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Governo taxa LCI e LCA: impacto no crédito e reação do mercado

Especialistas apontam encarecimento do financiamento imobiliário e do agronegócio com nova tributação prevista para 2026

Por Cecilia Belo

A medida provisória (MP) que pretende compensar a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) prevê um corte de gastos obrigatórios de R$ 4,28 bilhões em 2025, divulgou na noite dessa quinta-feira (12) o Ministério da Fazenda.

A decisão do governo federal, através de Medida Provisória (MP), de taxar as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e do Agronegócio (LCAs) a partir de 2026 acendeu um sinal de alerta no mercado financeiro e entre os setores da construção civil e do agronegócio.

A medida provisória, que já está valendo, impõe uma alíquota de 5% de Imposto de Renda na fonte para títulos que até então eram isentos, com o objetivo de aumentar a arrecadação em meio à crise fiscal.

Especialistas ouvidos pelo Diario avaliam que a medida pode provocar um efeito cascata: de investidores migrando para outros produtos até o encarecimento do crédito e a retração de novos empreendimentos.

Segundo o advogado especializado em Direito Imobiliário, Amadeu Mendonça, a mudança representa perdas para os dois lados da cadeia — tanto os investidores quanto as empresas emissoras dos títulos. No entanto, ele pondera que as empresas dos ramos afetados acabam sendo um pouco mais impactadas, porque no fim das contas o investidor pode migrar para outros ativos. "Já para as empresas, o custo de captação aumenta em um cenário já pressionado por juros altos", afirma.

Esse aumento de custo tende a ser repassado para os recebedores dos empréstimos, segundo o consultor financeiro e CEO da Vega Investimentos, Rodrigo Hudson. Ele explica que os bancos, para manter a atratividade das LCIs, precisarão elevar a remuneração oferecida aos investidores, o que, na outra ponta, pressiona o valor dos empréstimos concedidos às incorporadoras.

Isso deve encarecer o crédito imobiliário e dificultar o lançamento de novos empreendimentos. O investidor sente primeiro, mas "o maior prejudicado no médio prazo será o mercado imobiliário e, por consequência, o consumidor final", avalia.

A taxação também atinge títulos como CRIs, CRAs e debêntures incentivadas, que vinham sendo usados por empresas para financiar projetos de infraestrutura e expansão.

Para Hudson, o momento é especialmente delicado. Ele ressalta que essas empresas já enfrentam um ambiente macroeconômico desafiador, e agora perderam um dos principais instrumentos de captação com custo atrativo. O impacto disso pode ser a redução de investimentos e até corte de empregos.

No setor da construção civil, a reação é de cautela. "A LCI não é a principal fonte de financiamento hoje, já que o crédito habitacional vem majoritariamente da poupança via SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo). Mas as linhas vinculadas à LCI continuam importantes, especialmente para projetos fora do Minha Casa, Minha Vida", diz Mendonça.

Ele lembra que o programa habitacional, mesmo com a recente ampliação da faixa 4, utiliza recursos do FGTS, que têm baixo custo. Ao tributar instrumentos como a LCI, o governo afeta justamente a camada de crédito que não é atendida pelo FGTS, e acaba contradizendo o estímulo dado ao setor com a ampliação do Minha Casa, Minha Vida.

Apesar da medida só entrar em vigor em 2026, os efeitos já começam a aparecer.

"O mercado espera uma corrida para emissão de títulos antes da mudança. Emissores e investidores devem tentar aproveitar a janela de isenção enquanto ela existir", prevê Rodrigo.

No entanto, após esse período, a tendência é que os títulos percam atratividade e que parte dos investidores mais conservadores migre para CDBs, pós-fixados, fundos ou ativos indexados à inflação. "Eles vão buscar ativos mais seguros e com retorno parecido, agora que a vantagem fiscal dos incentivados está se perdendo", completa.

A proposta ainda pode ser alterada ou mesmo rejeitada pelo Congresso, já que a MP tem até 120 dias para ser analisada antes de caducar. Ainda assim, o movimento sinaliza uma mudança de paradigma. Ao optar por aumentar tributos em vez de cortar gastos, "o governo acaba desestimulando investimentos e travando setores estratégicos", critica Mendonça, e completa ainda que essa é uma visão imediatista, “que pode custar caro para o crescimento do país”.