Editorial Crise hídrica e as suas lições

Publicado em: 18/04/2018 03:00 Atualizado em: 18/04/2018 08:44

Quatro anos depois de enfrentar a maior crise hídrica, em 80 anos, os paulistanos têm noção da finitude do recurso natural imprescindível à vida. Hoje, consomem 15% a menos do que no ápice da escassez em 2014. Em 2017, a estiagem mudou a vida em 872 municípios brasileiros, a maioria deles no Nordeste. O racionamento em dezenas de capitais brasileiras alterou o dia a dia de 17% das empresas e poderá afetar a rotina de 31% dos empreendimentos empresariais em 2018, segundo estudo do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), entre 5.867 micro e pequenos empresários em todas as unidades da Federação.

Embora o Centro-Oeste seja reconhecido como berço da águas, 44% dos empresários da região preveem que a escassez será uma das maiores dificuldades deste ano. No Distrito Federal, essa é a expectativa de 53% dos executivos do setor privado, e de 53% dos que atuam em Goiás, conforme o Sebrae. Se a crise afeta os negócios e impõe transtornos à população, ela é também excelente mestra. Assim como os paulistanos, o empresariado tem tomado providências para reduzir o impacto da estiagem: redução de consumo, reaproveitamento, diminuição das faxinas. A mudança de hábito foi adotada por 51% das empresas da região central do país, e por 50% do Sudeste.

A iniciativas são positivas, mas insuficientes. No país, ainda são pouco explorados o planejamento e a gestão do reúso das águas residuais das atividades produtivas e humanas. Estudo da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) mostra que 70% das águas residuais são tratadas nos países de renda alta, diferentemente do que ocorre em 28% das nações de renda baixa. O Brasil está longe da universalização da captação e tratamento do esgoto produzido nas áreas urbana e rural. Menos de 50% da população é servida por captação de resíduos.

A maioria dos municípios não tem aterro sanitário. A inexistência desses serviços compromete as fontes de água potável, num país que detém 12% dessa riqueza mundial. Acidentes ambientais previsíveis, mas negligenciados pela fiscalização, contribuem para reduzir, ou até eliminar, as fontes do recurso natural. Embora a legislação brasileira esteja entre as mais avançadas, a leniência das autoridades contribui para que seja ignorada e impunidade prevaleça.

Diante das sucessivas crises, o poder público impõe o racionamento. Paliativo longe da solução, que exige planejamento, investimento na universalização do saneamento básico, garantia de acesso à agua a todos os cidadãos, campanhas permanentes de educação para o consumo racional, combate rigoroso aos crimes ambientais, que afetam os mananciais. O receiturário vem do próprio poder público, que, na imensa maioria dos casos, é o primeiro a descumpir o que a lei determina.

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