Voo, desastres e conquistas: a corrida espacial contada pelo Diario de Pernambuco
Da partida do Sputnik até a Apollo 11, a história da competição entre Estados Unidos e União Soviética foi registrada nas páginas do Diario
Publicado: 07/11/2025 às 00:00
Diario de Pernambuco trouxe a manchete "A Lua é dos Estados Unidos" após chegada do homem na Lua (Foto: Arquivo/DP)
Em meados dos anos 1950, o mundo ainda reverberava o estrondo dos dois bombardeios atômicos de 1945 e começava a viver a bipolaridade da Guerra Fria. De um lado estava a União Soviética (URSS), do outro a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA) e os Estados Unidos. Cientistas, engenheiros e militares sabiam que o foguete que podia lançar um míssil intercontinental poderia também lançar um satélite, ou um homem, ao céu.
No dia 4 de outubro de 1957, a URSS lançou o Sputnik 1, o primeiro satélite artificial do planeta. Este se tratava de um simples globo de metal que emitia “bip-bip” ao redor da Terra e que fez o mundo inteiro olhar para cima. Mas quando a URSS conseguiu levar à órbita o cosmonauta Yuri Gagarin, em 12 de abril de 1961, com a cápsula Vostok 1, o choque foi sentido em Washington, nos EUA. Gagarin deu uma volta completa no planeta Terra e retornou em segurança.
Naquela data, o Diario publicou uma edição com destaque para o feito soviético, trazendo a matéria “Como não lembrar Yuri Gagarin, o primeiro homem a viajar pelo espaço, no dia 12 de abril de 1961.” A manchete da época foi algo como: “Problema para Houston, manchete para o Diario.”
Corrida para a Lua
Os Estados Unidos aceleraram os preparativos orçamentários da NASA para acelerar a ida do homem à Lua. Menos de dois meses depois do voo de Gagarin, em 25 de maio de 1961, o então presidente do país, John F. Kennedy, subiu ao Congresso e fez uma declaração histórica, afirmando que os Estados Unidos se comprometeriam a levar um homem à Lua e trazê-lo em segurança à Terra antes que o decênio se encerrasse.
Em 27 de janeiro de 1967, a tripulação da missão Apollo 1 sofreu um incêndio durante um teste de solo, e os três astronautas morreram. Do lado soviético, o caminho também esteve repleto de pressões e de tragédias ocultas e a competição deixava pouco espaço para falhas públicas.
Dia 16 de julho de 1969, o relógio marcava 13:32 UTC quando o foguete Saturn V partiu de Cabo Canaveral com os astronautas Neil?Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins na Apollo 11.
Dias depois, em 20 de julho de 1969, às 20:17 UTC, o módulo lunar Eagle pousa na superfície lunar. Armstrong desce a escada, coloca o pé na poeira lunar e pronuncia as palavras eternas: “É um pequeno passo para o homem, um salto gigantesco para a humanidade”. No instante em que a bandeira americana foi fincada na Lua, logo ficou claro para muitos que os Estados Unidos haviam vencido a corrida.
Para a União Soviética, que havia colecionado os primeiros marcos; primeiro satélite, primeiro animal em órbita e o primeiro homem, o fracasso em superar o pouso lunar marcou o declínio de seu ímpeto na competição direta.
“A Apolo 11 decidiu ontem a corrida para a Lua e abriu uma nova fase na história da humanidade. Esse marco foi conseguido quando, às 17h17 (hora do Recife), a nave descia com perfeição absoluta numa área do Mar da Tranquilidade. Neil Armstrong, o cosmonauta comandante, exclamou então para os cientistas do Centro Espacial de Houston: ‘A Águia pousou’. Às 23h56 abria-se a escotilha da nave e o mesmo Armstrong dava o primeiro passo na desolada superfície lunar, iniciando, assim, seus trabalhos de exploração. A ele seguiu-se Edwin Aldrin”, publicou o Diario na edição de 21 de julho de 1969, dia seguinte ao pouso da Apollo 11 na Lua.
Para registrar o feito, o jornal lançou uma edição especial com 13 páginas dedicadas à missão. O material detalhava toda a trajetória desde o lançamento no Cabo Kennedy, em 16 de julho, quando o foguete Saturno V levou ao espaço a cápsula Apollo XI. Câmeras de televisão transmitiram a alunissagem ao vivo para cerca de meio bilhão de pessoas em todo o mundo. Ainda assim, houve quem duvidasse da veracidade das imagens, alimentando teorias de que tudo teria sido encenado em solo norte-americano.
