Recessão Famílias apertam o cinto enquanto governo aumenta os gastos Enquanto milhões de brasileiros sofrem para sobreviver à crise, as contas públicas devem acumular sete anos seguidos de deficit, totalizando R$ 813,7 bilhões entre 2014 e 2020, ano em que dívida bruta poderá atingir até 92,8% do PIB

Por: Antonio Temóteo

Publicado em: 20/08/2017 08:41 Atualizado em:

Roberto Souza passou a fazer parte das estatísticas que apontam 13,4 milhões de desempregados no país Foto: Luis Nova/Esp. CB
Roberto Souza passou a fazer parte das estatísticas que apontam 13,4 milhões de desempregados no país Foto: Luis Nova/Esp. CB
Roberto Ferreira de Souza, 44 anos, chegou ao Distrito Federal há 30 anos com os pais, em busca de uma vida menos sofrida. Se tornou eletricista profissional e se acostumou com os benefícios de trabalhar com carteira assinada em diversas construtoras que faziam reformas, prédios ou casas. Com o crescimento do mercado imobiliário e com a economia em expansão, ele chegou a ganhar um salário de R$ 4 mil, conquistou o sonho da casa própria e planejava um futuro de estudos para os dois filhos.

Entretanto, com a maior recessão da história, a demanda por mão de obra qualificada despencou, o número de canteiros de obra minguou e Souza passou a fazer parte das estatísticas que apontam 13,4 milhões de desempregados no país. As compras no supermercado, que chegavam a até R$ 400, acabaram. “Agora é no quilo. Acabou o feijão, compro um saco. Carne virou um luxo”, conta. A internet foi cortada e ele não se recorda a última vez que ligou o computador.

Sem trabalho

Os programas de lazer da família, como comer uma pizza no fim de semana, ficaram no passado. Até o refrigerante que era comum na geladeira deixou de fazer parte da realidade da família. “Não consigo fazer um bico. Fico até dois meses sem trabalho. Um serviço, que antes cobrava R$ 1 mil, tenho que aceitar R$ 300. Só não passo fome porque não pago aluguel e, quando a situação aperta, meu irmão, que é servidor público, faz uma feira para mim”, lamenta.

A renda da família se resume aos R$ 300 que a esposa ganha para cuidar dos filhos de um vizinho e mais R$ 150 que recebe de Bolsa Família. São comuns os meses em que precisa atrasar o pagamento das contas de água e luz. “Meu medo é do Brasil virar uma Venezuela. Sem emprego, muita gente rouba, o número de homicídios aumenta. A situação está péssima. Não tem serviço”, diz.

Enquanto Souza e outros milhões de brasileiros sofrem para tentar sobreviver e garantir o mínimo para pagar as contas, o governo continua a gastança. Agora, quer o aval do Congresso Nacional para acumular sete anos seguidos de deficit público, que totalizará R$ 813,7 bilhões entre 2014 e 2020. No mercado, os pessimistas estimam que a dívida bruta brasileira chegará a 92,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020.

O economista-chefe do banco Goldman Sachs para América Latina, Alberto Ramos, avalia que os objetivos fiscais anunciados são mais realistas. Entretanto, ele alerta que o país só voltará a fazer superavit primário a partir de 2021. Suficiente para reverter a tendência de alta do endividamento, porém,  só em 2024, no melhor dos cenários. “As novas metas são muito decepcionantes, porque pintam uma realidade fiscal muito difícil e uma incapacidade desconcertante de reduzir os gastos atuais”, destaca.

Riscos fiscais

Para a economista Tatiana Pinheiro, do Banco Santander, a revisão das metas primárias até 2020 representou uma derrota para a equipe econômica, porque posterga a possibilidade da razão dívida e PIB se estabilizar no curto prazo. Ela estima endividamento público de 92% da geração de riquezas no país até 2020. “Esperamos superavits primários a partir de 2022, tendo em vista o crescimento econômico, de 3% a partir de 2020, e a implementação das reformas fiscais. Assim, tais superavits estabilizarão a razão dívida bruta e PIB em 2025”, projeta.

Nem a queda da taxa básica de juros (Selic) ajudará a conter a elevação da dívida, afirma Tatiana. “Segundo nossos modelos, o efeito da Selic em um dígito na dinâmica da dívida será abalado pelo impacto do deficit primário, na média em 1,8% do PIB nos próximos anos”, estima. Para a economista do Santander, o crescimento da dívida bruta aumenta as chances de uma revisão do risco de crédito soberano. “O mercado espera que o debate no Congresso referente a medidas estruturais seja retomado a partir de setembro. Se isso não ocorrer, veremos aumento do prêmio de risco país”, afirma.

Deterioração

As metas primárias atuais representam uma deterioração de R$ 200 bilhões do deficit primário do governo central entre 2017 e 2020, estima a economista Tatiana Pinheiro, do Banco Santander. Conforme ela, o Congresso precisa aprovar a maior parte das propostas de revisão da meta, aumentos de impostos e pacotes de corte de gastos para que sejam implementadas. Apesar disso, Tatiana está confiante que deputados e senadores darão aval para as medidas "Isso ocorre via leis ordinárias, o que significa que precisam de uma maioria simples para aprovação", destaca.


MAIS NOTÍCIAS DO CANAL