” (1.800 kg). No documento, a signatária se nomeia: “De vossa excelência a muito obediente cativa Dona Anna Paes”. Para frei Manuel Calado, cuja pena não poupava ninguém do seu tempo, era Anna Paes “a mais desenvolta mulher de quantas houve no tempo deste cativeiro na capitania de Pernambuco”.
Divulgada pela primeira vez por José Higino Duarte Pereira, no nº 30 da Revista do Instituto Arqueológico Pernambucano (Recife, 1886), transcrita com correções por José Antônio Gonsalves de Mello, em 1947, a carta em questão, numa leitura livre do português em uso nos nossos dias, teria o seguinte teor:
Ilmo. Snr. – Como nós devemos toda a obediência a nossos superiores tanto mais a vossa excelência de quem temos recebido tantas honras e mercês, assim que este ânimo me faz tomar atrevimento de pedir a vossa excelência queira aceitar seis caixas de açúcar branco, perdoando-me vossa excelência o atrevimento (que meu ânimo é de servir a vossa excelência) e fico pedindo que Deus aumente a vida e estado de vossa excelência para amparo de suas cativas. De vossa excelência a muito obediente cativa Dona Anna Paes.
Sem abordar os acontecimentos ligados à vida privada e sentimental do Conde de Nassau, José Antônio Gonsalves de Mello nos revela preciosos informes acerca de Charles de Tourlon, o moço. Tinha ele o mesmo nome de seu pai, que se passara para o lado dos espanhóis em Flandres. Tourlon, que servira “no Brasil desde os primeiros anos da conquista; em 3 de abril de 1643 foi preso por Nassau, como suspeito de cumplicidade com brasileiros em uma revolta contra os holandeses”. Remetido para Holanda, ao fim do inquérito a que veio responder, nada se comprovou de tais acusações, sendo-lhe permitido voltar ao Brasil, não mais como militar, segundo o Dag. Notule de 21 de novembro do mesmo ano. Do seu casamento com Dona Anna Paes nasceram dois filhos: Isabella e Kornelius Tourlon.
Morto Tourlon em fevereiro de 1644, sua viúva, Anna Paes, torna a casar desta vez com Gijsbert de With, conselheiro de Justiça, conforme comunicado deste ao Alto Conselho datado de 29 de abril de 1645. Naquela ocasião, o então pretendente informara que “a sua futura esposa já no tempo do seu anterior casamento tinha demonstrado ser mais favorável à nossa nação que a dos portugueses”.
A cerimônia do casamento aconteceu na igreja calvinista de Maurícia (local hoje ocupado pela Igreja do Espírito Santo), em 14 de maio do mesmo ano, comunidade da qual Dona Anna Paes fazia parte. Na mesma igreja foram batizados os filhos das suas duas últimas uniões: Isabella Tourlon, em 27 de novembro de 1643; Kornelius Tourlon, em 3 de julho de 1647, e Elizabeth de With, em 28 de setembro de 1650.
Em 1653, quando do retorno do conselheiro Gijsbert de With à Holanda, Dona Anna Paes, juntamente com os filhos havidos nos seus dois casamentos, acompanhou o marido fixando residência em Dordrecht, aonde veio a falecer em 21 de dezembro de 1674.
Em se falando das aventuras amorosas de João Maurício, estas o acompanharam por toda existência. Após o seu retorno à Europa, lembram os escritores José Van den Besselaar e Evaldo Cabral de Mello às suas ligações com Agnes Geertruyde van Bylandt, esposa do mordomo-mor do Grande Eleitor de Brandemburgo em Cleve, Johan von Coenen von Zegenwerp und Lohe, cuja imagem chega aos nossos dias graças ao seu retrato (Retrato de uma patrícia diante do anfiteatro), pintada por Jan de Baen, atualmente conservado no museu daquela cidade da Alemanha.
A vida amorosa de Maurício está por escrever ainda, e talvez seja impossível reconstruí-la, porque neste terreno é muito difícil separar os boatos mexeriqueiros de informações seguras e objetivas. Só podemos dizer que Maurício, ao contrário de muitos outros príncipes da sua época, não deixou bastardos conhecidos como tais.
Essas e outras intrigas vieram a aborrecer o Conde de Nassau, que, em 1642, em carta dirigida aos Estados-Gerais, recriminava o Conselho dos 19 da Companhia das Índias Ocidentais, “pedindo que não dessem crédito às mentiras e calúnias que se espalhassem pela mãe-pátria acerca do seu procedimento antes que lhes fosse dado fazer-se ouvir por ocasião do seu regresso à Holanda”.
Porém, o seu caso mais propagado foi com Dona Anna Paes d’Altro (c.1617-1674), rica senhora de nobre linhagem, proprietária do Engenho Casa Forte, que era casada com o capitão Charles Tourlon, de sua guarda pessoal.
