O choro de Pelé e o choro de Neymar

Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, Secretário de Acesso a Direitos da OEA. As opiniões são pessoais.

Publicado em: 25/06/2018 03:00 Atualizado em: 25/06/2018 09:02

Poucos duvidam que Cristiano Ronaldo, Messi e Neymar são os melhores jogadores do mundo. O que explica o sucesso do primeiro nessa fase inicial do Mundial da Rússia? E a decepção, pelo menos até agora, com a performance dos dois outros? A de Neymar foi bem resumida nas redes sociais: ‘Solicito que não postem mais no grupo imagens ou comentários sobre Neymar; meu celular já caiu quatro vezes sozinho hoje’. Ou, ‘se o Brasil vencer essa Copa, Neymar vai beber até ficar em pé’. Quem não se irrita com suas constantes reclamações ao juiz? Ou com as simulações e mergulhos desnecessários? Quer o quê? Que os defensores comportem-se como se fossem a babá de um menino mimado? Roberto Dinamite, grande artilheiro do Vasco, comemorava os gols com palavrões, que explicou depois como revanche e desabafo contra as pancadas que levava dos zagueiros durante todo o jogo.  

Talvez a explicação para as performances diferentes esteja nas personalidades de cada um. Mais que na qualidade das suas equipes. Sofríveis as de Cristiano e Messi. Um pouco melhor, o time de Neymar. Ademais os três já conhecem bem o ambiente competitivo do futebol europeu, estrelas que são dos supertimes do Real Madrid, Barcelona e Paris Saint German. Cristiano Ronaldo concentra-se em cumprir bem seu dever, assume as responsabilidades de sua fama e liderança. Messi baixa a cabeça e se deixa abater pelas dificuldades. Neymar joga a culpa para o juiz ou para os adversários violentos quando não dá certo; se algo vai bem, dá logo um jeito de aparecer como o responsável pelo êxito.

O local e o momento do choro de Neymar após a vitória sobre a Costa Rica pode ser interpretado de vários ângulos. Como um desabafo de quem é muito cobrado para voltar a dar um título ao Brasil. Ou o de quem foi criança pobre. Ou o de quem sofreu uma contusão às vésperas do maior evento do esporte que pratica. Mas o choro dele pode também ser interpretado a partir do seu imenso ego. Que pode estar atrapalhando a performance de um time em um esporte que é essencialmente coletivo. Quem não viu cenas em que outros jogadores brasileiros comportam-se quase que obrigados a lhe passar a bola? Às vezes deixando de tentar melhores opções de passe? O editor de esportes de O Globo, Márvio dos Anjos, captou o que pode ter ocorrido. ‘Neymar precisava, claro, dar dimensão épica aos seus esforços. À sua fratura no dedo do pé, aos meses de repouso e à fisioterapia. Por isso, chorou. Por isso, sentou-se no gramado, onde as câmeras pudessem notar, sem obstáculos, o aspecto pessoal de uma vitória genuinamente coletiva. Genuíno ou não, o choro de Neymar preocupa: ou se trata de um sintoma de instabilidade preocupante, ou se trata do rebate de um narcisismo que Neymar administrou bem por quase todo o confronto (...). Ao fim e ao cabo, seu ego se revela: é maior do que ele mesmo’.

Foi diferente o choro de Pelé, carregado nos braços ao fazer o milésimo gol contra o Vasco da Gama no Maracanã em 19.11.1969. ‘Pensem nas criancinhas pobres’, bradou o rei, partilhando sua glória com milhões de jovens desesperançados. Como ele fora um dia. O de Neymar foi o inverso. Quando o time, coletivamente, conseguira superar já nos acréscimos o que seria mais um fracasso da seleção brasileira, Neymar sentou-se no gramado, atraindo todas as câmeras. Roubando a cena dos companheiros de equipe e de Phelippe Coutinho, este, sim, o autor do gol salvador. Como a dizer: ‘pensem em mim’. Uma criancinha que desde muito cedo deixou de ser um daqueles a quem Pelé pedia solidariedade.

P.S.: Lukaku (Bel), um dos artilheiros da Copa, caiu na área. Ele próprio disse ao juiz que não foi pênalti. Igualzinho ao jeitinho brasileiro de Neymar, né?

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