BOLÍVIA
Evo Morales exige que Arce troque gabinete 'se quiser continuar governando' a Bolívia
Morales lidera os maiores protestos contra o governo que ajudou a eleger
Publicado em: 24/09/2024 07:55
Apoiadores do ex-presidente boliviano Evo Morales ouvem-no discursar durante um comício contra o presidente Luis Arce em La Paz (Créditos: JORGE BERNAL / AFP) |
O ex-presidente Evo Morales exigiu, nesta segunda-feira (23), que o presidente Luis Arce faça mudanças em seu gabinete em 24 horas "se quiser continuar governando" a Bolívia, no encerramento de uma marcha contra o governo, ao qual responsabiliza por uma escassez de dólares e combustíveis.
"E esta marcha serve para que? Para dizer (...) Chega de traição e sobretudo chega de corrupção, de proteção ao narcotráfico e chega de má gestão!", gritou Morales diante de milhares de apoiadores que se reuniam na entrada de La Paz.
Em seguida, o líder indígena, que liderou o protesto de sete dias que percorreu 190 km do altiplano até La Paz, fez um ultimato a seu antigo aliado.
"E se Lucho quiser continuar governando, primeiro, que em 24 horas troque os ministros traficantes, os ministros corruptos, os ministros drogados, que troque os ministros racistas", alertou, sem mencionar ninguém em particular.
Ele também disse que o governo tem "24 horas" para resolver a escassez de combustível. Se não "resolver, as mobilizações vão continuar", enfatizou.
Morales lidera os maiores protestos contra o governo que ajudou a eleger e cujo mandato termina em novembro de 2025.
Arce foi seu ministro da Economia durante os 13 anos que esteve no poder (2006-2019), mas agora os dois disputam a indicação presidencial da situação com vistas às eleições de 2025.
No domingo, em uma mensagem televisionada, Arce advertiu Morales que não lhe daria o "gosto de uma guerra civil", após confrontos com paus e pedras entre manifestantes dos dois lados que deixaram 34 feridos, em meio ao protesto opositor, segundo números oficiais.
Antes da chegada da marcha da cidade vizinha de El Alto, a polícia bloqueou os acessos à sede do governo, enquanto centenas de apoiadores de Arce se concentraram nas proximidades, aguardando a entrada de Morales e seus seguidores.
"Viemos defender a democracia para que o irmão presidente cumpra seu mandato. Não queremos que ele seja prejudicado. Está vindo o grupo do irmão Evo Morales para prejudicar", disse à AFP Lourdes Calizaya, dirigente do Conselho das Federações Camponesas dos Yungas.
Crise e disputa política
A Bolívia, um país rico em gás e recursos de lítio – mineral-chave na transição para energias limpas – enfrenta desde o ano passado escassez de combustível e de dólares.
Diante da queda nas vendas de gás para o exterior, associada ao declínio da produção por falta de investimento na indústria, o país reduziu as importações de combustível distribuído a preço subsidiado.
Arce tem utilizado as reservas internacionais para manter os subsídios, o que, por sua vez, desencadeou uma falta de dólares e a desvalorização do peso boliviano.
No entanto, o pano de fundo da crise é a luta pelo poder entre Morales e Arce.
O influente líder indígena acusou seu ex-ministro de se aliar aos juízes para impedir que ele concorra novamente à presidência em 2025.
A ala governista do Movimento Ao Socialismo apoia a reeleição de Arce, que até o momento não disse se vai se candidatar.
"Essa mobilização não tem como objetivo uma reivindicação social; seu objetivo primordial é interromper o atual mandato constitucional", afirmou a chanceler Celinda Sosa em cartas públicas enviadas à comunidade internacional.
Segundo a chefe da diplomacia boliviana, Morales pretende que seja "viabilizada" uma nova candidatura sua à presidência, "apesar de que a Constituição Política do Estado não o permite".
No final do ano passado, um tribunal superior decidiu contra as aspirações de Morales, alegando que a Constituição boliviana só permite a reeleição imediata uma única vez.
No entanto, o ex-presidente sustenta que está habilitado a se candidatar novamente, pois um mandato presidencial já se passou após ele deixar o poder.
A Defensoria do Povo tentou sem sucesso mediar um diálogo entre os dois líderes durante a marcha.