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O avanço da pobreza no Brasil

A pobreza e a dependência de programas sociais sempre foram termômetros da capacidade — ou incapacidade — do Estado brasileiro de gerar oportunidades, renda e desenvolvimento

Angelo Castello Branco

Publicado: 27/11/2025 às 09:27

Estado registrou diminuição em pessoas em situação de pobreza/Foto: Leandro de Santana/Amigos no Sertão

Estado registrou diminuição em pessoas em situação de pobreza (Foto: Leandro de Santana/Amigos no Sertão)

Angelo Castello Branco*

A pobreza e a dependência de programas sociais sempre foram termômetros da capacidade — ou incapacidade — do Estado brasileiro de gerar oportunidades, renda e desenvolvimento.

Em 2025, segundo dados oficiais, cerca de 20,5 milhões de famílias recebem o Bolsa Família, representando aproximadamente 53 a 54 milhões de pessoas. É um contingente expressivo, que evidencia vulnerabilidade social, mas ainda assim compreende cerca de um quarto da população.

Nessa escala, o programa funciona como rede de proteção: ampara os mais pobres, atenua desigualdades históricas e evita que milhões mergulhem na fome e na indigência.

No entanto, essa realidade, embora preocupante, não configura a falência completa do Estado. Ela indica profundos desafios estruturais — como a baixa produtividade econômica, a informalidade e a incapacidade de expandir empregos de qualidade —, mas não representa uma sociedade majoritariamente dependente do governo.

Na prática, os brasileiros que vivem do Bolsa Família ainda não formam um bloco eleitoral capaz de capturar a democracia. A política continua disputada por segmentos diversos: classe média, trabalhadores formais, empresários, servidores públicos, jovens urbanos e muitos outros.

A situação, contudo, mudaria radicalmente caso se confirmasse o especulado cenário hipotético de 94 milhões de beneficiários. Número desse porte significaria que quase metade do país dependeria diretamente do Estado para sobreviver.

Não haveria paralelo na história econômica brasileira — e tampouco na de países latino-americanos com forte tradição de programas sociais. Nesse caso, a transferência de renda deixaria de funcionar como ponte emergencial e se consolidaria como modo de vida permanente, aprisionando gerações à dependência.

Um país onde metade da população poderia necessitar de auxílio significa, inevitavelmente, um Estado que falhou. Falhou na educação, na economia, na geração de emprego, na mobilidade social e na oferta de oportunidades que libertam o cidadão do assistencialismo. É uma sociedade que perde o futuro: crianças crescem sem perspectiva de ascensão pela educação; adultos se mantêm no limbo da informalidade; e idosos sobrevivem com mínimas condições materiais.

A pobreza, em vez de circunstancial, tornar-se-ia estrutural — e sua superação, cada vez mais distante.

Nesse cenário hipotético, além da tragédia social, haveria um impacto político profundo. Uma massa de 94 milhões de beneficiários poderia influenciar decisivamente as eleições. Não por má-fé, mas por necessidade. Quem depende do governo pode votar movido pelo medo de perder o benefício que garante a sobrevivência.

A democracia, assim, corre o risco de se transformar em disputas centradas na manutenção de auxílios, e não em projetos de desenvolvimento sustentável, reforma estrutural, inovação e produtividade.

A comparação entre os dois cenários revela um abismo decisivo. Na realidade atual, o Brasil enfrenta pobreza severa, mas ainda possui margem para promover políticas estruturantes. No cenário hipotético, porém, o país mergulharia num assistencialismo crônico que comprometeria o futuro da economia e da democracia.

É um alerta: políticas sociais são essenciais, mas devem vir acompanhadas de reformas profundas que ofereçam autonomia, emprego e dignidade. Sem isso, o Brasil corre o risco de caminhar rumo a uma dependência que aprisiona gerações e destrói a esperança de desenvolvimento real.


*Jornalista

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