Uma universidade excelente

Paulo Rubem Santiago
Professor da UFPE, mestre em Educação.

Publicado em: 04/06/2019 03:00 Atualizado em:

Ouvi muito falar em “Universidade de Excelência” nos primeiros debates entre as chapas que disputam as eleições para a Reitoria da UFPE entre os dias 29 de maio e 2 de junho. Fico me perguntando: o que é essa universidade? Em função do que pode ser chamada assim? Para tal deve ter seus docentes / pesquisadores publicando cada vez mais artigos em revistas editadas em outros países? Cada vez mais trabalhos desses servidores apresentados em congressos sediados fora do país? Tais conquistas seriam fins em si mesmos? Quanto de excelência poderá haver numa universidade a partir desses objetivos? Quanto do mesmo poderá haver numa universidade que investiga aspectos cruciais da realidade brasileira e apresenta diagnóstico de suas causas (e engrenagens), a crítica disso e as propostas para sua superação? Ainda assim a busca de respostas aos problemas do país é apenas meio para as publicações ou está entre os mais importantes fins da universidade? Que direção queremos para a UFPE a partir de junho? Como deverá se conduzir acerca dessas questões e como os futuros gestores se manifestarão em sua associação nacional(ANDIFES) frente aos cortes e ameaças à autonomia da universidade? Penso num significativo conjunto de temas que exigem da universidade olhares, diagnósticos e respostas: a questão tributária e o financiamento do estado com justiça fiscal, a realidade urbana e a sustentabilidade de nossas cidades, a saúde como direito universal, o campo, a agricultura familiar e o agronegócio, a estabilidade monetária e o pleno emprego, a produção social da riqueza e o enfrentamento das desigualdades, o meio ambiente e o crescimento econômico, a cidadania, a violência e a ação do estado, a combinação da educação básica com o ensino superior públicos, gratuitos e de qualidade versus a expansão do privado na educação. Professor da UFPE desde 1980, passei 24 anos fora da instituição (1991-2014) exercendo mandatos parlamentares, quando vi muitos desses temas postos à mesa das decisões governamentais, com embates e conflitos de interesses subjacentes a cada um. Porém, nem sempre vi a universidade intervindo no debate dessas questões trazendo-nos conhecimento e crítica. Não seria esse dever um parâmetro para aferirmos sua “excelência” para a sociedade, com tudo que derivaria disso (orientações, dissertações, teses, publicações)? Quando ouço falar na necessidade da internacionalização da UFPE e me pergunto se isso pode ocorrer dissociando-a de sua condição genuinamente brasileira, capaz e propositiva ante tantas desigualdades e contradições em nosso meio? Pode uma universidade pública dissociar-se da construção do espaço público de tomadas de decisões acerca dos mesmos campos de conhecimento que estruturam seus centros e departamentos, bem como das distintas linhas de pesquisa de sua pós? Creio que não. Por isso me preocupa que o centro do debate, para algumas candidaturas postas para a Reitoria da UFPE, sejam, apenas, as questões administrativas internas e pauta da “internacionalização” da UFPE (o que seria isso mesmo?), em vez de se considerarem tais elementos, mas tendo como seu carro-chefe o adequado diagnóstico acerca do que está acontecendo no país, em especial com a educação básica e o ensino superior nas últimas décadas. A partir disso, que propostas teremos para uma universidade efetivamente brasileira, capaz de combinar o saber que produz com estratégias que incidam sobre o poder de decisão do Estado e da sociedade acerca das políticas governamentais em curso há décadas? Afinal, será possível aceitar uma UFPE de “excelência”, “internacionalizada”, porém de costas para o que se passa no país e pela BR 101 que lhe corta o campus? Claro que não. Por isso, Movimenta UFPE. 

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