Pobreza no Brasil não está ligada apenas a questões financeiras

Estudo do Unicef mostra que 61% das crianças e dos adolescentes no país vivem na pobreza

Publicado em: 15/08/2018 08:24

São 32 milhões de meninos e meninas nessa situação. Desses, 6 milhões são afetados somente pela pobreza monetária, mas têm outros direitos garantidos.  Foto: Jhonatan Vieira/Esp. CB/D.A Press
A pobreza não está ligada apenas a questões monetárias. É o que indica a pesquisa “Pobreza na Infância e na Adolescência”, lançada ontem, em Brasília, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). O levantamento, que leva em consideração a legislação do país e os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2015, mostra que 61% das crianças e dos adolescentes brasileiros de até 17 anos são impactados pela pobreza no país.

De acordo com o estudo, a pobreza não está ligada apenas a questões monetárias, mas também à privação de um ou mais direitos, como educação, informação, proteção contra o trabalho infantil, moradia, água e saneamento. No conjunto desses aspectos, o saneamento é o que mais atinge crianças e adolescentes, seguido por educação, água, informação, moradia e trabalho infantil.

São 32 milhões de meninos e meninas nessa situação. Desses, 6 milhões são afetados somente pela pobreza monetária, mas têm outros direitos garantidos. Já 12 milhões, além da baixa renda, têm um ou mais direitos negados. E há ainda 14 milhões que, embora não sejam monetariamente pobres, também têm garantias negadas e estão expostos a múltiplas privações.
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De acordo com a representante do Unicef no Brasil, Florence Bauer, o estudo também mostra qual é o perfil das crianças impactadas. “São as que vivem na área rural, negras, que moram no Norte e Nordeste. Isso mostra qual é o retrato dessas crianças que estão em situação de pobreza e para quem a gente tem de direcionar as políticas públicas”, comentou.

Com a proximidade das eleições, a ideia é que o panorama exposto pelo Unicef possa servir como base para políticas públicas capazes de reverter as dimensões da pobreza na infância e na adolescência. “Em um contexto eleitoral, é importante lembrar isso, porque o Brasil assumiu um compromisso com objetivos de desenvolvimento sustentável”, explicou Bauer. “Estamos falando de privação de direitos. Também têm consequências para o país, porque a gente sabe que, se não temos crianças e adolescente com desenvolvimento, teremos impacto na economia do Brasil”, explicou.

Numa visita ao bairro Santa Luzia, na Estrutural, é possível verificar algumas das carências que afetam a infância. Fossas escoam das casas para as ruas, criando esgoto a céu aberto. As moscas e o mau cheiro compõem o cenário onde brincam crianças e adolescentes.

Moradora da quadra 18, Cícera Galdino, 27 anos — mãe de William, 9 anos, Sofia, 4, e Maria Eloah, de 10 meses —, conta que a família vive apenas com a renda de R$ 950 do marido, funcionário de uma fábrica de roupas de hospital. Todos dormem em um único quarto da casa, feita de madeirite. Ela está desempregada, e a família que não tem acesso a saneamento básico, depende de uma fossa para as necessidades fisiológicas. Semanalmente ou mensalmente, um caminhão faz a limpeza e cobra até R$ 180 pelo serviço. Quando chove, a situação piora: a rua fica alagada com o esgoto. “Pagamos R$ 500 de aluguel. O nosso filho tem epilepsia e toma medicações. Mês passado, foi apertado e faltou alimentação. Faltou o lanche de levar para o colégio, não tinha carne, e mal arroz e feijão tinha”, conta.

A socióloga da UnB Tânia Mara Campos afirma que o estudo é o retrato da crise socioeconômica e política em que o país vive. “As crianças e os adolescentes, que deveriam ser foco de estudos básicos e que, posteriormente, garantirão o sustento da família estão em situação precária. Essas crianças serão adultos em um ciclo de pobreza e miséria, sem acesso a serviços básicos”, ressalta.
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