“No Recife, a Pracinha da Independência foi o centro de convergência do povo nas comemorações da proeza. Na hora da descida do módulo e no momento do desembarque, o velho carrilhão do Diario de Pernambuco e a sirene saudaram o acontecimento, no que foram acompanhados pelas buzinas de mais de trezentos automóveis reunidos em frente ao nosso edifício, onde se acotovelavam centenas de pessoas”, registrava o jornal.
Na capital pernambucana, a festa parecia carnaval. A Prefeitura do Recife promoveu apresentações de blocos tradicionais, com Batutas de São José, Vassourinhas, Canindés, Inocentes do Rosarinho e Amantes das Flores, e anunciou a instalação de um painel gigante alusivo ao feito dos astronautas na fachada do prédio-sede. As ruas ficaram mais iluminadas, e o público aguardava ansioso para ver a réplica do módulo lunar que desfilaria em um carro alegórico.
A chegada do homem à lua marcou também um salto na própria estrutura do Diario de Pernambuco, que se modernizou graficamente e ampliou sua cobertura internacional. Antes mesmo do pouso, o jornal vinha publicando, por dez dias consecutivos, uma série especial sobre a missão.
Produzido pelo editor internacional Jacinto Braga, o material trazia fotos, gráficos e até quadrinhos explicativos. Jacinto embarcou para os Estados Unidos e tornou-se o único jornalista do Norte e Nordeste credenciado pela NASA para acompanhar o momento histórico diretamente de Cabo Canaveral.
Os “quase” e os desastres da corrida espacial
No cosmódromo de Baikonur Cosmodrome, em 24 de outubro de 1960, um míssil balístico R-16 soviético, em testes finais, explodiu enquanto ainda estava no lançador. O número exato de mortos nunca foi oficialmente confirmado, mas estimativas variam entre 54 e mais de 100.
A causa foi pressão de cronograma, combustível hipergólico extremamente tóxico e procedimentos de teste que se sobrepunham ao lançamento. O impacto foi enorme, mas a URSS, apesar de seus sucessos iniciais no espaço, teve que esconder o evento. Oficialmente dizia-se que o marechal Mitrofan?Nedelin morrera em “acidente de avião”. O silêncio mostra como o “quase desastre” era um tabu.
Em outra missão, durante a Voskhod 2, o cosmonauta Alexey?Leonov realizou o primeiro “passeio espacial” (EVA) da história em março de 1965. No entanto, durante a viagem seu traje expandiu-se fora do compartimento e ele teve que reduzir a pressão para conseguir voltar ao módulo. Além disso, o pouso automático falhou, e a cápsula aterrissou numa região remota da Rússia, a centenas de quilômetros da zona prevista. Eles passaram a noite ao relento até serem resgatados.
Uma das falhas mais graves ocorreu quando o cosmonauta Vladimir Komarov embarcou na Soyuz 1, veículo experimental soviético, em 24 de abril de 1967. A missão tinha vários problemas: o painel solar não se abriu, a nave ficou com falta de energia, e o sistema de orientação falhou. No retorno, o paraquedas da cápsula apresentou falha e a Soyuz 1 caiu com velocidade muito alta, matando Komarov. Foi a primeira morte humana ligada diretamente ao voo espacial da corrida.
Em 30 de junho de 1971, três cosmonautas soviéticos, Georgi?Dobrovolski, Viktor Patsayev e Vladislav?Volkov, completaram 23 dias a bordo da estação espacial Salyut 1, o que representaria um recorde e novo marco. Mas no retorno à Terra, uma válvula de ventilação da cápsula se rompeu, provocando despressurização automática. Como não usavam trajes de pressão,os tripulantes morreram por asfixia no espaço.
Nos Estados Unidos, a tragédia ocorreu durante um teste de solo, quandos os astronautas Gus Grissom, Ed White e Roger Chaffee morreram queimados dentro da cápsula do programa Apollo, devido a um fogo iniciado num ambiente de oxigênio puro pressurizado e com materiais inflamáveis, aliado ao fato de a escotilha abrir para dentro. isso tornou a evacuação praticamente impossível. O caso aconteceu em 27 de janeiro de 1967.