Quem protege o agressor agride junto
Proteger o agressor é negar a dor da vítima, além de justificar o injustificável e reforçar o ciclo da violência
Publicado: 28/10/2025 às 11:13
(Freepik)
Em qualquer relação humana existe um momento em que o silêncio se transforma em cumplicidade. Dizer que quem protege o agressor agride junto é reconhecer que toda omissão diante da violência alimenta o próprio mal. A agressão não se sustenta apenas na força de quem a pratica, mas também na passividade de quem a encobre.
Assim, proteger o agressor é negar a dor da vítima, além de justificar o injustificável e reforçar o ciclo da violência. Essa proteção pode vir travestida de medo, conveniência ou lealdade, mas o resultado é sempre o mesmo, ou seja, o agressor se fortalece e a vítima é novamente ferida.
Na psicologia, isso é chamado de aliança com o agressor. Nas famílias aparece no silêncio, nas instituições na impunidade e na sociedade na indiferença. Em todas as formas é a normalização do que destrói.
Portanto, romper o silêncio é um ato de coragem moral. Falar, denunciar e se posicionar não criam conflito, apenas revelam o que já existe. A neutralidade diante da injustiça nunca é neutra, pois sempre favorece o opressor.
Proteger o agressor é trair a justiça e a própria consciência. A paz verdadeira não nasce da omissão, mas da coragem de enfrentar o que fere.
MISOGINIA COMO CRIME EQUIVALENTE AO RACISMO
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o projeto que criminaliza condutas de ódio ou aversão às mulheres, baseadas na crença da supremacia do gênero masculino. A proposta inclui a misoginia na Lei do Racismo (Lei nº 7.716/1989), equiparando-a às práticas discriminatórias de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. O texto segue agora para a Câmara dos Deputados.
A medida representa um marco civilizatório no enfrentamento à violência de gênero. Reconhece que o ódio contra mulheres não é mera opinião, mas uma forma de discriminação que, assim como o racismo, fere o princípio da igualdade e ameaça a dignidade humana.
A misoginia é a base simbólica de inúmeras violências, que começa na desvalorização da mulher, passa pela exclusão e culmina no feminicídio. Criminalizá-la é afirmar que nenhuma crença de superioridade masculina pode servir de abrigo para o desrespeito.
Entretanto, a lei é apenas o início. A verdadeira mudança exige educação, empatia e consciência coletiva. Combater o ódio é também ensinar o respeito e reconstruir a cultura das relações humanas.
DEZ MULHERES ASSASSINADAS POR DIA
O Atlas da Violência 2025 expõe uma ferida aberta: dez mulheres são assassinadas por dia no Brasil. É a confirmação de que a violência de gênero permanece como uma das expressões mais brutais da desigualdade. Por trás de cada número há uma história interrompida, uma voz calada e uma sociedade que ainda não aprendeu a proteger quem mais precisa.
Grande parte dessas mortes ocorre dentro de casa, cometidas por parceiros ou ex-parceiros. Isso mostra que o feminicídio não nasce de um impulso, mas de uma cultura de posse e controle que transforma o amor em domínio. A casa, que deveria ser abrigo, continua sendo o cenário mais perigoso para milhares de mulheres brasileiras.
O estudo também revela que a maioria das vítimas é negra, jovem e moradora das periferias. A cor, o gênero e a classe social se somam, revelando um país onde a vulnerabilidade tem rosto e endereço.
Enquanto o Estado não garantir proteção efetiva e a sociedade continuar relativizando a violência, o ciclo continuará se repetindo. É urgente transformar estatísticas em políticas, medo em denúncia e silêncio em voz.