Dela se conhece uma carta de seu próprio punho oferecendo ao Conde de Nassau “seis caixas de açúcar branco” (1.800 kg). No documento, a signatária se nomeia: “De vossa excelência a muito obediente cativa Dona Anna Paes”. Para frei Manuel Calado, cuja pena não poupava ninguém do seu tempo, era Anna Paes “a mais desenvolta mulher de quantas houve no tempo deste cativeiro na capitania de Pernambuco”.
Divulgada pela primeira vez por José Higino Duarte Pereira, no nº 30 da Revista do Instituto Arqueológico Pernambucano (Recife, 1886), transcrita com correções por José Antônio Gonsalves de Mello, em 1947, a carta em questão, numa leitura livre do português em uso nos nossos dias, teria o seguinte teor:
Ilmo. Snr. – Como nós devemos toda a obediência a nossos superiores tanto mais a vossa excelência de quem temos recebido tantas honras e mercês, assim que este ânimo me faz tomar atrevimento de pedir a vossa excelência queira aceitar seis caixas de açúcar branco, perdoando-me vossa excelência o atrevimento (que meu ânimo é de servir a vossa excelência) e fico pedindo que Deus aumente a vida e estado de vossa excelência para amparo de suas cativas. De vossa excelência a muito obediente cativa Dona Anna Paes.
Sem abordar os acontecimentos ligados à vida privada e sentimental do Conde de Nassau, José Antônio Gonsalves de Mello nos revela preciosos informes acerca de Charles de Tourlon, o moço. Tinha ele o mesmo nome de seu pai, que se passara para o lado dos espanhóis em Flandres. Tourlon, que servira “no Brasil desde os primeiros anos da conquista; em 3 de abril de 1643 foi preso por Nassau, como suspeito de cumplicidade com brasileiros em uma revolta contra os holandeses”. Remetido para Holanda, ao fim do inquérito a que veio responder, nada se comprovou de tais acusações, sendo-lhe permitido voltar ao Brasil, não mais como militar, segundo o Dag. Notule de 21 de novembro do mesmo ano. Do seu casamento com Dona Anna Paes nasceram dois filhos: Isabella e Kornelius Tourlon.
Morto Tourlon em fevereiro de 1644, sua viúva, Anna Paes, torna a casar desta vez com Gijsbert de With, conselheiro de Justiça, conforme comunicado deste ao Alto Conselho datado de 29 de abril de 1645. Naquela ocasião, o então pretendente informara que “a sua futura esposa já no tempo do seu anterior casamento tinha demonstrado ser mais favorável à nossa nação que a dos portugueses”.
A cerimônia do casamento aconteceu na igreja calvinista de Maurícia (local hoje ocupado pela Igreja do Espírito Santo), em 14 de maio do mesmo ano, comunidade da qual Dona Anna Paes fazia parte. Na mesma igreja foram batizados os filhos das suas duas últimas uniões: Isabella Tourlon, em 27 de novembro de 1643; Kornelius Tourlon, em 3 de julho de 1647, e Elizabeth de With, em 28 de setembro de 1650.
Em 1653, quando do retorno do conselheiro Gijsbert de With à Holanda, Dona Anna Paes, juntamente com os filhos havidos nos seus dois casamentos, acompanhou o marido fixando residência em Dordrecht, aonde veio a falecer em 21 de dezembro de 1674.
Em se falando das aventuras amorosas de João Maurício, estas o acompanharam por toda existência. Após o seu retorno à Europa, lembram os escritores José Van den Besselaar e Evaldo Cabral de Mello às suas ligações com Agnes Geertruyde van Bylandt, esposa do mordomo-mor do Grande Eleitor de Brandemburgo em Cleve, Johan von Coenen von Zegenwerp und Lohe, cuja imagem chega aos nossos dias graças ao seu retrato (Retrato de uma patrícia diante do anfiteatro), pintada por Jan de Baen, atualmente conservado no museu daquela cidade da Alemanha.
A vida amorosa de Maurício está por escrever ainda, e talvez seja impossível reconstruí-la, porque neste terreno é muito difícil separar os boatos mexeriqueiros de informações seguras e objetivas. Só podemos dizer que Maurício, ao contrário de muitos outros príncipes da sua época, não deixou bastardos conhecidos como tais.
Essas e outras intrigas vieram a aborrecer o Conde de Nassau, que, em 1642, em carta dirigida aos Estados-Gerais, recriminava o Conselho dos 19 da Companhia das Índias Ocidentais, “pedindo que não dessem crédito às mentiras e calúnias que se espalhassem pela mãe-pátria acerca do seu procedimento antes que lhes fosse dado fazer-se ouvir por ocasião do seu regresso à Holanda”.
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