Sobre a criminalização da homofobia

Moacir Veloso
Advogado

Publicado em: 27/02/2019 03:00 Atualizado em: 27/02/2019 08:30

Estamos em 1987, Luiz Antonio, aos 40 e poucos anos, é um contador, com escritório na Boa Vista, em Recife, solteiro, que mora só, há cerca de cinco anos. Discreto, bom caráter, era um profissional respeitado e respeitador. Frequentava ambientes ecléticos, desde a companhia de colegas heterossexuais, a algumas incursões pontuais em lugares então reservados à comunidade gay. Sua homossexualidade era bem resolvida. Culto e autodidata, aceitou sua condição sem maiores traumas ou ressentimentos. Embora católico, não era praticante. Tudo corria bem, até uma noite malsinada. Após uma noitada de sexta para o sábado no Mustang, Luiz Antonio, levemente alcoolizado, lá pelas quatro da manhã, caminhava em direção ao prédio onde morava na Av. Manoel Borba, quando foi abordado por três jovens, que ocupavam um automóvel Brasilia. Eles desceram armados de cacetes e passaram a xingá-lo e agredi-lo fisicamente, desferindo-lhe pauladas, socos e pontapés, enquanto dirigiam-lhe os impropérios de sempre: veado safado, puto, fresco, etc... Luiz Antonio acordou no Hospital da Restauração, com um braço e uma perna quebrados, e uma insuportável dor de cabeça. Um acadêmico de medicina lhe informou que ele foi encontrado desacordado por uma guarnição da Policia Militar que o trouxe para o HR. Disse-lhe também que ele iria se recuperar dos ferimentos, mas levaria algum tempo. Assim como nos anos 70 existiu o CCC – Comando de Caça aos Comunistas – nos anos 80 havia grupos de facínoras da classe média, cujo passatempo predileto era agredir homossexuais escolhidos aleatoriamente. Nunca houve nenhuma prisão. O tempo passou e a perseguição aos homossexuais recrudesceu. Contudo, essa parcela significativa da população cuidou em organizar-se social e politicamente para enfrentar seus algozes e lutar pela sua punição exemplar. A Associação de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABGLT), propuseram, através do Partido Popular Socialista – PPS – uma Ação Direta de Inconstitucionalidade Por Omissão (ADO-26). Alegam que a homofobia e a transfobia são preconceitos equiparáveis ao racismo, e que, por isso enquadram-se no conceito de discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais protegidos na Constituição Federal. Essa ação representa um movimento tático com objetivo de apressar a tramitação do Projeto de Lei Nº 515/2017 do Senado Federal. Ele altera a Lei 7.716 de 5/01/89, que define os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero. Quando tornar-se Lei, será um poderoso instrumento de combate à violência contra as pessoas vulneráveis retrocitadas. Por exemplo, manifestações de afetividade entre homossexuais, tais como beijos, abraços, etc..., em locais públicos ou privados abertos ao publico, não poderão sofrer qualquer tipo de censura ou reprovação explicita. Caso isto ocorra, a pena será de um a três anos e multa. O recado do legislador é o seguinte: deixem os homossexuais em paz. Respeitem seus direitos fundamentais à incolumidade física, psíquica, moral, social e política. É uma questão de civilidade. Não adianta implicar. A realidade está posta. Respeitem-na. É sua obrigação. 

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