"Em relação a Israel e Palestina, eu sempre sou um pouco cético", diz jornalista Guga Chacra no Recife
O jornalista reconhecido como um dos maiores especialistas em Oriente Médio do Brasil falou como Diario sobre os últimos acontecimentos e o futuro do conflito entre Israel e Hamas
Publicado: 18/10/2025 às 10:51

Guga Chacra (Léo Caldas/Divulgação)
Guga Chacra é um dos jornalistas com maior conhecimento, hoje, sobre Oriente Médio na imprensa brasileira. Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University, nos Estados Unidos, ele mora em Nova York – de onde, nos últimos dois anos, acompanhou cada passo da guerra entre Israel e o Hamas.
Apesar da suspensão no conflito ocorrido no início desta semana, ele faz questão de ressaltar que não houve um acordo de paz e sim um cessar-foto. Em passagem pelo Recife, para participar do Festival REC’ n’ Play, ele conversou com o Diario de Pernambuco para analisar os últimos acontecimentos.
Confira a entrevista abaixo:
Você tem sido enfático de que não houve acordo e sim um cessar-fogo. Por quê?
Não houve acordo de paz. Houve um cessar-fogo que é diferente de acordo de paz. Simplesmente teve o fim das hostilidades, das ações militares dentro da Faixa de Gaza. E também incluindo libertação dos reféns por troca de prisioneiros. Acordo de paz é algo muito mais complexo. Primeiro existe a trégua, né? Trégua, por exemplo, vamos fazer uma trégua de algumas horas para retirada de corpos, para entrada de ajuda humanitária, isso é trégua. Cessar fogo é o fim das hostilidades militares, das ações militares. O cessar fogo pode posteriormente ser formalizado num tratado que daí se chama de armistício e pode vir a não levar a um acordo de paz. As Coreias, por exemplo, tem um tratado de armistício, mas não tem acordo de paz. A Coreia do Sul e a Coreia do Norte, isso desde os anos 50. Israel e Síria também tem um armistício desde os anos 70, mas não têm acordo de paz - que teve entre Israel e Egito, por exemplo, em Camp David.
Como é que se chegaria hoje ao verdadeiro acordo de paz?
O acordo de paz seria a criação de um estado palestino, a desocupação da Cisjordânia a resolução de todas as disputas envolvendo os dois lados.
Para que houvesse alguns avanços nesse processo, seria necessário ter um mediador internacional ou apenas lideranças dos dois lados?
Precisa ter um mediador internacional, sem dúvida alguma. E, naturalmente, uma liderança israelense que estiver no poder. Netanyahu é contra a existência de um estado palestino. Teria que ter uma liderança palestina e Mahmoud Abbas (presidente da Autoridade Nacional Palestina que comanda a Cisjordânia) é a pessoa mais forte nesse momento para levar adiante. Nos acordos de Oslo (firmado entre o então primeiro ministro israelense Isaac Rabin e o chefe da Organização pela Libertação da Palestina, Yaser Arafat), houve a mediação de Bill Clinton (presidente dos Estados Unidos na época).
Antes do 7 de outubro de 2023, Netanyahu estava pelo fio para ser processado por corrupção e perder o governo. Agora com o cessar–fogo, como fica a situação dele?
Netanyahu, por enquanto, permanece no poder. Ele só sai se sair do cargo, convocar eleições, e ser derrotado nas urnas. Além disso, era preciso que algum outro líder conseguisse formar uma maioria no parlamento de Israel. Se ele continuar à frente do governo, não acredito que o processo por corrupção não anda.
E como fica a situação do Hamas à frente de Gaza?
O Hamas está extremamente enfraquecido nesse momento, mas não acabou. Então, nesse momento, eles ainda são o ator mais forte dentro das áreas que Israel ocupa na Faixa de Gaza. A gente não sabe como vai ser no médio e longo prazo. Claro que não tem incentivo para eles se desarmarem. Teria que ter uma pressão muito grande, mas pela natureza, é muito difícil que eles aceitem, porque eles perderiam a única força que eles têm, que é das armas.
Como é que você vê, a médio e longo prazo, essa situação?
Em relação a Israel e Palestina, eu sempre sou um pouco cético. Acho que ainda está muito distante de ter uma resolução de paz. Nesse momento, a liderança israelense é contra um acordo que estabeleça a existência de um estado palestino. Já do outro lado, o Hamas também não reconhece o direito de Israel existir. A autoridade palestina está bastante fragilizada. Então, eu mantenho um ceticismo muito grande.
O levou tanto Netanyahu quanto o Hamas a aceitarem a proposta de Trump?
No caso do Israel, foi a pressão do Trump - que deu uma guinada e passou a aceitar um acordo. E no caso do Hamas, foi pressão do Catar, do Egito, da Turquia. Então foram essas duas questões que fizeram mudar.

